Rio - O aumento da violência urbana em São Gonçalo tem feito com que moradores mudem os hábitos para tentar se proteger. Além de contratar um vigilante e de instalar câmeras de segurança, portões automáticos e cercas de proteção na entrada das vilas, moradores do bairro Zé Garoto, por medo, evitam as ruas após as 19h.
“Rezo todos os dias para que meu filho chegue em casa. Quando saio de casa levo apenas as chaves e não ando com nada de valor. A violência aumentou muito por aqui e, mesmo com o esquema de segurança, é difícil viver com tranquilidade”, lamentou a aposentada Clemilda Melo, de 64 anos. Dados do Censo do IBGE de 2016 revelam que São Gonçalo, com 1.044.058 de habitantes, tem a segunda maior população do estado.
O Índice de Desenvolvimento Humano, no entanto, aponta que o município ocupa a 14° posição entre as 92 cidades fluminenses. A prefeitura gonçalense afirma ter investido cerca de R$ 19 milhões em Segurança Pública em 2016, montante que parece não ter sido suficiente para reduzir a criminalidade.
Segundo dados do Instituto de Segurança Pública (ISP), o número de roubo a transeuntes no município aumentou 82% de 2015 para 2016. No mesmo período, somente os registros de roubo de celulares aumentaram 77%. As ações criminosas ocorrem em qualquer momento do dia e em áreas de grande circulação de pedestres.
“Geralmente os bandidos utilizam motos para assaltar as vítimas aqui no entorno da Praça Zé Garoto. Se eu tivesse oportunidade, sairia da cidade”, desabafou o mecânico Ailton José Parreiras, de 57 anos.
O município também tem enfrentado nova modalidade de assalto, popularmente conhecida como “meio-fio”. Nela, criminosos observam o momento em que as pessoas desembarcam de veículos de transporte — táxis, ônibus ou carros a serviço de aplicativos de passageiros — para abordá-las próximo à calçadas.
Ontem pela manhã, dois crimes assustaram moradores e deixaram marcas no Fórum, localizado no bairro Santa Catarina. Por volta das 5h10, quatro bandidos armados roubaram motoristas que abasteciam seus veículos em um posto de combustíveis.
Após levar o dinheiro do caixa e os pertences das vítimas, a quadrilha tentou roubar um carro em frente ao fórum. No veículo abordado, dois policiais que seguiam para o trabalho, reagiram e atiraram contra os assaltantes. Houve um intenso confronto e os criminosos fugiram abandonando o carro usado na ação. Um dos disparos atingiu a cabine de segurança do fórum. Ninguém ficou ferido.
Desafio é reduzir índices ruins
A forte resistência do tráfico é o principal desafio da PM para reduzir os índices de violência na cidade. O Complexo do Salgueiro e Jardim Catarina foram apontados como os locais nos quais as forças de segurança encontram maiores dificuldades de atuação. Segundo o comandante do batalhão de São Gonçalo, coronel Ruy França, os bandidos instalaram barricadas com ferros, pregos e até mesmo botijões de gás para atrapalhar o acesso às comunidades. “Os moradores são os prejudicados. Realizamos ações para desobstruir as passagens, mas os bandidos recolocam as barricadas logo”, comentou.
Na avaliação do titular da Delegacia de Homicídios de Niterói, São Gonçalo e Itaboraí, Fábio Barucke, 80% dos assassinatos estão ligados ao tráfico. A especializada registra média de 25 homicídios por mês. “As testemunhas ficam com medo de procurar a polícia por receio de sofrer represálias dos bandidos. Mesmo assim, conseguimos elucidar 30% dos casos relacionados ao tráfico”.
Preço de alguns produtos aumenta sem segurança
O aumento da violência também tem pesado no bolso dos moradores de São Gonçalo. Com uma elevação de 162% nos índices de roubos de cargas, no período entre 2011 e 2016, os consumidores finais chegam a pagar 35% a mais por alguns produtos. Os dados são de um estudo realizado em fevereiro pelo Sistema Firjan.
De acordo com o gerente de infraestrutura da entidade, Riley Rodrigues, o prejuízo para a indústria com o roubo de cargas nos últimos seis anos somou mais de R$ 158 milhões em São Gonçalo.
“O valor do frete e do seguro das cargas aumentou cerca de 13% e as empresas repassam esse reajuste para o consumidor. O preço de alimentos e bebidas pode subir 30%, os medicamentos chegam a 35% e os eletroeletrônicos podem ter o valor reajustado em até 30%”, explicou. Algumas empresas, segundo Rodrigues, estudam a possibilidade de suspender as atividades no estado devido ao elevado índice de roubos.