Por Flavio Serafini Deputado estadual pelo Psol

Há cerca de cem anos, mesmo após o fim da escravidão, o racismo continuava sendo institucionalizado no Brasil. Religiões e práticas ligadas aos negros eram proibidas e perseguidas. Os religiosos eram presos, alguns foram condenados, e assentamentos, vestimentas e instrumentos sagrados, apreendidos. Essa história de perseguição às religiões de matriz africana ocorreu na Primeira República (1889-1930) e na Era Vargas (1930-1945), quando três artigos do Código Penal vigente na época criminalizavam essas religiões.

É importante lembrar que no mesmo período o samba e a capoeira também eram considerados crimes, evidenciando ainda mais esse racismo. Ao longo desse período, no Rio de Janeiro, a polícia acumulou mais de 200 peças sagradas apreendidas em centros e terreiros. Com fim da proibição, estas peças deveriam ter sido devolvidas a seus donos, mas até hoje seguem sob tutela da Polícia Civil.

Desde 1945 o acervo fruto dessas apreensões racistas passou a ser exposto no Museu da Polícia, na antiga sede do Dops, sendo chamada de 'Coleção Magia Negra'. Estão ao lado de armas, insígnias nazistas e máquinas de falsificação de dinheiro. O nome da coleção demonstra a maneira desrespeitosa com que este acervo sagrado tem sido tratado. Este passado de perseguição deve ser reconhecido pelo Estado e a retirada das peças sagradas do Museu é forma de reparar este crime de racismo religioso e institucional.

A campanha Liberte Nosso Sagrado nasce, no início deste ano, a partir de demanda de diversos atores como movimento negro e especialmente as lideranças religiosas afro-brasileiras. Dia 19, ocorreu na Alerj audiência para debater a situação e o destino da coleção. Os religiosos e as lideranças defenderam a devolução simbólica dos objetos e a participação dos líderes da Umbanda e do Candomblé na gestão deste acervo em outro museu.

Criamos grupo de trabalho formado por parlamentares, lideranças religiosas, MPF, Polícia Civil e órgãos federais e estaduais da cultura. Encaminhamento foi a mudança do nome da coleção. Defendemos que esse grupo consiga libertar os objetos sagrados e devolvê-los aos proprietários. Em um momento de recrudescimento do racismo, inclusive na versão religiosa, com a invasão e destruição de templos e terreiros devolver as peças é reafirmar a necessidade do Estado superar suas heranças racistas e escravocratas. Repatriação histórica, já.

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