Cenas do vídeo no momento que João Alberto, negro, é espancado e assassinado por asfixia por seguranças (brancos) do Carrefour em Porto AlegreCaptura de vídeo
Por O Dia
Publicado 21/11/2020 07:00 | Atualizado 21/11/2020 11:06
No Dia da Consciência Negra o Brasil, que tem 56,10% da sua população declarada negra (soma de pretos e pardos), está de luto. Um homem negro foi espancado e morto por dois vigilantes brancos, sendo um deles policial militar temporário, em uma unidade do supermercado Carrefour em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. O crime ocorreu na noite de quinta-feira.

A vítima, o soldador João Alberto Silveira Freitas, tinha 40 anos, o Beto, tinha ido com a esposa Milena Borges Alves, de 43, fazer compras. Na hora de passar os produtos pelo caixa, o homem foi chamado por seguranças e começou o show de horrores, filmado por funcionários da rede e pessoas que estavam no local e tentavam intervir, mas eram impedidas. Milena, após passar as compras no caixa, viu as agressões contra o marido e tentou ajudar, mas foi empurrada pelos agressores. A Brigada Militar foi chamada e os dois homens foram presos em flagrante. Eles responderão por homicídio triplamente qualificado, por asfixia e impossibilidade de resistência da vítima.

A morte de João Alberto causou revolta nas testemunhas que presenciaram o ato brutal. Paulão Paquetá, vizinho da vítima, contou que as pessoas tentaram impedir a ação, mas sem sucesso. "Estava chegando no local na hora das agressões. Eu estava a uns 10 metros quando começou. Tentamos intervir, mas não conseguimos", relata.

Números
É importante destacar que dos 209,2 milhões de habitantes do país, segundo o IBGE, 19,2 milhões se assumem como pretos, enquanto 89,7 milhões se declaram pardos. Os negros – que o instituto conceitua como a soma de pretos e pardos – são, portanto, a maioria da população. Ou seja, 56,10% da população brasileira.

Pelo Twitter, o vice-governador do Rio Grande do Sul e secretário estadual da Segurança Pública, Ranolfo Vieira Júnior, condenaram a ação violenta dentro do supermercado e disseram que vão apurar exaustivamente o caso. "Vamos apurar esse fato a sua exaustão, não podemos admitir ações dessa natureza", afirmou o governador.
Cenas do vídeo no momento que João Alberto, negro, é espancado e assassinado por asfixia por seguranças (brancos) do Carrefour em Porto AlegreCaptura de vídeo

A dinâmica do crime
Vídeos compartilhados nas redes sociais mostram parte das agressões sofridas por João Alberto Silveira Freitas e o momento que ele é atendido por socorristas. Em uma das gravações, o homem é derrubado e atingido por ao menos 12 socos. Ao fundo, uma pessoa grita "vamos chamar a Brigada (Militar)".

Uma mulher vestindo uma camisa branca e um crachá, que também seria funcionária do supermercado, aparece ao lado dos agressores, filmando a ação. Ela já foi identificada e será ouvida. Outro registro mostra a vítima desacordada, enquanto há marcas de sangue no chão.

Nota do Carrefour
Em nota enviada à reportagem, o Grupo Carrefour considerou a morte "brutal" e disse que "adotará as medidas cabíveis para responsabilizar os envolvidos".
O Carrefour informou também que vai romper o contrato com a empresa responsável pelos seguranças envolvidos e que o funcionário que estava no comando da loja durante o crime "será desligado".
O grupo disse ainda que a loja será fechada em respeito à vítima e que dará o "suporte necessário" à família da vítima.
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'Ela (Milena) viu matarem o marido', lamenta amigo
Paulão Paquetá, vizinho da vítima, conta que a esposa de Beto também viu o espancamento, mas foi impedida de intervir. "Ela viu o marido sendo morto", lamenta. Segundo ele, cerca de outros oito seguranças ficaram no entorno da área, impedindo a aproximação das pessoas que tentavam parar com as agressões.
"Não pararam. A gente gritava 'tão matando o cara', mas continuaram até ele parar de respirar, fizeram a imobilização com o joelho no pescoço do Beto, tipo como foi com o americano (George Floyd, morto por policiais neste ano nos Estados Unidos).
"O presidente da Associação de Moradores e Amigos do Obirici, Paulão Paquetá, estima que as agressões duraram cerca de sete minutos. Ele diz que alguns motoboys que filmaram a violência tiveram os celulares tomados para não registrar toda a ação. "Quando viram que ele parou de respirar, eles se apavoraram. Chamaram a Brigada, que isolou ali e a Samu tentou reanimar, mas ele estava morto."

"Eu estava pagando no caixa, daí ele desceu na minha frente. Quando eu cheguei lá embaixo, ele já estava imobilizado. Ele pediu: 'Milena, me ajuda'. Quando eu fui, os seguranças me empurraram", contou Milena, mulher de Beto.

"É muito difícil. Revolta pela maneira que ele foi morto brutalmente. Ser humano nenhum merece ser agredido daquele jeito, ter a vida ceifada de maneira tão brutal, tão animal", diz Paulão.
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Cachorro conhecido como Manchinha foi agredido e morto por segurança do CarrefourReprodução Redes Sociais
Relembre o caso da cadela Manchinha
Esta não é a primeira vez que o Carrefour protagoniza uma história de agressão. Em novembro de 2018, um outro segurança do supermercado que trabalhava em Osasco (SP) envenenou uma cadelinha, a Manchinha, e a espancou até a morte.

O Ministério Público estipulou que o Carrefour deveria pagar R$ 1 milhão em razão dos maus-tratos cometidos pelo funcionário. Do valor, R$ 500 mil serão destinados exclusivamente à esterilização de cães e gatos; R$ 350 mil para compra de medicamentos para o Hospital Municipal Veterinário ou que estejam no canil e R$ 150 mil para a aquisição de rações para associações destinadas ao cuidado de animais.
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Protestos e comemoração no Dia da Consciência Negra
Rio de Janeiro 20/11/2020 - Manifestantes ocuparam a filial do Carrefour na Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, em protesto pelo assassinato de um homem numa unidade do supermercado em Porto Alegre. Foto: Luciano Belford/Agencia O Dia Luciano Belford/Agencia O Dia
O Dia da Consciência Negra no Rio de Janeiro foi divido: de um lado celebração à cultura negra e fortalecimento de seus laços no monumento de Zumbi dos Palmares, no Centro. De outro, protestos cobraram justiça pela morte de João Alberto Silveira Freitas, 40 anos, assassinado por seguranças do Carrefour em Porto Alegre.
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De outro lado, comemorações do Dia da Consciência NegraEstefan Radovicz / Agencia O Dia


No Rio de Janeiro, uma multidão se reuniu dentro de uma das unidades do hipermercado pedindo explicações. Nas imagens, é possível ver os manifestantes gritando "assassino Carrefour". Vídeos do momento foram compartilhados nas redes sociais.

Protestos ocorreram em todo país. Em Belo Horizonte, uma multidão se reuniu em frente ao Carrefour localizado no Centro da capital mineira. O Rapper Djonga esteve no ato que tem como bandeira 'Nossas vidas importam! Parem de nos Matar!'.

Em São Paulo uma manifestação pacífica acabou com vidraças quebradas no shopping Pamplona, onde tem um supermercado Carrefour. Em Brasília a manifestação foi em frente ao mercado na Asa Norte.