Rio - Já imaginou receber uma multa de trânsito por dirigir sem cinto de segurança mesmo sem ter tirado o carro da garagem? E quando você recebe duas multas diferentes por uma infração, no mesmo local e horário? Casos como estes que parecem evidenciar um possível erro dos órgãos de trânsito e que deveriam ser resolvidos com um simples pedido de anulação das multas se tornam um verdadeiro martírio na vida dos condutores, que tiveram seus processos indeferidos.
Quando recebeu em seu apartamento uma notificação emitida pelo Detran-RJ, o psicólogo Marcelo Gesualdi, de 45 anos, achou que seria fácil resolver o problema. De acordo com o documento, Gesualdi teria sido flagrado por um PM trafegando sem cinto de segurança no último dia 19 de janeiro, às 17h07 da tarde, na Linha Vermelha. O condutor recorreu da decisão e apresentou em sua defesa fotos que foram tiradas das imagens de câmeras de segurança do prédio onde mora, que provariam que o seu veículo estava estacionado na garagem no momento da infração. Apesar das provas, o pedido de anulação da multa foi indeferido duas vezes.
Gesualdi desistiu de continuar recorrendo e pagou a multa de R$ 190. “Cheguei a procurar empresa especializada em recursos de multas, mas fui informado que a única maneira de ter o processo deferido é quando o órgão de trânsito comete algum erro no processamento da infração, seja pela cor equivocada do veículo ou quando a infração é entregue ao condutor fora do prazo. Me senti lesado, pois além da multa, fui chamado de mentiroso”, disse.
O motorista do aplicativo Uber, Lucas Porto, de 42 anos, teve a CNH retida por um mês e teve de passar por curso de reciclagem porque, segundo ele, perdeu o dobro de pontos na carteira do que deveria pelas irregularidades cometidas. Em cada uma das duas infrações, uma na Tijuca, por efetuar retorno proibido, e outra no Centro, por estacionamento em local irregular, ele foi multado por dois agentes de trânsito. “Eu recorri ao Detran, mas o processo foi indeferido. Cheguei a acionar a Justiça, mas foi arquivado por uma questão técnica do meu pedido. A burocracia foi tão grande que optei por pagar as multas e fazer o curso para recuperar a carteira”, lamentou.
O Detran informou que os principais critérios nas análises são: documentação, consistência dos autos e alegações da defesa juntadas. O órgão destacou que os agentes de trânsito gozam de presunção de legitimidade, cabendo ao condutor multado o ônus de provar que a infração não corresponde ao fato, com evidências incontestáveis. No caso de Marcelo Gesualdi, o órgão afirmou que a “apresentação de fotos particulares não foi suficiente”. No caso de Lucas Porto, o Detran informou que a infração foi lavrada por agentes do município.
Saiba como recorrer das infrações
Na avaliação do presidente da Comissão de Trânsito da OAB-RJ, Armando de Souza, os órgãos de trânsito violam o direito de defesa que está previsto na Constituição. “As pessoas não recorrem das multas porque não acreditam que esse processo será regularmente apreciado e que a Justiça será feita. O cidadão entra com pedido de produção de provas para anular multa, mas a solicitação sequer é analisada. Esses julgamentos precisam ser públicos”, ponderou o advogado.
Ainda segundo Souza, o cidadão tem direito de apresentar prova documental, testemunhal ou pericial. Caso o pedido de produção de provas seja indeferido, o cidadão pode recorrer ao Conselho Estadual de Trânsito, lembrou. O condutor pode ainda procurar advogado ou defensor público para acionar a Justiça.
Em caso de multas aplicadas pela Prefeitura do Rio, o condutor tem o prazo de até 20 dias (a partir do recebimento da notificação) para apresentar a defesa em posto da SMTR. Já em caso de multas aplicadas pelo Detran, o motorista tem o prazo de 15 dias para recorrer na sede do órgão, no Centro do Rio.
Samantha Monteiro de Oliveira, da Defensoria Pública, ressalta que o órgão pode ajudar o cidadão a entrar na Justiça, mas que, antes, ele têm de recorrer das penalidades junto aos órgãos de trânsito.