Da esquerda para a direita: Hamilton Mourão (PRTB), Ana Amélia (PP), Manuela d'Ávila (PCdoB), Kátia Abreu (PDT) e Eduardo Jorge (PV)Montagem sob divulgações e Agência O DIA
Por DIRLEY FERNANDES
Publicado 23/09/2018 07:30 | Atualizado 23/09/2018 09:44

Rio - Não é à toa que todos os candidatos a presidente demoraram a escolher os seus vices nessa campanha. No chamado 'presidencialismo de coalizão' - o nosso 'regime' de governo, no qual o presidente depende do apoio de muitos e variados partidos para conseguir governar -, o companheiro de chapa certo pode ajudar muito nas eleições e em uma eventual gestão. Ou pode atrapalhar muito, se resolver conspirar contra o ocupante do Palácio do Planalto.

Independente das transações partidárias envolvidas na escolha, convém ao eleitor ficar de olho em quem são os candidatos ao cargo de vice. A razão é muito simples: desde o fim da Ditadura, das cinco chapas eleitas para comandar o Executivo, seja por força do destino ou pelas fragilidades da democracia brasileira, em três casos o vice acabou assumindo a presidência (José Sarney, Itamar Franco e Michel Temer). É bom sabermos em quem estamos votando, especialmente com o pouco apego que os políticos brasileiros têm com os programas de governo registrados na Justiça Eleitoral.

"Mesmo sem um cargo efetivo, o vice costuma desfrutar de certa influência política. Ele serve tanto como representante de um grupo político, para dentro do governo, como dos titulares do cargo (o presidente) em missões delegadas", explica o cientista político Hilton Fernandes, da FESPSP.

O pesquisador lembra que "o eleitor geralmente vota pensando apenas no candidato principal". Glauco Peres da Silva, pesquisador da USP, alerta que cabe ao eleitor ter atenção para toda a chapa. "Com tantos partidos, essas composições que agregam apoios são necessárias. De certa forma, salvo em casos sui generis, até funcionam", diz.

Antes do golpe militar de 1964, era possível escolher um presidente de uma chapa e o vice de outra, o que inspirou o voto 'Jan-Jan' (Jânio Quadros, da UDN, para presidente, e João Goulart, do PTB, para vice, dois políticos ideologicamente bem distintos). O mandato dos dois terminou como se sabe, o que torna difícil imaginar que o sistema seja eficiente. "O processo atual favorece, teoricamente, uma maior coesão entre titular e vice. Isso permite maior previsibilidade no governo", diz Fernandes.

Sobre as chapas formadas para a eleição presidencial, algumas chamam a atenção por excesso e outras por falta dessa "coesão". No primeiro caso, está a dupla Jair Bolsonaro (PSL)-Hamilton Mourão (PRTB). Além da hierarquia torta (o vice é general; o presidente, capitão), o que não é um detalhe para quem se formou na caserna, a escolha do oficial superior pouco agregou à candidatura do deputado federal, já que a área de influência de Mourão é o mesmo em que ele sempre atuou, as Forças Armadas.

Já Ciro Gomes (PDT) tem como vice a senadora Kátia Abreu (PDT-TO), liderança do agronegócio que, por exemplo, milita contra a lista publicada pelo Ministério do Trabalho de empresas autuadas por trabalho análogo à escravidão. "A escolha de Ciro gera estranheza pelo perfil bastante diverso do dele, que procura ocupar espaço entre os eleitores de esquerda. No caso do Bolsonaro, ele escolheu o vice de um partido que se comporta de forma fisiológica no Brasil inteiro, o PRTB", diz Fernandes. "Não foram as primeiras opções. Foi o que o quadro ofereceu", lembra Silva.

Haddad (PT) escolheu como vice Manuela d'Àvila, de um partido historicamente alinhado ao PT, o PCdoB; Alckmin (PSDB), uma senadora de perfil conservador (Ana Amélia, do PP-RS) e Marina Silva (Rede), um militante da área da Saúde de perfil algo folclórico (Eduardo Jorge, do PV-SP). 

CONFIRA MAIS SOBRE OS VICES

HAMILTON MOURÃO - O general que fala tanto que o capitão mandou ficar quieto

Entre seus pares, o general especialista em guerra na selva tem tanto prestígio que foi eleito por aclamação presidente do Clube Militar. Entre os detratores, é motivo de espanto permanente. Ciro Gomes (PDT) já o chamou, mais de uma vez, de “jumento de carga”. No momento, ele cumpre uma Lei da Mordaça, determinada pelo chefe, Jair Bolsonaro (PSL), que só o aceitou como vice depois de ter sido rejeitado pelo senador Magno Malta (PR) e pela advogada Janaína Paschoal (PSL). O general disse na segunda-feira passada que crianças criadas por mães e avós tendem a ser “desajustadas” e alimentar quadrilhas de traficantes. Como o chefe, já se referiu aos negros de forma pejorativa, acusando-os de legar a “malandragem” à cultura brasileira. O general foi removido do Comando Militar do Sul em 2015, ao homenagear o coronel Brilhante Ustra, acusado de corresponsável por 500 casos de tortura. Em 2017, defendeu abertamente um golpe militar. “Ou as instituições solucionam os problemas políticos (...) ou nós teremos que impor isso”, disse, em palestra. Já como vice de Bolsonaro, lançou a tese do “autogolpe” em entrevista à GloboNews. Seria uma iniciativa do presidente, com apoio das Forças Armadas, em caso de não haver “respeito à autoridade” e “anarquia”

