Por O Dia

Rio - Foi um ano além da imaginação. O Brasil viveu uma eleição em que houve um candidato a presidente preso em Curitiba, outro em uma cama de hospital em São Paulo, outro ainda rezando no monte... Também teve tiro, facada e uma tempestade de fake news. O final só poderia ser surpreendente: um deputado federal do baixo clero, com discurso antissistema, tornou-se presidente do Brasil. Veja os personagens que contam o que foi 2018.

Um dia comum no Supremo
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O Supremo Tribunal Federal, com sua missão de ser o guardião da Constituição, terminou 2018 como começou: com a imagem bastante arranhada.
O último dia de funcionamento da Corte no ano, na última quarta-feira, foi exemplar da forma como o tribunal agiu ao longo do ano. O ministro Marco Aurélio Mello determinou, em decisão solitária, a libertação de todos os presos que estivessem cumprindo pena após condenação em segunda instância. Caso a ordem perdurasse, 169 mil detentos poderiam ganhar as ruas - entre eles, o ex-presidente Lula. Outro ministro, Dias Toffoli, presidindo o tribunal, cassou a decisão poucas horas depois. Segurança jurídica?
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Enquanto isso, o ministro Ricardo Lewandowski suspendia o adiamento de 2019 para 2020 do reajuste de salários de servidores federais. Com isso, criou uma despesa de R$ 4,7 bilhões para o governo.
As decisões solitárias não foram exceção, em um tribunal que vive conflagrado. O país viveu 2018 com 11 supremos, um para cada ministro, o que representa um problema institucional grave que, certamente, continuará em novos e turbulentos episódios em 2019.
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Sérgio Moro encarnou o 'Transformer'
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Parecia que o juiz da Lava Jato tinha encenado a sua cena mais apoteótica em julho de 2017, ao condenar o ex-presidente Lula a 9 anos e meio de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro, no ápice da operação Lava Jato, que o catapultou ao estrelato. Mas, em filmes no qual o cenário é o Brasil, ninguém tem o direito de se surpreender. A saga de Sérgio Moro, para muitos um super-herói da Liga da Justiça, para outros, um vilão ao estilo Duas-Caras, teve capítulos inusitados em 2018.
A sua atuação no episódio tragicômico do prende-solta de Lula e depois a sua metamorfose de juiz em ministro do futuro governo Bolsonaro marcaram o ano. Naquele domingo, 8 de julho, dia emblemático da nossa comédia pastelão, o desembargador Rogerio Favreto ordenara pela manhã a soltura de Lula da delegacia da Polícia Federal onde ainda se encontra até o fechamento desta edição. O caso do ex-presidente não era mais da competência da 13ª Vara, cujo titular, Sérgio Moro, estava de férias. Isso não o impediu de, em despacho, declarar a incompetência de Favreto. Era uma inovação cinematográfica: um juiz de primeira instância declarando a incompetência de um desembargador. Moro ainda ligou para o delegado-carcereiro de Lula, Roberval Ré Vicalvi, e o orientou a desobedecer a ordem de soltura. Entre idas e vindas, o caso foi resolvido apenas à noite, com a palavra final cabendo ao presidente do TRF-4.
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No dia 1º de novembro, o mesmo juiz Moro voou, de Curitiba, em direção a Jair Bolsonaro, no Rio. Após uma conversa de uma hora, o presidente eleito tinha transformado o juiz que prendeu seu maior adversário em ministro da Justiça. O juiz da Lava Jato abandonava 22 anos de magistratura para abraçar "uma forte agenda anticorrupção e anticrime organizado". Em entrevista coletiva, ele negou que tenha virado político, o que prometera nunca fazer. Em 2019, a plateia espera muito de sua atuação.
