Publicado 26/05/2019 06:00 | Atualizado 27/05/2019 15:04
Brasília - Na manhã de 22 de abril, o corpo de Rodrigo Taurino da Silva, de 31 anos, foi encontrado em uma estrada de chão em Araucária, no Paraná. Apedrejado até a morte, ele estava com o rosto desfigurado. Na noite de 15 de maio, Luís Eduardo de Lima Pires, 25 anos, conhecida como a travesti Bibiu, foi morta a tiros perto da casa onde morava em Fortaleza, capital do Ceará. Dois dias depois, um casal de lésbicas foi assassinado a facadas em Salvador, na Bahia. São casos que fazem parte de uma triste estatística, que coloca o Brasil como o país que mais mata LGBTIs no mundo. Levantamento feito pelo Grupo Gay da Bahia registra uma assustadora média de uma morte por dia. Só neste ano, foram pelo menos 143 homicídios, segundo o estudo (veja os dados nas infografias).
Um cenário que motivou uma importante decisão na quinta-feira, no Supremo Tribunal Federal (STF). As ações foram apresentadas pelo PPS e pela Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros (ABGLT). Elas pedem que a Corte fixe um prazo para o Congresso votar projetos de lei sobre o tema. No começo do julgamento, em fevereiro, os ministros Celso de Mello e Edson Fachin entenderam que o Congresso Nacional foi omisso. E que houve demora inconstitucional do Legislativo em aprovar uma lei para proteger homossexuais e transexuais.
Seis dos 11 ministros formaram maioria para enquadrar homofobia como crime, usando como parâmetro a lei de racismo. A sessão foi suspensa. Mas a questão voltará a ser discutida no plenário do STF no dia 5 de junho. As ações pedem a criminalização de todas as formas de ofensas, individuais e coletivas, homicídios, agressões e discriminações motivadas pela orientação sexual ou identidade de gênero da vítima.
'UM GRANDE AVANÇO'
Para o advogado Henrique Rabello de Carvalho, que preside a Comissão de Diversidade Sexual e de Gênero da OAB/RJ, o julgamento demonstra um avanço nas conquistas dos direitos humanos. "Já temos um grande avanço. O Congresso está há mais de 30 anos para discutir e aprovar um projeto de lei nesse sentido. O Supremo cumpre sua função constitucional de reparar esse atraso". Raquel Castro, presidente da comissão sobre o tema no Conselho Federal da OAB, é cautelosa. Segundo ela, os detalhes só serão conhecidos com a decisão final. "É uma situação de extrema urgência e relevância a criminalização da homotransfobia".
A ativista Millena Passos, coordenadora do Grupo Gay da Bahia, entidade responsável pelos levantamentos de crimes contra a comunidade LGBTI no país, não esconde a euforia com a decisão. "É uma conquista histórica. O Brasil é o país que mais mata LGBTI no mundo. Vamos ter uma lei que criminaliza a homofobia".
SUMIDO DE BRUMADINHO LUTA CONTRA A DEPRESSÃO
Uma vítima de homofobia de passagem por Brumadinho (MG) no dia 20 de janeiro deste ano, momentos antes do rompimento da barragem da mineradora Vale que deixou 230 mortos e 46 desaparecidos, figurou na lista de vítimas da maior tragédia ambiental do país. Perseguido pelo pai por causa da sua orientação sexual, o catarinense Evandro Hamann Schwirkowsky, 23 anos, só entrou em contato com a família para falar que estava vivo há pouco mais de um mês.
Agora, ainda sofre com os efeitos colaterais da decisão. Com o quadro de depressão agravado e a suspeita de um câncer, Evandro mora com o namorado Edemilson de Jesus Silva na Ilha de Itaparica, em Salvador (BA), graças à solidariedade de uma amiga. Desempregados, os dois moram no 'quartinho da bagunça', nos fundos da casa de Ana Lucia Santos Bastos, que ainda ajuda o casal nas despesas com alimentação e deslocamentos pela cidade. "Não tenho condições de ficar sustentando eles. Mas a gente faz o que pode", disse.
No dia 15 deste mês, o casal chegou a criar uma vaquinha online para auxiliar no tratamento de Evandro, na compra de medicamentos e na construção da casa. Mas nenhum valor foi arrecadado até agora.
O namorado de Evandro disse que chegou a contatar o agricultor Mauricio Schwirkowsky, pai de Evandro. Mas ainda não recebeu nenhum retorno. "Tudo o que eu queria era o amor da minha família. Agora, é o momento que eu mais preciso deles e eles não estão do meu lado", lamentou.
* com a estagiária Juliana Mentzingen, sob supervisão de Herculano Barreto Filho
Comentários