Por marta.valim

O banco de fomento e o fundo que serão oficialmente criados hoje durante a Cúpula dos Brics representam, na opinião de especialistas ouvidos pelo Brasil Econômico, um marco na relação entre os países que compõem o bloco, formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Segundo os analistas, os mandatários das nações em desenvolvimento que se reunirão hoje em Fortaleza estão criando, na prática, um mecanismo de financiamento de curto prazo alternativo ao Fundo Monetário Internacional (FMI), o que representa um redimensionamento do papel dos Brics no cenário mundial.

“Nessa cúpula, os Brics deixam de ser simplesmente um prospecto do Goldman Sachs, o banco de investimentos que criou o acrônimo, e se transformam em vetor político. Ao adquirir o potencial de financiar conjuntamente projetos para o desenvolvimento, os Brics ganham uma maior projeção internacional”, afirmou o pesquisador do think tank carioca Brics Policy Center/Centro de Estudos e Pesquisas Brics, Sérgio Veloso.

Segundo ele, ainda que Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul não cresçam hoje ao mesmo ritmo que alcançavam em 2001 — quando o economista-chefe da Goldman Sachs, Jim O’Neill, criou o acrônimo — eles tendem a ampliar sua importância política no cenário internacional. Veloso considera os novos passos dos Brics importantes também para o Brasil.

“Muito diferente do Brasil dos anos 1980, que dependia de organismos financiadores para implementar seus projetos de desenvolvimento, agora o país passa a ter um potencial de financiamento de outros países. Deixamos de ser receptores de desenvolvimento para ser vetores”, acrescentou.

Em Fortaleza, o empresário Jorge Gerdau Johannpeter mostrou uma visão pragmática: “Alguns países do Brics veem nisso uma forma de se contrapor aos Estados Unidos, mas eu diria que, para o Brasil, com sua diversidade, quanto mais portas abertas, melhor.” O presidente da Inter.B Consultoria Internacional de Negócios, Claudio Frischtak, concorda.

“Qualquer movimento de integração da nossa economia com a economia mundial é positivo. Não podemos ficar no isolamento. E os Brics são também uma oportunidade para o avanço nas relações bilaterais do Brasil. Temos uma relação comercial forte com a China, mas ainda temos que aprofundar nossas trocas com Índia e Rússia, em especial, no agronegócio, mas também em manufaturados”, afirmou.

Para Frischtak, ao criar o fundo, os Brics passam a constituir uma alternativa ao Fundo Monetário. “O fundo dos Brics é quase uma resposta ao FMI, do qual há muito tempo espera-se uma revisão nas cotas, dando espaço aos países em desenvolvimento, o que vem sendo adiado por que os países europeus vêm fazendo uma espécie de ‘corpo mole’”, disse o especialista, lembrando que, pelo acordo de Bretton Woods, de 1944, o FMI ficou responsável por solucionar as crises financeiras de curto-prazo enquanto o Banco Mundial tornou-se o encarregado dos projetos de médio e longo prazo. “Como esse fundo pode ser utilizado no curto prazo, está claro que ele é uma resposta reativa ao papel do FMI”, acrescentou.

O presidente da Inter.B destacou também que o banco de fomento, por sua vez, terá uma importância também estratégica para a China, que é hoje o país visto com maior capacidade de financiamento entre os Brics.

“O banco dos Brics será uma forma de a China diluir a superexposição que vem tendo nos financiamentos, especialmente, a países africanos. Há grandes projetos hidrelétricos a serem financiados na África, mas sempre que concede empréstimos à região, a China é acusada de querer contar com os recursos naturais africanos”, considerou.

Ciente de seu peso econômico, a China estaria também mais aberta à entrada de outros países nos Brics, como a Argentina. Mas ontem o presidente da Rússia, Vladimir Putin, em entrevista à agência de notícias Itar-Tass, disse que o assunto não estará em pauta na reunião de hoje./ com ABr

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