Reunião ministerial do dia 22 de abril - Marcos Corrêa/PR
Reunião ministerial do dia 22 de abrilMarcos Corrêa/PR
Por MARTHA IMENES
Após muita expectativa, o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), divulgou o vídeo da reunião ministerial do dia 22 de abril, que comprova as acusações do ex-ministro da Justiça Sergio Moro de que o presidente Jair Bolsonaro tentou interferir politicamente no comando da Polícia Federal. Recheado de palavrões, que não caberiam a um presidente da República, o vídeo não foi divulgado na íntegra por questões diplomáticas. A Procuradoria-Geral da República (PGR) e Advocacia-Geral da União (AGU) haviam pedido restrições ao Supremo. Já a defesa de Moro pediu a divulgação na íntegra do vídeo, que deixaria claro o "tom autoritário" de Bolsonaro.

Bolsonaro reclama da informação que recebe, diz que a dele é melhor do que a dos órgãos que são responsáveis por isso, como o Gabinete de Segurança Institucional, Abin, e Polícia Federal. Ele diz que o serviço de informação das agências é uma vergonha. "Eu tenho poder e foi interferir em todos os ministérios, sem exceção", diz.

E continua a disparar: "é a p. o tempo todo pra me atingir, mexendo com a minha família. Já tentei trocar gente da segurança nossa no Rio de Janeiro, oficialmente, e não consegui! E isso acabou. Eu não vou esperar f. a minha família toda, de sacanagem, ou amigos meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence a estrutura nossa. Vai trocar! Se não puder trocar, troca o chefe dele! Não pode trocar o chefe dele? Troca o ministro! E ponto final! Não estamos aqui pra brincadeira." O que se viu no vídeo foi um ministro de cabeça baixa.

Essa foi a argumentação de Moro sobre a interferência política na PF. O presidente interferiu na segurança do Rio: ele promoveu o chefe da segurança pessoal dele e colocou no lugar o 2º do posto. Ou seja, ele mexeu na sua segurança sem nenhuma dificuldade.

Em um certo ponto do vídeo, Bolsonaro defende armar toda a população. "Como é fácil impor uma ditadura no Brasil por isso quero que o povo se arme, pra não ter ditadura, pra não vir um bosta de prefeito e isolar em casa", diz aos berros. "O que os caras querem é a nossa hemorroida, a nossa liberdade. O que esse bosta do governador de São Paulo, o estrume do Rio", disse se referindo a João Doria e Wilson Witzel.

E disparou: "Quero dar um p. dum recado pra esses bostas, porque que estou armando o povo, pra não ter ditadura. Quem não aceitar minhas bandeiras, família, Deus, Brasil, armamento, liberdade, espere 2022. Eu quero todo mundo armado. O povo armado jamais será escravizado."

Raivoso, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, diz que é preciso "acabar com essa porcaria que é brasília, isso é um cancro, é muito pior do que eu esperava". "O povo não está gritando por mais estado, mais projetos, o povo está gritando por liberdade e a gente tá perdendo isso. Eu por mim botava esses vagabundos todos na cadeia, começando com o STF".

Dando continuidade Weintraub diz: "Odeio o partido comunista, odeio o termo povos indígenas, só tem um povo, não quer sai de ré, é o povo brasileiro". Segundo o advogado Manoel Peixinho, especialista em Gestão Pública e professor da PUC-RJ, a declaração de Weintraub poderá ensejar a denúncia por prática de crime. E finaliza: "Na reunião do dia 22 de abril há a comprovação de que o presidente interferiu na Polícia Federal".

Crise institucional vai aumentar, diz sociólogo
Para o sociólogo e professor da UFRJ, Paulo Baía, não houve surpresa na reunião do Bolsonaro com seus ministros e dirigentes. Segundo ele, o ex-ministro Sergio Moro sai com sua versão fortalecida. E faz um alerta: "O eleitor de Bolsonaro vai adorar esse 'panfletão' que é o vídeo."
"Na minha avaliação, ele ganha em popularidade com o vídeo e a crise institucional aumenta muito. Os apoiadores de Bolsonaro ganharam mais motivação para sair às ruas contra o STF e o Congresso Nacional", avalia.

"Para o 'povão', que gosta de 'líder macho', fala simples, ataque direto, palavrão, fanfarrice - base do eleitorado dele - Bolsonaro sai fortalecido. Já para a comunidade internacional e pra quem pensa - sem falar governadores, prefeitos, STF - um desastre. Mas ele, sim, vai fortalecer seu núcleo duro, mesmo desrespeitando o cargo e a educação básica que não teve ou não soube incorporar", acrescenta.

Para o advogado Sérgio Batalha, o presidente deixou clara sua interferência na Polícia Federal. "Os trechos divulgados contém crimes por parte de Bolsonaro e dos seus ministros. Especificamente em relação à interferência, o conteúdo revela, a meu ver, a clara intenção do presidente em proteger a família e amigos por meio do controle da PF", afirmou.
"A alegação do Bolsonaro de se referiria à segurança pessoal é ilógica e não se sustenta no contexto de toda a fala. Existe outro trecho muito grave, no qual ele vincula a liberação da compra de armas pela população ao enfrentamento das determinações de prefeitos e governadores. Há neste trecho uma criminosa tentativa de solapar o sistema federativo, passível de ser tipificada como crime de responsabilidade", finaliza Batalha.