O palco para o anúncio da versão europeia do afrouxamento quantitativo utilizado com sucesso pelo Federal Reserve (Fed) até outubro do ano passado recebe os retoques finais. Além das decisões do BC suíço, aval legal explícito foi dado pela instância máxima dos tribunais da zona do euro. Falta agora a decisão, a ser tomada na quinta-feira, um dia depois da primeira reunião do ano do nosso Copom. O esperado alargamento da liquidez mundial terá influência sobre a decisão monetária interna? O Comitê não escolherá o tamanho da alta da Selic em função de uma “expectativa”, a de que o Brasil poderá ser inundado por dólares especulativos que vazem do pote europeu, provocando uma apreciação cambial que atenue as pressões inflacionárias domésticas — caso em que poderia aplicar uma alta de apenas 0,25 ponto à Selic, já encerrando o ciclo de aperto com a taxa em 12%. Mais provável é que o BC pague para ver: sem fugir ao consenso do mercado, deve puxar o juro básico em 0,50 ponto, escrever um comunicado flexível e vago e esperar os acontecimentos. Terá até 4 de março, data da segunda reunião de 2015, para avaliar e sopesar com cuidado não só a decisão do BCE como também a do Fed, no dia 28, e as implicações das eleições gregas do domingo 25.
As taxas de juros longas dos EUA caíram pesadamente ontem não só porque as divergências interpretativas em relação às medidas suíças ampliaram a aversão global a risco, responsável pela alta do dólar em relação ao real, como, internamente, os dados sugeriram uma economia americana ainda com dificuldades para deslanchar. O rendimento da T-Note de 10 anos recuou de 1,84% para 1,77%. A inflação continua distante do alvo de 2% do Fed. O PPI (índice de preços ao produtor, a inflação no atacado) acusou deflação de 0,3% em dezembro, fechando 2014 com alta de 1,1%. Hoje sai o CPI (consumidor) e a projeção é de uma deflação no mês passado de 0,4% e avanço no ano de 0,7%. Nenhum banco central do mundo precisa subir o juro diante de tais números, nem se os 12 assentos do Fomc fossem ocupados por clones de Esther George, a austera presidente do Fed de Kansas.
O mercado de trabalho americano não anda lépido. Os especialistas esperavam que o número de pedidos de auxílio-desemprego caísse de 297 mil na semana anterior para 291 mil na semana passada, mas subiram para 316 mil. E os sinais emitidos pela indústria são mistos e contraditórios. Enquanto o índice Empire State de atividade manufatureira na região de Nova York subiu para 9,95 este janeiro, superando o avanço previsto em 5 por analistas, o índice de atividade industrial do Fed da Filadélfia cedeu de 24,3 em dezembro para 6,3 em janeiro. Os economistas já esperavam uma queda, mas somente para 18,7.
O fiel da balança da política monetária brasileira será a taxa de câmbio dos próximos meses. O dólar se locomove em função de expectativas, não dos fundamentos atuais. Se o consenso é de melhora da questão fiscal a ponto de afastar o temor de um “dowgrade” do risco soberano, não há nenhum receio em se investir no Brasil num momento de onda deflacionista mundial, juros perto de zero e abundante liquidez. Nesse cenário, o Copom não precisa ampliar a atratividade dos títulos públicos brasileiros. A economia não suporta mais rodadas adicionais de aperto monetário. Nem o pregão de juros futuros da BM&F conseguiu utilizar o IBC-Br acima das previsões como argumento para altas do DI. O índice de atividade do BC subiu em novembro 0,04%, quando o mercado projetava queda de 0,20%. A economia mostra-se estagnada, o mercado de trabalho não sanciona mais o reajuste dos serviços e o repasse das correções tarifárias aos preços finais será desestimulado pela atividade débil.
As oscilações do dólar no mercado doméstico foram desconcertantes. De manhã, chegou a cair abaixo de R$ 2,60, cotado a R$ 2,5955, preço mais baixo em quase um mês. Mas à tarde a recuperação foi fulminante, e a moeda fechou a R$ 2,6422, com valorização de 0,80%. Os contratos futuros de juros negociados na BM&F seguiram a marcha declinante das taxas internacionais. O contrato com vencimento na virada do ano cedeu de 12,67% para 12,62%, enquanto o juro para janeiro de 2017 refluiu de 12,45% para 12,37%.