Alexandre de Moraes ouviu denúncia de parlamentares - Carlos Moura / STF
Alexandre de Moraes ouviu denúncia de parlamentaresCarlos Moura / STF
Por O Dia
As polêmicas envolvendo o presidente Jair Bolsonaro não param, depois de minimizar as mortes pela pandemia de coronavírus - que já chega perto das 6 mil vítimas fatais em todo Brasil -, e provocar a saída de Sergio Moro do Ministério da Justiça e Segurança Pública para tentar nomear um amigo da família na diretoria-geral da Polícia Federal, agora ele resolveu encrencar com o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, que barrou a nomeação de Alexandre Ramagem na PF. Bolsonaro afirmou na manhã de ontem na saída do Palácio da Alvorada que ainda "não engoliu" a decisão do ministro de suspender a nomeação. 

"Eu não engoli ainda essa decisão do senhor Alexandre de Moraes. Não engoli. Não é essa a forma de tratar um chefe do Executivo, que não tem uma acusação de corrupção e faz tudo possível pelo seu País", declarou. Para Bolsonaro, a decisão de Moraes foi "política". As afirmações geraram reação de ministros do STF e magistrados, que partiram em defesa de Moraes.
Segundo Bolsonaro, a decisão do magistrado quase provocou "uma crise institucional". Moraes acatou mandado de segurança impetrado pelo PDT que questionava a ligação de Ramagem com a família de Bolsonaro e a possibilidade de interferência do presidente na PF. "Desautorizar o presidente da República com uma canetada dizendo 'impessoalidade'? Ontem (quarta-feira) quase tivermos uma crise institucional, quase, faltou pouco. Eu apelo a todos que respeitem a Constituição", frisou o presidente.

Bolsonaro cobrou coerência de Moraes para também desautorizar Ramagem na direção da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). Segundo ele, se Ramagem não tem confiança para estar na PF também não poderia estar na Abin, cargo que ocupava antes de ser nomeado para a PF.

"Essa decisão do senhor Alexandre de Moraes ontem (quarta-feira) tá certo, no meu entender falta um complemento para mostrar que não é uma coisa voltada pessoalmente para o senhor Jair Bolsonaro. Falta ele decidir se o Ramagem pode ou não continuar na Abin. É isso que eu espero dele", disse.

O chefe do Executivo cobrou um posicionamento imediato do ministro. "Se ele (Moraes) não se posicionar ele está abrindo a guarda para eu nomear o Ramagem independente da liminar dele. É isso que nós não queremos. Queremos o respeito de dupla mão entre os Poderes", afirmou.


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Reação aos ataques a Moraes
Os ministros do STF Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes também se manifestaram, com apoio a Moraes e críticas a Bolsonaro. "As decisões judiciais podem ser criticadas e são suscetíveis de recurso, enquanto mecanismo de controle. O que não se aceita - e se revela ilegítima - é a censura personalista aos membros do Judiciário. Ao lado da independência, a Constituição consagra a harmonia entre poderes", advertiu o ministro Gilmar Mendes.

Já o também ministro Luís Roberto Barroso, seu colega no Supremo, elogiou sua carreira antes de entrar na Corte. “O ministro Alexandre de Moraes chegou ao Supremo Tribunal Federal após sólida carreira acadêmica e de haver ocupado cargos públicos relevantes, sempre com competência e integridade. No Supremo, sua atuação tem se marcado pelo conhecimento técnico e pela independência. Sentimo-nos honrados em tê-lo aqui”.

A Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) divulgou nota de repúdio ataques de "autoridades públicas" contra o ministro. O Poder Judiciário é um dos poderes da República, e é inadmissível que uma autoridade pública não reconheça esse princípio basilar ou queira se sobrepor a essa realidade constitucional", afirma a entidade. "É inadmissível que Magistrados, no exercício das funções constitucionais, dentro do seu poder de decidir com base em seu livre convencimento motivado, sejam alvos de ofensas pessoais".

Bolsonaro citou a relação de Moraes com o ex-presidente Michel Temer, que o indicou para a Corte em fevereiro de 2017. "Como o senhor Alexandre de Moraes foi parar no Supremo? Amizade com o senhor Michel Temer, ou não foi?", disse.

