Por adriano.araujo

Rio - Familiares de Vanessa Vitória dos Santos, 11 anos, estão na manhã desta quarta-feira no Instituto Médico Legal (IML) para liberar o corpo da criança, morta com um tiro na cabeça dentro de casa durante tiroteio na Favela Camarista Méier, no Complexo do Lins. Segundo Leandro Monteiro de Matos, pai da menina disse que testemunhas do fato afirmam categoricamente que a criança foi morta por tiros disparados pela PM. Ele diz que a filha não foi "vítima de bala perdida".

"Não foi bala perdida. No relato das testemunhas, todos dizem que não foi bala perdida. Atiraram da porta da casa e atingiram minha filha. Foi uma execução", defende Leandro.

Leandro Monteiro de Matos%2C pai de Vanessa%2C chora abraçado com familiares. Eles pretendem processar o estadoEstefan Radovicz / Agência O Dia

Leandro é separado da mãe de Vanessa, com quem também teve outros dois filhos. O carinho pela filha, que sempre via nos fins de semana e com quem esteve na última segunda-feira, fica expresso em suas palavras.

"Minha filha é tudo para mim. Tenho uma filhinha de dois anos, do meu outro casamento, mas ela era minha primeira filha, além dos irmãos dela (de 20 e 10 anos). Sempre ficava com ela os fins de semana", disse, aos prantos.

Segundo o pai da vítima, a família pretende processar o estado e vai acompanhar as investigações até que o culpado seja preso. "Eu vejo isso direto na TV, jornal, sabe, muita luta dos parentes (de vítimas da violência) e nada muda. Como todos os outros, quero Justiça, que não fique impune", falou.

Leandro disse que não foi procurado por ninguém por parte do governo até o momento. "Não, ninguém. Só amigos dando força, uma ong (Rio de Paz) que está dando um suporte, apoio sentimental."

O corpo de Vanessa passou por necrópsia e foi liberado no fim da manhã do IML. O enterro da menina será no Cemitério de Inhaúma, na Zona Norte, às 13h desta quinta-feira. O velório começará às 6h.

Questionada sobre as acusações, a Coordenadoria de Polícia Pacificadora (CPP) disse que o caso está sendo investigado pela Delegacia de Homicídios (DH-Capital), que vai ouvir os familiares. Perguntada sobre a investigação, a Polícia Civil, através de sua assessoria, não deu informações sobre o caso. 

O governador Luiz Fernando Pezão se manifestou sobre o caso na tarde desta quarta-feira. Pezão determinou à Secretaria de Estado de Direitos Humanos que preste toda a assistência à família da menina Vanessa.

Segundo a assessoria do governo do estado, representantes da secretaria estão reunidos com a família no Instituto Médico Legal (IML). Ainda hoje o secretário Átila Nunes também receberá a família da menina. "Sabemos que é pouco diante dessa devastadora tragédia, mas faremos o possível para abrandar essa dor, que também é nossa. Estamos fazendo tudo a nosso alcance, junto com o governo federal, para solucionar a crise do Rio", afirmou Pezão.

O governador também determinou providências à Secretaria de Segurança na elucidação dos fatos criminosos ocorridos no Rio. 

Caveirão e tiros em horário escolar

Uma professora que pediu para não se identificar disse que os tiros começaram ontem às 15h na porta da escola quando ainda havia crianças estudando.

A pequena Vanessa chegou morta ao Hospital Salgado FilhoReprodução

"Às 15h, já tinha confronto na porta da Gama Filho (escola). Eu estava com cinco crianças. O caveirão (blindado da PM) chegou atirando perto da escola. As crianças correram desesperadas e eu fiquei tentando segurá-las. Eles (policiais) não podem entrar no horário de aula. Claro que existem bandidos, mas há pessoas de bem também", contou a professora.

O secretário de Educação César Benjamin se reuniu com professores, pais de alunos e representantes da Escola Municipal José Eduardo de Macedo Soares, onde Vanessa estudava. "Temos uma missão e neste momento vamos fazer de tudo para continuar. Estamos fazendo o possível para combater a violência, ouvindo os problemas dos professores dessa região. Não podemos demonizar a polícia, porém está claro que a maneira de ação dela não vale a pena. Colocar uma menina na linha de tiro é inadmissível. O modo de atuação da PM está errado e isso precisa mudar. Nenhuma morte pode ser aceita e de modo algum uma operação da polícia pode ser feita de maneira que coloque a vida de um inocente em risco", disse o secretário.

Clima de revolta

?No hospital, após a tentativa de socorro da menina, o clima era de revolta e tristeza entre os familiares. Ao saber da morte de Vanessa, a mãe e a tia da criança passaram mal e precisaram ser amparadas em cadeiras de roda. A avó da criança, Maria Socorro dos Santos, comentou o ocorrido.

"Ela tinha voltado da escola e estava em casa. A madrinha pediu que ela saísse da porta, por conta do tiroteio. Foi o momento em que ela foi baleada, caiu e foi socorrida pela madrinha. Ela estava respirando até chegar aqui no hospital. Ela era uma boa menina, só ia para escola, gostava de estudar. Há cinco anos, o tio dela também morreu baleado na cabeça, do mesmo jeito", contou, entre lágrimas.

O irmão de Vanessa, Ygor dos Santos, disse que a familia está indignada. "Ninguém tinha ouvido falar de operação, a polícia chegou atirando. E eu vi minha irmã caindo no chão na hora", disse.

Madrinha de Vanessa chora com o sangue da criança%2C acompanhada da avó da menina%2C aos prantosDaniel Castelo Branco / Agência O Dia

"Minha filha estava botando o chinelo para sair e foi morta. Não tem bandido na minha casa. A comunidade é um lugar tranquilo. Não era para ter acontecido isso", contou a mãe de Vanessa, Adriana Maria dos Santos.

A madrinha, Regineide, que estava presente no momento do tiroteio, chegou coberta de sangue à emergência do hospital e relatou o ocorrido: "Os policiais pediram para entrar na casa, a Vanessa estava na porta, se preparando para sair, quando ouvi os tiros. Pulei em um valão atrás da casa, para me proteger, e quando voltei vi minha afilhada caída no chão". Foi ela quem socorreu a menina: "Fiz um escândalo, gritei para os policiais que eles haviam matado a Vanessa. Eles nos levaram para o hospital em uma viatura, ela veio no meu colo", relatou, chorando.

Com o estagiário Rafael Nascimento

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