Por MARTHA IMENES

Brasília - Aposentados do INSS que continuaram a trabalhar com carteira assinada têm possibilidade de aproveitar as contribuições previdenciárias feitas após a concessão do benefício. Mesmo com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que em outubro do ano passado, considerou improcedente usar os recolhimentos posteriores para recalcular a aposentaria, a chamada desaposentação, a Justiça Federal reconheceu o direito a um novo benefício levando em conta apenas o que foi pago depois que a Previdência liberou a aposentadoria.

Os advogados denominam esse procedimento como “transformação da aposentadoria”. Sentença de 1ª instância em São Paulo, mantida pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região, garantiu a concessão de benefício maior para segurada da capital paulista. A diferença em relação ao outro é de 286%.

Em outubro de 2016%2C o STF considerou ilegal usar contribuições de aposentados que continuaram trabalhando no recálculo do benefícioNelson Jr./ Divulgação / STF

De acordo com o advogado da causa João Badari, do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados, de São Paulo, o valor da nova aposentadoria determinado pela Justiça foi de R$ 4.020,50. A segurada recebia originalmente R$ 1.040,83 quando a sentença foi proferida. O processo gerou atraso de R$ 196,6 mil.

Badari esclarece que é preciso, no entanto, que o segurado cumpra requisitos para pleitear a transformação, entre eles comprovar 180 contribuições posteriores à concessão da aposentadoria original e renuncie ao benefício que vem recebendo.

“Ao entrar com ação na Justiça, o segurado deve deixar claro que vai renunciar ao benefício mediante a transformação da aposentadoria, ou seja, em ato contínuo”, orienta o especialista, ressaltando que a possibilidade de renunciar à aposentadoria está pacificada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), por ser um direito patrimonial disponível.

Sobre o risco de ter que devolver algum valor por conta da renúncia, Badari descarta essa possibilidade. Ele explica que pelo caráter alimentar da aposentadoria, direito adquirido e boa-fé do segurado, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) é contrário à devolução de valores recebidos pelo aposentado em casos de renúncia.

O especialista explica que na transformação da aposentadoria, o segurado não pedirá a inclusão das novas contribuições no cálculo anterior, mas sim que o INSS desconsidere o período referente aos recolhimentos que resultaram na aposentadoria atual.

“É completamente diferente da desaposentação. Ele atingiu os requisitos para aposentadoria diferente da atual e não a contagem concomitante dos períodos como é na desaposentação”, compara.

O advogado explica que a desaposentação, na maioria dos casos, buscava trocar aposentadorias concedidas de forma proporcional pelo tempo de contribuição ou em razão do fator previdenciário inferior a um. Já na transformação, segundo ele, existe a desconsideração total da aposentadoria anterior, sem qualquer referência a primeira.

“De forma muito prática: na desaposentação você pede ‘some à minha atual aposentadoria o período que fiz contribuições após a concessão, gerando com isso novo cálculo e benefício maior que o atual’. Na transformação, o pedido é ‘não quero mais nada da atual aposentadoria, nem os recebimentos nem o custeio, e quero novo benefício de modalidade diferente do atual, em que nenhuma das minhas contribuições foram utilizadas na concessão da aposentadoria que estou renunciando’”, compara. 

É preciso cumprir requisitos da aposentadoria por idade

O advogado João Badari citou o exemplo de um homem que se aposentou com 35 anos de serviço, ou seja, por tempo de contribuição, quando tinha 53 anos de idade e continuou trabalhando. Ele pagou mais 15 anos após a concessão da aposentadoria do INSS, chegando a 68 anos de idade.

Segundo o advogado, neste caso, o segurado poderá usar o novo período de pagamentos para requerer outro benefício, abrindo não do anterior.

Badari explica que na transformação%2C não é pedida a inclusão das novas contribuições no cálculo anteriorDivulgação

Badari diz que essa pessoa preencheu os dois requisitos básicos para ter aposentadoria por idade (65 anos de idade e 180 contribuições), sem ter qualquer vínculo com o benefício anterior. Como não pode acumular as duas aposentadorias, terá que renunciar à anterior ao requerer a nova.

“Podemos citar também, no exemplo anterior, o aposentado que após dez anos de contribuição ao se aposentar se tornou totalmente inválido para o trabalho e necessita de cuidador permanentemente. Ele também pode renunciar à aposentadoria atual para obter o benefício por invalidez com a majoração de 25%, por ter atingido os requisitos legais para a concessão da aposentadoria por invalidez, sem considerar a anterior”, explica João Badari, referindo-se ao benefício por invalidez.

O especialista também cita o exemplo de uma mulher que se aposentou com 48 anos de idade e 30 anos de contribuição, mas se manteve no mercado de trabalho pagando a Previdência. Ela poderá fazer a transformação da aposentadoria quando estiver com 63 anos de idade. Assim, terá recolhido por mais 15 anos e ter ultrapassado o limite de 60 anos de idade, exigidos para trabalhadoras se aposentarem por idade.

O advogado lembra que professores e professoras, que têm aposentadoria especial, também podem se beneficiar da transformação. No caso dos homens o tempo de contribuição é de 30 anos e das mulheres de 25 anos de pagamento para o INSS.

Recálculo foi considerado ilegal pelo STF

Em outubro de 2016, o Supremo Tribunal Federal considerou ilegal o uso das contribuições de aposentados que continuaram trabalhando, a chamada desaposentação. O processo estava em julgamento na Corte desde 2014 e sofreu sucessivos pedidos de vista. Mais de 180 mil ações aguardavam a decisão.

Por 7 votos a 4, os ministros decidiram que a desaposentação era inconstitucional por não estar prevista na legislação. Votaram contra Dias Toffoli, Teori Zavascki, Edson Fachin, Luiz Fux, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Cármen Lúcia. A favor: Marco Aurélio, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski.

Sentença leva em conta novo pedido

Na sentença da Justiça Federal em São Paulo, o juiz afirmou que “não se cuida exatamente de uma desaposentação”. Ou seja, não se trata de um pedido de renúncia ao ato administrativo já constituído e consolidado. Para o juiz que deu ganho de causa é “um novo pedido de aposentadoria a partir da averbação tão somente, destaque-se, dos períodos laborados posteriormente à concessão daquele primeiro benefício”.

Na avaliação do juiz, “a renúncia aqui será à cobertura previdenciária concedida, com a obtenção de outra, mais vantajosa e totalmente distinta da anterior. Não há, nesse caso, uma soma entre as contribuições anteriores e posteriores à primeira aposentaria”.

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