Rio - A rotina do pastor Oziel Nascimento, da Assembleia de Deus de Queimados (Adeq), na Baixada Fluminense, é a mesma há 15 anos. Aos domingos, ele sai de casa para comandar o culto perante aos seus fiéis. No sábado da semana passada, porém, teve um compromisso extra: foi até um campo de futebol para levar suas palavras de fé e abençoar o seu time - e também o adversário - na estreia no Campeonato de Futebol Evangélico de Queimados, o maior evento esportivo entre as igrejas da região.

“Sempre que posso venho aqui para vê-los jogar. Faço orações para que ninguém se machuque e para que vença o melhor, afinal, o intuito do campeonato é promover a união entre as igrejas. Eu só não peço para meu time ganhar, porque senão Deus vai ficar em uma situação bem complicada”, brinca o pastor.
Em sua nona edição, o campeonato tem 22 times e é disputado em turno único ao longo de cinco meses. E segue à risca uma cartilha peculiar de regras. Na disputa evangélica não são permitidos palavrões - punidos com cartão amarelo - rivalidade, reclamações, catimba e muito menos entradas mais ríspidas. A ideia é levar a campo a harmonia cristã que sempre domina os cultos.
“São todos meninos de igreja e se dão bem. Mesmo jogando em lados opostos somos todos irmãos em Cristo”, garante o técnico da Adeq, Jessé Pompeu.
Apesar da promessa de uma atmosfera tranquila nas partidas, o capitão da equipe da Assembleia de Deus do Jardim Excelsior, Cristiano Guirá, fala em um tom mais sério.
“Futebol é um esporte de contato, todo mundo quer ganhar. Aqui é campeonato, não se pode brincar, não”, afirma.
Guirá admite que, às vezes, os ânimos se exaltam. Ele, entretanto, descarta confusões e revela como os jogadores evangélicos expressam a sua insatisfação com o árbitro ou com a falha de algum companheiro de equipe.

“Se o seu goleiro engole um frango o jeito é botar a mão na cabeça e soltar do fundo do pulmão: ‘Que isso, abençoado?’. Quando o juiz prejudica sua equipe tem sempre um ou outro que reclama: ‘Deus tá vendo, hein’, ‘Que isso, fiel?’, ‘Só Jesus na sua causa’. É assim”, revela.
Para tentar arrebanhar mais ovelhas, o regulamento também permite a inscrição de três atletas não-evangélicos por time. Situação que, segundo o pastor Oziel, já atraiu vários jovens para as igrejas evangélicas, mas que também já rendeu histórias engraçadas.
“Certa vez, eu vi um garoto esquentadinho e jogando com violência. Fui perguntar ao pastor da outra igreja se ele o conhecia e recebi uma resposta sincera: “Pastor Oziel, me desculpe, mas ele se converteu ontem. Ainda está em fase de adaptação”, conta.

O pastor também confessa que fica sem jeito com as gírias do futebol: “Quando gritam: Ladrão! Ladrão! Eu logo penso: ‘Meu Deus, aqui não tem isso não!’. Carniceiro e Matador, então, nem pensar. Brincadeiras à parte, são coisas que acabam saindo naturalmente no jogo, não é pecado. Pecado mesmo é perder um gol feito”, brinca o pastor.
Segundo o organizador do campeonato, Claudinei Oliveira, a final deste ano promete ser pomposa. Além da presença de autoridades locais, haverá a execução dos hinos Nacional e de Queimados, um pequeno desfile em carro aberto pelas ruas do bairro da igreja e ainda uma ajuda para financiar um churrasco. Regado a guaraná, é claro.