ANA AMÉLIA - Antipetista gaúcha para agradar fãs de Bolsonaro

Na quarta-feira, uma reunião dos aliados de Alckmin (PSDB) com o candidato definiu que a senadora gaúcha vai ter mais visibilidade na última fase da campanha. Ela é uma das encarregadas de defender o 'voto útil' contra o PT. Na terça, a loura alta e elegante comeu pastel em caminhada de campanha no centro de Vitória. Olhava a iguaria com indisfarçável estranhamento. A senadora de 73 anos é uma arma de Alckmin contra o avanço de Bolsonaro, já que é conservadora e antipetista até a medula. Ligada ao MBL e ao agronegócio, a ex-apresentadora da emissora gaúcha afiliada à Globo é novata em política. Seu primeiro mandato eletivo é o atual, mas conseguiu 21% dos votos gaúchos em 2014, ao se candidatar ao governo do estado. Ela ganhou os holofotes na campanha pelo impeachment de Dilma Rousseff. Defendeu também a saída de Temer. A aversão ao PT a levou a defender as agressões à caravana do ex-presidente Lula em seu estado. Ainda denunciou, da tribuna do Senado, que o PT estaria convocando o "exército islâmico" para defender Lula.

MANUELA D'ÁVILA - Vice mais cortejada da eleição defende a causa das mulheres

A ex-gordinha (ela perdeu 40 quilos aos 17 anos) apareceu recentemente em imagens em que uma camisa de alcinhas revelava tatuagens de Lênin, Che Guevara e até uma matrioska russa. Tudo fake, claro. O falsificador teve o cuidado de escurecer as olheiras para enfeiar a "musa da esquerda". A candidata a vice na chapa petista respondeu com a leveza característica de suas postagens nas redes sociais, dizendo que tem tatuagens "lindas" e não "desenhos feinhos": "Estou na disputa :) com minhas olheiras e tatuagens e contra o machismo e as manipulações grotescas de vocês". Manuela, 36 anos, surgiu como lider estudantil nos anos 1990, já ligada ao PCdoB. Foi eleita vereadora em 2004 e dois anos depois foi a candidata mais votada para deputada estadual no Rio Grande do Sul. Sua bandeira sempre foi o feminismo. É a favor da descriminalização do aborto e da proposta de Fernando Henrique Cardos em relação às drogas, que vincula a tributação do produto a campanhas educativas de prevenção do consumo Cortejada também por Ciro para ser sua vice (ele disse que ela seria "uma boa presidenta, quanto mais uma boa vice"), ela, mesmo enquanto era oficialmente candidata a presidente pelo seu partido, pregou a união das esquerdas.

KÁTIA ABREU - Líder do agronegócio e tão esquentada quanto Ciro Gomes

A vice de Ciro Gomes é mais parecida com a conservadora Ana Améila, vice de Alckmin, do que o candidato gostaria. A pecuarista de 56 anos , senadora pelo PDT de Tocantins, já chegou a dizer que votaria nela, se fosse candidata a presidente e Ciro não estivesse na disputa. Escolhida depois que o cabeça da chapa perdeu a disputa pelo apoio do Centrão, Kátia defende o porte de armas no campo e até na cidade e é contra a descriminalização do aborto. Por sua atuação para barrar pautas ambientalistas, ganhou da ONG Greenpeace o troféu 'Motosserra de Ouro', em 2010. Em 2012, decretou que acabara a "ditadura ambiental" no Brasil, celebrando a aprovação do novo Código Florestal, que anistiou desmatadores e reduziu áreas de floresta protegidas, até na Amazônia. Escolhida ministra da Agricultura do governo Dilma Rousseff, sob protesto de movimentos populares que reuniram 20 mil assinaturas contra a nomeação, se destacou pela defesa da amiga durante o processo de impeachment. Pelas críticas a Michel Temer, acabou expulsa do MDB. Ela se parece com Ciro apenas em uma característica, o sangue quente. Certa feita, atirou uma taça de vinho no rosto do colega de Senado José Serra ao ser chamado por ele de "namoradeira" em um jantar. Mãe de três filhos, ela disse que Serra foi "desrespeitoso, arrogante e machista".

EDUARDO JORGE - Sanitarista respeitado e defensor ferrenho do vegetarianismo

"Eu não tenho nada a ver com isso". A frase de um assustado Eduardo Jorge (PV) ao ser focalizado pelas câmeras de um debate foi uma das marcas da campanha presidencial de 2014. O médico sanitarista foi candidato ao Planalto e levou menos de 1% dos votos. No segunto turno, assim como Marina, apoiou Aécio Neves (PSDB). Antes disso, o defensor do casamento gay, da descriminalização do aborto e da legalização das drogas teve uma carreira importante como gestor, público, ocupando cargos de secretário municipal de Saúde em gestões do PT - partido no qual militou por 22 anos - e do tucano José Serra, e ajudando a idealizar o Sistema Único de Saúde. Nessa campanha, jpa começou a fazer sucesso por suas declarações diferentonas. Ovolactovegetariano, conclamou, em um debate: "Vamos viver dos produtos vegetais. Não precisamos torturar animais". Falando sobre Bolsonaro, diagnosticou: "Ele não tem inteligência emocional para ser presidente".

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