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Lula estrelou um drama épico
O ano começou mal para Lula, mas dentro do script que já vinha sendo esboçado desde março de 2016, quando o então juiz Sérgio Moro autorizou que ele fosse conduzido à força para depor à Polícia Federal. O ex-presidente foi condenado em segunda instância, em 24 de janeiro, no caso do triplex do Guarujá, que o Ministério Público Federal afirma ser dele. A pena do ex-presidente foi aumentada para 12 anos e 1 mês, por corrupção e lavagem de dinheiro.
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A partir disso, o roteiro se acelerou em direção ao final que era esperado: um personagem derrotado e algemado. Na noite de 4 de abril, o Supremo Tribunal Federal rejeitou, por 6 a 5, pedido de habeas corpus da defesa do petista e Moro não perdeu tempo: decretou, horas depois, a prisão do então pré-candidato a presidente.
No entanto, Lula acrescentou doses de drama ao roteiro. Por dois dias, cercado de militantes petistas, se entrincheirou no Sindicato dos Metalúrgicos, em São Bernardo do Campo (SP) e "dirigiu" a cena de sua prisão, com discursos, fuga de militantes que queriam que ele resistisse e a população acompanhando tudo ao vivo pela telinha, nas cases e bares do sábado, 7 de abril.
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De dentro da cadeia, o Poderoso Chefão do PT seguiu tocando os rumos do partido, em aposta alta na manutenção de sua candidatura a presidente até o último minuto possível. O registro foi negado pela Justiça, com base na Lei da Ficha Limpa. Enquanto isso, seus seguidores pediam #LulaLivre em manifestações Brasil afora. Até agora, sem sucesso. Mas o espasmo dessa semana (veja no box sobre os 'Supremos') é mais uma prova de que o sapo barbudo não vai sair de cena nem tão cedo.
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Cabo Daciolo: 'O Iluminado'
"Glória a Deus". O bordão, repetido à exaustão - sempre com o 's' soando como 'x' - em qualquer aparição do 'nanico da vez', foi uma das marcas de 2018. O Cabo Daciolo, deputado que chegou ao Congresso na bancada do Psol, conseguiu legenda para concorrer à Presidência pelo Patriota. Fez campanha subindo em montanhas e garantindo que seria eleito no primeiro turno porque essa era "a vontade de Deus".
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Terminou a eleição como o sexto melhor votado e tornou-se um símbolo da falência do presidencialismo de coalizão que vigorava desde a redemocratização. O candidato do MDB (Henrique Meirelles), partido que esteve em todos os governos desde 1985, ficou atrás dele.
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Fernando Haddad: a primeira noite de um homem
Fernando Haddad
Fernando HaddadNELSON ALMEIDA/AFP
Ele já tinha sido prefeito da maior cidade do país e ministro da Educação, com uma trajetória importante em papéis como gestor público e intelectual. Mas seria a sua primeira atuação na superprodução que é uma eleição presidencial. Foi escolhido pelo ator que substituiria: Lula. E nunca chegou a ter o apoio unânime da equipe. A assistente de direção do líder (papel desempenhado pela presidente do PT, Gleisi Hoffmann) chegou a dizer que o professor, enquanto ainda era candidato a vice, estava em "estágio probatório".
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No entanto, o 'Andrade', que começou o ano como ilustre desconhecido, se não conseguiu evitar a vitória de Bolsonaro, teve uma performance com méritos inegáveis. O primeiro foi se impor dentro do próprio partido. O segundo, disparar, ainda no primeiro turno. Haddad foi confirmado no dia 11 de setembro como candidato do PT. Dezesseis dias depois, tinha, segundo pesquisa Datafolha, 22% das intenções de voto, o dobro de Ciro Gomes, então seu adversário direto na disputa por uma vaga no segundo turno contra Bolsonaro. Um terceiro feito foi se tornar protagonista da campanha petista no segundo turno, deixando nada menos do que o grande astro Lula fora dos holofotes.
Com 47 milhões de votos e desempenho muito positivo entre o eleitorado feminino e nos estados do Nordeste, Haddad pode não ter levado o Grande Prêmio do Ano. Porém, por ter se candidatado a atuar em um filme que, claramente, a população não queria ver de novo - o PT no Planalto - saiu-se melhor que a encomenda. Entrará em 2019 cacifado para uma nova atuação: líder da oposição a Bolsonaro.
