Representante da associação de médicos cubanos no Rio, Yalianys Cárdenas trabalhava em um
posto de saúde em São Pedro da Aldeia, na Região dos Lagos. Hoje, tem um filho de 9 meses - Reginaldo Pimenta
Representante da associação de médicos cubanos no Rio, Yalianys Cárdenas trabalhava em um posto de saúde em São Pedro da Aldeia, na Região dos Lagos. Hoje, tem um filho de 9 mesesReginaldo Pimenta
Por Juliana Mentzingen *
Rio - Yoanis Infante Rodriguez, Manuel Miguel Tur Alvarez e Yalianys Cárdenas fazem parte de um universo de 700 médicos cubanos que seguiram por aqui mesmo após o fim do programa federal Mais Médicos porque constituíram família no Brasil. Desempregados desde o fim do acordo, desativado em novembro de 2018, eles agora nutrem a esperança de voltar a exercer a profissão no país. Nesta semana, o governo anunciou que pretende editar uma medida provisória para reintegrar esses profissionais ao sistema de saúde.
Yoanis, de 38 anos, mora com a esposa brasileira em Mussoró, no Rio Grande do Norte. Quando o contrato entre Brasil e Cuba foi interrompido, um dos motivos que fizeram com que o cubano permanecesse no país foi a esperança de voltar a exercer a profissão. "Trabalhar para esse povo não tem preço. É gratificante ajudar famílias carentes e que dependem da saúde pública".
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Yoanis Infante Rodríguez mora em Mossoró, no Rio Grande do Norte - Arquivo Pessoal
Sem sucesso na busca por trabalho, Manuel Miguel, de 35 anos, passa por dificuldades. "Entreguei currículo em várias farmácias e universidades para poder trabalhar como balconista ou em uma sala de aula, como professor. Mas nunca me chamaram", conta o morador de Jaboatão dos Guararapes, no interior do Pernambuco, que depende da esposa para garantir o sustento. Hoje, divide o tempo entre os estudos e a ajuda aos sogros nas atividades domésticas.
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Cubano Manuel Miguel Alvarez segue desempregado no Brasil - Arquivo Pessoal
Aqueles que conseguiram emprego trabalham fora da sua área de atuação. Foi o que aconteceu com Juan Carlos Salas Echemendia, de 51 anos, que hoje reside em Brasília. Desde o rompimento do Programa Mais Médicos, o cubano sobreviveu com o dinheiro obtido em bicos. Ele também trabalhou como garçom e como motorista de aplicativo. "Eu dormia no carro em Goiânia para trabalhar no dia seguinte porque eu morava no interior de Goiás, em uma cidade muito pequena e que não tinha emprego. Então, fui para Goiânia trabalhar como motorista de aplicativo". Agora, Juan está trabalhando em uma clínica estética com procedimentos de medicina holística.
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Cubano Juan Carlos Salas Echemendia, que mora em Brasília, sobrevive com o dinheiro obtido em bicos - Arquivo Pessoal
Também em Brasília, Niurka Valdes Perez trabalha com tarefas administrativas em um hospital de Cidade Ocidental, a cerca de 40 quilômetros da capital federal. "Tenho muitos colegas que estão trabalhando em diferentes funções. Alguns estão sobrevivendo de faxina. Outros, vendendo churrasco e comidas típicas cubanas", conta.
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Em fevereiro, a médica criou a Aspromed, uma associação com o objetivo de unificar a maior quantidade de médicos cubanos no Brasil desde a ruptura do contrato. "É a forma que encontramos para negociar com o governo brasileiro. Nós estamos totalmente disponíveis para assumir vagas que nunca ninguém foi capaz de assumir", conta. Niurka é presidente da entidade, que conta com 1.869 associados, um representante por estado brasileiro e a esperança de que os cubanos voltem a trabalhar como médicos no país.
'EXPECTATIVA DE VOLTAR A TRABALHAR'
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Yalianys Cárdenas, de 34 anos, engrossa a lista de desempregados no Brasil. Representante da associação de médicos cubanos no Rio, ela trabalhava em um posto de saúde em São Pedro da Aldeia, na Região dos Lagos. Hoje, mora com o marido brasileiro, com quem se casou em 2017, e com o filho de 9 meses, que nasceu no país.
Representante da associação de médicos cubanos no Rio, Yalianys Cárdenas trabalhava em um posto de saúde em São Pedro da Aldeia, na Região dos Lagos. Hoje, tem um filho de 9 meses - Reginaldo Pimenta / Agencia O Dia
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O marido trabalha como cabeleireiro em um salão alugado. Há um ano, sua mãe veio de Cuba para ajudá-la na gravidez. Mas já está de malas prontas para retornar ao país de origem. Mas a vontade de Yalianys é ficar por aqui mesmo. "A expectativa de voltar a trabalhar é grande. Já fico feliz só de poder exercer a minha profissão", conta.
Assim como os outros colegas de profissão, ela espera a abertura do edital da prova que reconhece o diploma para voltar a trabalhar no Brasil. Yalianys já tentou procurar emprego em outras áreas, como lojas e supermercados, mas ainda não foi chamada.
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Para a cubana, o maior problema do sistema público de saúde brasileiro é o atendimento. "É demorado. É difícil de dar um diagnóstico definitivo para os pacientes dessa forma. Em muitos lugares, também faltam médicos até para dar uma receita", critica.
Representante da associação de médicos cubanos no Rio, Yalianys Cárdenas trabalhava em um posto de saúde em São Pedro da Aldeia, na Região dos Lagos. Hoje, tem um filho de 9 meses - Reginaldo Pimenta / Agencia O Dia
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GOVERNO QUER REINTEGRAR CUBANOS
Na quarta-feira, o Ministério da Saúde informou que o governo elabora um novo programa para ampliar a assistência na atenção básica do Sistema Único de Saúde (SUS). A ideia é editar uma medida provisória até agosto, com alterações que preveem a reincorporação de cubanos desligados do programa Mais Médicos que ainda seguem no país.
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Em nota, o Ministério da Saúde informou que está discutindo soluções para auxiliar a permanência desses profissionais no país e alternativas para o seu exercício profissional. Após a saída dos cubanos, o governo federal passou a enfrentar dificuldades para preencher, com médicos brasileiros, as vagas direcionadas a regiões distantes dos grandes centros, principal foco do programa desde que foi criado, em 2013. Áreas pobres de grandes cidades também têm registrado dificuldades.
A reincorporação de cubanos tem sido estudada desde março. A informação foi dada pelo ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, em audiência no Senado. Os médicos cubanos tiveram que sair do programa com o rompimento do acordo de colaboração entre Brasil e Cuba, em novembro do ano passado. 
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* Estagiária sob supervisão de Herculano Barreto Filho