O presidente anunciou que irá recorrer da liminar por meio da Advocacia-Geral da União, que havia confirmado anteriormente que iria acatar a decisão judicial. "Eu quero o Ramagem lá. É uma ingerência, né? Mas vamos fazer tudo para o Ramagem. Se não for, vai chegar a hora dele e eu vou botar outra pessoa", disse.

Alexandre Ramagem é nome de confiança da família Bolsonaro, sendo próximo dos filhos do presidente. Sua indicação foi criticada na esteira das revelações do ex-ministro Sérgio Moro, que acusou o governo de tentar interferir no comando da PF para obter informações sigilosas de investigações.

O Planalto se preocupa com o andamento de inquéritos do Supremo Tribunal Federal que apuram esquemas de difusão de "fake news" e financiamento de atos antidemocráticos em Brasília.

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Bolsonaro: exame só se AGU perder recurso
Nem com determinação da Justiça Federal para apresentar o resultado dos exames de coronavírus o presidente Jair Bolsonaro arreda o pé. Ontem ele afirmou que apresentará os seus exames caso a Advocacia-Geral da União (AGU) perca recurso na Justiça que garanta sua intimidade. "A Advocacia-Geral da União (AGU) deve ter recorrido. E se nós perdermos o recurso, daí vai ser apresentado. E vou me sentir violentado. A lei vale para o presidente e mais humilde cidadão brasileiro", declarou.

Ontem acabou o prazo concedido pela Justiça Federal à União para que fossem apresentados os exames para diagnóstico do novo coronavírus realizados pelo presidente. Na segunda-feira, por decisão da juíza Ana Lúcia Petri Betto, o jornal O Estado de S. Paulo conseguiu na Justiça o direito de obter os testes de covid-19 feitos por Bolsonaro.

"Você sabe que tem uma lei que garante a intimidade, né? Se nós dois estivermos com uma doença grave, não somos obrigados a divulgar o laudo. Essa é uma lei e lei vale para todo mundo", afirmou.

Bolsonaro fez o exame para o vírus duas vezes, em 12 e 17 de março, após voltar de missão oficial nos Estados Unidos, onde se encontrou com o presidente Donald Trump. Nas duas ocasiões, o chefe do Executivo informou, via redes sociais, que testou negativo para a doença, mas não exibiu cópia dos resultados. Pelo menos 23 pessoas que acompanharam o presidente na visita aos Estados Unidos, incluindo auxiliares próximos, foram diagnosticadas posteriormente com a doença.

No dia seguinte a decisão da Justiça, na terça-feira (28), em fala na frente ao Palácio da Alvorada, o presidente comentou a decisão e insistiu que não havia contraído o vírus.
"Da minha parte, não tem problema mostrar (o resultado), mas eu quero mostrar que eu tenho o direito de não mostrar. Pra que isso? Daqui a pouco quer saber se eu sou virgem ou não, vou ter de apresentar exame de virgindade para você. Dá positivo ou negativo, o que vocês acham aí?", disse o presidente na ocasião

Ele destacou que nunca apresentou os sintomas da covid-19. "Vocês nunca me viram aqui rastejando, com coriza... eu não tive, pô (novo coronavírus). E não minto. E não minto. Eu infelizmente não tenho aqui o número da lei nem o artigo. Desculpa aqui, mas se nós dois estivermos com aids, por exemplo, a lei nos garante o anonimato. Tá certo? Por que pra mim tem de ser diferente?", questionou o presidente.
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Ação contra manifestações nas mãos de Moraes
Os ataques ao ministro Alexandre de Moraes, do STF, podem não parar por aqui. No último dia 21, Moraes determinou a abertura de inquérito para apurar a organização de atos contra a democracia no país. Ele atendeu a pedido do procurador-geral da República, Augusto Aras.

Entre as palavras de ordem, estava o fechamento do Congresso Nacional e do STF, além da intervenção militar e instituição do AI-5, a norma de 1968 que endureceu a ditadura militar no Brasil.

Bolsonaro participou do protesto e fez discurso contra a "velha política" em Frente ao Quartel-General do Exército. O inquérito no STF está sob sigilo e foca na organização dos atos, e não em quem participou deles.