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Jair Bolsonaro, o grande vencedor
Jair Bolsonaro
Jair BolsonaroValter Campanato / Agência Brasil
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Em 20 de agosto, Fernando Haddad ainda era candidato a vice na chapa de Lula, mas poucos acreditavam que ele não se tornaria o candidato responsável por tentar levar o PT de volta ao Planalto. Em entrevista, o ex-prefeito disse acreditar que a disputa do segundo turno seria, mais uma vez, entre seu partido e o PSDB, que tinha apoio maciço do Centrão. Era o que tinha acontecido nas quatro eleições anteriores. O PT traçou sua estratégia eleitoral tendo essa premissa como base,
Enquanto isso, longe dos acordos partidários tradicionais, uma rede que se desdobrava, movida sobretudo pelas mensagens transportadas via WhatsApp, alimentava a candidatura de Bolsonaro, que liderava as pesquisas, quando o nome de Lula era excluído dos levantamentos.
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Mas o capitão da reserva era visto por muitos analistas que não compreendiam aquele novo formato de fazer política. O candidato , com pouco a perder, seguia fazendo suas 'lives'.
Nâo há como dizer se o episódio mais dramático da política brasileira em 2018 - a facada desferida por Adélio Bispo em Bolsonaro no dia 6 de setembro - determinou a vitória do militar. Mas deu cores inéditas e surpreendentes à campanha.
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Após o ataque, Bolsonaro passou a fazer campanha sem sair de casa. Teve um bom argumento para não comparecer aos debates, que poderiam expor sua limitação assumida em certos temas, em especial a Economia.
O crescimento de Haddad o favoreceu, levando os votos de antipetistas assustados para seu colo. E Bolsonaro foi eleito presidente no segundo turno, com 57,8 milhões de votos.
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Agora, Bolsonaro monta seu governo em meio a muitas turbulências. Mas uma pesquisa do Ibope divulgada no dia 13 mostra que 75% dos brasileiros consideram que o capitão e sua equipe estão "no caminho certo". A estreia é dia 1º.
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Encurralado: em maio, os caminhoneiros param o país
Grupos passaram a discutir uma possível paralisação
Grupos passaram a discutir uma possível paralisação Tomaz Silva/Agência Brasil
Entre maio e junho, um movimento que parecia não ter líderes eclodiu nas estradas de todo o país. A princípio, não parecia nada muito grave. Mas logo faltou comida, faltou combustível e se percebeu, em especial nas grandes cidades, a importância dos caminhoneiros para a vida do país. A parte mais aguda da paralisação durou 11 dias. Mas alguns dos caminhoneiros, movidos por mensagens de WhatsApp, ficaram nas estradas apostando em uma intervenção militar.
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Os caminhoneiros conseguiram uma redução de R$ 0,46 no preço do diesel e derrubaram o presidente da Petrobras, Pedro Parente. Mas os militares, por enquanto, não tomaram o poder.
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Ciro Gomes: final triste para o cavaleiro solitário
Ciro Gomes
Ciro Gomes Reprodução/ Twitter
"A minha responsabilidade tá crescendo muito e eu não vou errar." Em setembro, Ciro Gomes, que tentava ser presidente pela terceira vez, estava confiante de que agora conseguiria. O Tribunal Superior Eleitoral tinha barrado a candidatura de Lula, até então líder nas pesquisas. Os observadores políticos achavam que a ausência de Lula iria "desidratar" Bolsonaro.
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O roteiro parecia indicar para o cearense uma história de insistência no sonho e final feliz com a conquista do Planalto. Não deu certo. Haddad ultrapassou Ciro. No segundo turno, o candidato do PDT apelou para o suspense e não quis anunciar se apoiaria o petista. Optou por ficar neutro. Anticlímax total.
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