Por adriano.araujo

Brasília - O vice-presidente Michel Temer classificou nesta sexta-feira como “adequado” o discurso da presidente Dilma Rousseff na Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York. Havia a expectativa de que a presidente pudesse fazer uma fala mais dura a respeito da situação política do País, cinco dias após a Câmara ter aberto o processo de impeachment.

“Acho que foi adequado, nada mais do que isso”, disse Temer, que está no exercício da Presidência da República. Temer preferiu, no entanto, não usar o gabinete da Presidência da República e despachar de seu próprio gabinete, no prédio anexo ao Palácio do Planalto.

Desde o começo da semana, Temer procurou responder às acusações de que há um golpe em curso no País por causa do processo de afastamento de Dilma. Para ele, o objetivo do governo é desqualificá-lo, já que, caso o processo seja aprovado, ele assumiria o cargo.

Temer%2C que está no exercício da Presidência%2C assistiu ao discurso de Dilma no Palácio do JaburuAgência Brasil

“Acho que o Brasil não merece desqualificação e eventuais agressões à vice-presidência”, afirmou. “Não é coisa do vice-presidente, mas é coisa do Brasil.” Temer ressaltou ainda que vai esperar a decisão do Senado, que precisa referendar o afastamento autorizado pela Câmara. “Vou aguardar silenciosa e respeitosamente a decisão do Senado. Antes disso, não posso dizer nada”, disse Temer.

No últimos dias, Temer concedeu entrevistas ao Financial Times, Wall Street Journal e The New York Times. Na maior parte das vezes, ele afirmou que o processo de impeachment no Brasil tem sido acompanhado de perto pelo Supremo Tribunal Federal (STF), tribunal responsável por zelar a Constituição.

“Fui provocado para dar aquelas entrevistas e achei que deveria dizer alguma coisa à imprensa internacional”, disse.

Dilma fala em 'grave momento'

A presidente Dilma Rousseff disse nesta sexta-feira, no plenário da Organização das Nações Unidas (ONU), que a sociedade brasileira conseguiu superar o autoritarismo e construir uma democracia pujante e saberá “impedir quaisquer retrocessos”. Dilma não fez referência direta ao processo de impeachment nem mencionou a palavra “golpe”, mas agradeceu aos líderes que manifestaram solidariedade a ela.

A menção à situação interna do Brasil ocupou menos de 1 minuto dos 8 minutos e 42 segundos em que a presidente discursou, durante a cerimônia de assinatura do Acordo de Paris sobre mudança climática. No restante do tempo, Dilma elogiou o tratado, ressaltou o papel desempenhado pelo Brasil em sua negociação e prometeu ratificá-lo e implementá-lo o mais rápido possível.

“Não posso terminar minhas palavras sem mencionar o grave momento que vive o Brasil”, declarou, no fim de seu pronunciamento. “O Brasil é um grande País, com uma sociedade que soube vencer o autoritarismo e construir uma pujante democracia”, ressaltou. “O povo brasileiro é um povo trabalhador, que tem grande apreço pela liberdade. Saberá, não tenho dúvidas, impedir quaisquer retrocessos.”

Na Assembleia Geral da ONU%2C a presidente Dilma Rousseff desiste de falar em golpe parlamentar%2C mas diz que povo “saberá impedir retrocessos”Roberto Stuckert Filho/PR

A presidente foi aplaudida de forma protocolar antes e depois do discurso pelos líderes presentes no plenário. “Sou grata a todos os líderes que expressaram a mim sua solidariedade”, disse ela ao encerrar o discurso.

O tom da fala de Dilma frustrou militantes petistas. Mas atendeu à estratégia da cúpula do partido e do governo. Chamado de protocolar por parlamentares e militantes do PT, o teor do discurso foi discutido na véspera pela presidente e colaboradores.

Segundo petistas, Dilma foi encorajada a dar um caráter de estadista para não ser acusada de fomentar a crise econômica ou de afrontar o Supremo Tribunal Federal (STF). Aliados da presidente chegam a afirmar que em nenhum momento houve a intenção de denunciar o que chamam de golpe. As críticas à oposição e ao vice-presidente Michel Temer ficariam reservadas a uma entrevista coletiva à imprensa estrangeira.

Depois de participar da cerimônia de assinatura do acordo do clima na ONU, a presidente visitou o Museu de Arte Moderna (MoMa) para ver a exposição "Uma Estranha Nova Beleza", que reúne gravuras pouco conhecidas do artista francês Edgar Degas (1834-1917).Antes de visitar a mostra, Dilma almoçou no restaurante do museu The Modern.

Para oposição, pressão do STF funcionou

Líderes de oposição concluíram ontem que a presidente Dilma Rousseff não mencionou explicitamente o “golpe” em seu discurso na ONU após pressão dos ministros do Supremo Tribunal Federal, evitando assim que o País passasse por um constrangimento internacional.

O líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO), disse que Dilma teve “bom senso”. “É claro que a pressão que foi exercida pelo STF e pelo Congresso surtiu efeito e acabou dando um pouco de bom senso para que a presidente não enveredasse para uma linha que levaria a um constrangimento enorme. Felizmente, caiu a ficha da presidente”, disse Caiado.

“O puxão de orelha do Supremo, que é guardião da Constituição, foi importante para que Dilma recuasse dessa ideia fixa de falar de golpe na ONU. Esperamos que a partir de agora a presidente seja sensata e adote uma postura responsável de acordo com o cargo que ocupa”, afirmou o deputado Rubens Bueno (PR), líder do PPS na Câmara.

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