São Paulo - A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, nesta terça-feira, que mulheres grávidas ou com filho de até de 12 anos, ou mães de filhos deficientes que estejam presas preventivamente têm direito de ir para a prisão domiciliar. Ao menos 4 mil mulheres podem ser beneficiadas com a determinação, 'praticamente 10% do total de presas no País', segundo dados trazidos ao processo pelo IBCCrim (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais), pelo Instituto Terra, Trabalho e Cidadania e pela Pastoral Carcerária, com base em números de 24 estados.
A decisão foi dada em um pedido da Defensoria Pública da União (DPU). O ministro relator do caso, Ricardo Lewandowski, determinou que seja imediata a transferência das presas cujos nomes foram relatados ao processo no Supremo, através do Depen (Departamento Penitenciário Nacional) ou das autoridades estaduais. Para as outras detentas que estejam nessa mesma situação, os tribunais federais e estaduais devem dar cumprimento às determinações estabelecidas pelo Supremo em até 60 dias. O benefício também será concedido para às adolescentes sujeitas a medidas socioeducativas, grávidas ou com filhos de até 12 anos.
O habeas corpus coletivo - tipo de ação que julgada - foi ajuizado no Supremo em maio do ano passado, pelo Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos (CADHu). No entanto, o ministro Lewandowski entendeu que seria ideal reconhecer a legitimidade ativa à DPU, "por se tratar de ação de caráter nacional, e admitir as impetrantes como assistentes, em condição análoga à atribuída às demais Defensorias Públicas atuantes no feito", decidiu o ministro, que no dia 19 de dezembro liberou a ação para ser julgada pela Segunda Turma do Supremo.
A Corte também discutiu a validade de habeas corpus coletivo, sobre o qual o Ministério Público Federal (MPF) havia dado um parecer negativo. "É chegada a hora de exercer um pouco de coragem", disse Lewandowski ao votar pelo conhecimento da ação.
Durante seu voto, o ministro também criticou os estados que não enviaram os dados, incluindo São Paulo. "Alguns Estados até hoje se recusaram a apresentar o número dessas presas. São Paulo lamentavelmente não tem mapeada a situação dessas presas", afirmou Lewandowski.
"Mais de dois mil pequenos brasileirinhos estão atrás das grades, contra o que dispõe a Constituição", destacou o ministro, que foi seguido pelos ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Celso de Mello. Vencido, o ministro Edson Fachin queria maiores restrições para a aplicação dessa transferência.
Exceções
Além do benefício não atender às mulheres grávidas ou com filhos de até 12 anos que já estejam condenadas e cumprem pena, os ministros também firmaram que são exceções os casos de presas que cometeram crimes praticados com violência ou grave ameaça, contra seus descendentes. As explicações para esses casos deverão ser "devidamente fundamentadas" pelo juízes que negarem o benefício, comunicando prontamente ao Supremo sobre a decisão
Durante seu voto, o ministro Dias Toffoli destacou outras hipóteses de exceção, como para as mulheres que usam seus filhos menores de 12 anos para o cometimento de crimes. "Penso que são essas as situações excepcionais", completou Lewandowski, concordando.
Defesas
O defensor público da União, Carlos Eduardo Barbosa Paes, afirmou durante o julgamento que não é preciso de "muita imaginação para perceber os agouros do cárcere para recém nascidos, especialmente para suas mães", destacando que a "realidade" dos cárceres é de "saltar aos olhos".
Durante a tramitação do processo na Corte, o Ministério Público Federal se manifestou contrário ao STF analisar o habeas corpus coletivo. Para o órgão, é inviável conceder a prisão domiciliar "para coletividades indeterminadas e indetermináveis, com reflexos inclusive futuros (mulheres a virem ser presas preventivamente), bem como pela inviabilidade de exame da eventual situação de constrangimento no caso concreto".
Os pedidos
De acordo com os advogados que assinam o pedido inicial, a determinação da prisão preventiva as mulheres grávidas ou mães de até 12 anos as priva de acesso a programas de saúde pré-natais, a assistência regular ao parto e pós-parto, condições razoáveis de higiene e autocuidado e priva as crianças de condições adequadas de desenvolvimento.
De acordo com dados trazidos pelo IBCCrim ao processo, o Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) divulgou em dezembro de 2017 um novo levantamento de Informações Penitenciárias (INFOPEN). Os números indicam que 74% das mulheres encarceradas tem, ao menos, um filho. "Tal porcentagem é bastante expressiva, sobretudo quando se pondera que a informação sobre a quantidade de descendentes só estava disponível em 9% do total de casos consultados no levantamento, que tampouco leva em consideração questões socioeconômicas ou recortes de gênero", afirmam na manifestação.
Os dados do Depen também mostram que para os casos de gestantes, lactantes, e mulheres que acabaram de dar a luz, 49% das unidades consideradas "femininas" não tem espaço reservado e próprio para acomodar gestantes, e 48% não contam com berçário ou centro de referência.
"Nas unidades ditas "mistas", que como visto abrigam a maior parte da população carcerária feminina, a situação é naturalmente pior: 90% não apresenta infraestrutura com celas adaptadas para a maternidade e em 86% delas faltam berçário ou centros de referência", argumenta o IBCCrim.
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