Rio - Dois meses após o Ministério da Saúde (MS) declarar o fim da Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (ESPIN), em decorrência do vírus zika e sua associação com a microcefalia e outras alterações neurológicas, a organização internacional de direitos humanos Human Rights Watch divulgou um relatório alertando que o perigo não passou.
A conclusão se deve ao fato de o Brasil não ter eliminado as causas que levaram ao surgimento da epidemia do vírus da zika. Para os pesquisadores, o Brasil precisa eliminar os focos de reprodução do mosquito e investir mais em infraestrutura para o tratamento da água e esgoto.
O estudo revelou que, em pleno Século 21, 35 milhões de brasileiros não têm banheiro em casa e metade da população não conta com tratamento de esgoto. É necessário também melhorar a saúde pública.
O relatório adverte que a população deve continuar em alerta. “Essa pesquisa quer chamar a atenção, dizer que o problema não terminou e ainda há muito o que ser feito para que os problemas que permitiram que a epidemia de zika tivesse o alcance que teve, persistem. E merecem, necessitam, de uma solução imediata pra evitar novos surtos”, declarou o pesquisador João Guilherme Delgado Bieber.
O relatório também critica as ações do governo. Destaca que muitas crianças suspeitas de ter síndrome de zika permanecem sem um diagnóstico confirmado (3.236 casos), o que se torna um obstáculo ao acesso a serviços de estimulação precoce e serviços especializados de reabilitação, fundamentais para uma melhor qualidade de vida dos pequenos com microcefalia, além do Benefício de Prestação Continuada, que é de um salário mínimo.
No entanto, até entre os diagnosticados a dificuldade do atendimento é grande. Segundo o relatório, em abril de 2017, dos 2.653 casos confirmados, 58% não estavam recebendo cuidados em estimulação precoce e 42% em serviços de reabilitação.
O relatório informa ainda que cerca de 25% das mamães que tiveram bebês com microcefalia, entre novembro de 2015 e setembro de 2016, tinham menos de 20 anos, dentre as quais 35 meninas de 10 a 14 anos. Desde novembro de 2015, foram notificados ao MS, 13.490 casos de microcefalia associada à zika, com 2.653 confirmações.
Em 2017, foram confirmados 230 casos da anomalia e outras alterações do sistema nervoso, sugestivos de infecção congênita. Permanecem em investigação pelo órgão e pelos estados 2.837 casos suspeitos em todo o país. No total, 3.651 casos foram notificados pelos estados. O Ministério da Saúde não quis se manifestar.
Luiz depende de doações
Mãe do pequeno de Maricá, que nasceu com microcefalia, reclama de descaso
“O descaso ainda é muito grande”. A afirmação de Pollyana Rabello, mãe do pequeno Luiz Philipe, que nasceu com microcefalia em dezembro de 2015, durante o surto da síndrome associada à zika, resume o sentimento das famílias que dependem de apoio do governo para cuidar dos bebês atingidos pela síndrome.
O benefício de um salário mínimo, previsto na Constituição, ela só começou a receber no mês passado, após um ano e meio de idas e vindas aos postos do INSS. Pollyana mora em Maricá, mas lá, ela não encontra o atendimento que Luiz necessita. Tanto que o tratamento fisioterápico do menino é feito, de graça, na Associação Pestalozzi de Niterói. As consultas médicas acontecem no Instituto Fernandes Figueira, no Flamengo.
O custo com a condução pesa no orçamento da família. “Cada vez que levo ele, gasto em média R$ 20,00”, contou Pollyana, explicando que o passe especial só é aceito nos ônibus de Maricá. O tratamento com fonoaudiólogo, imprescindível para crianças nessas condições, ela ainda não conseguiu.
Até hoje, Pollyana necessita da ajuda de pessoas, algumas anônimas, para conseguir mantimentos, remédios e dinheiro. A carência prejudica o desenvolvimento da criança. Prova disso é que Luiz, prestes a completar dois anos, ainda não fica de pé e pouco interage.