Grupo '300 do Brasil' - Wallace Martins/Futura Press/Estadão Conteúdo
Grupo '300 do Brasil'Wallace Martins/Futura Press/Estadão Conteúdo
Por MARTHA IMENES
O decano do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Celso de Melo, comparou o Brasil à Alemanha de Hitler e, em mensagem reservada enviada a interlocutores no WhatsApp, disse que bolsonaristas "odeiam a democracia" e pretendem instaurar uma "desprezível e abjeta ditadura". Segundo a Agência Estado, o gabinete do ministro não se manifestou sobre as declarações. 

O comentário do decano foi disparado em momento oportuno. No sábado à noite bolsonaristas marcharam até o Supremo carregando tochas e nas manifestações de domingo, que ocorreram em algumas capitais, aliados do presidente carregavam faixas onde se pedia "intervenção militar".
Celso de Mello é o relator do inquérito que investiga as acusações, levantadas pelo ex-ministro Sérgio Moro, de que Bolsonaro tentou interferir politicamente na Polícia Federal. O ministro se aposenta em novembro deste ano, quando completa 75 anos.

Na mensagem, o decano do Supremo alerta para os perigos que a democracia corre diante do levante de atos antidemocráticos pelo Brasil. "GUARDADAS as devidas proporções, O 'OVO DA SERPENTE', à semelhança do que ocorreu na República de Weimar (1919-1933), PARECE estar prestes a eclodir NO BRASIL!", escreveu o decano do STF, usando letras maiúsculas e exclamações para enfatizar trechos do comentário.

"É PRECISO RESISTIR À DESTRUIÇÃO DA ORDEM DEMOCRÁTICA, PARA EVITAR O QUE OCORREU NA REPÚBLICA DE WEIMAR QUANDO HITLER, após eleito por voto popular e posteriormente nomeado pelo presidente Paul von Hindenburg, em 30/01/1933, COMO CHANCELER (Primeiro Ministro) DA ALEMANHA ('REICHSKANZLER'), NÃO HESITOU EM ROMPER E EM NULIFICAR A PROGRESSISTA, DEMOCRÁTICA E INOVADORA CONSTITUIÇÃO DE WEIMAR, de 11/08/191, impondo ao país um sistema totalitário de poder viabilizado pela edição, em março de 1933, da LEI (nazista) DE CONCESSÃO DE PLENOS PODERES (ou LEI HABILITANTE) que lhe permitiu legislar SEM a intervenção do Parlamento germânico!!!! 'INTERVENÇÃO MILITAR', como pretendida por bolsonaristas e outras lideranças autocráticas que desprezam a liberdade e odeiam a democracia, NADA MAIS SIGNIFICA, na NOVILÍNGUA bolsonarista, SENÃO A INSTAURAÇÃO, no Brasil, DE UMA DESPREZÍVEL E ABJETA DITADURA MILITAR!!!!", completou Celso de Mello.

Há duas semanas, Celso de Mello classificou como "bolsonaristas fascistoides, além de covardes e ignorantes" dois homens que foram presos por ameaçar de morte juízes, promotores e procuradores do DF.
Um e-mail disparado a membros do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios dizia que o "o Brasil chegou a um ponto onde não é mais possível resolver os problemas através da razão e do bom senso. Por esse motivo, a partir de agora, serão resolvidos através da execução do Estado de Sítio".
"Por isso, convocamos a população para matar em legítima defesa de si mesmo e da pátria políticos, juízes, promotores, chefes de gabinetes, assessores, parentes, amigos, protetores, e demônios de toda sorte", afirmava o texto.

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Apoiadores fazem ato à la Ku Klux Klan
Os atos antidemocráticos não param. Todos os domingos, e agora aos sábados, virou praxe concentração de pessoas com faixas contra o Congresso, o Supremo Tribunal Federal, políticos e desafetos dos bolsonaristas. A diferença deste final de semana foi a manifestação de sábado à noite, que mais parecia a de um filme macabro. Apoiadores do presidente Jair Bolsonaro marcharam segurando tochas e máscaras em frente ao Supremo.
As palavras de ordem dos manifestantes foram dirigidas contra o ministro Alexandre de Moraes, relator do inquérito das fake news, que investiga ameaças e ofensas ao Supremo e a ministros. O ato contou com dezenas de pessoas e foi puxada pela blogueira Sara Winter, citada no inquérito. O grupo, que se intitula 300 do Brasil, se diz de extrema direita bolsonarista e conclama pessoas a doarem sangue, suor e sono ao Brasil.
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Em redes sociais, internautas lembraram que tochas e máscaras são elementos marcantes em atos do grupo supremacista branco Ku Klux Klan, também conhecido como KKK, nos Estados Unidos. Também lembraram do uso de tochas em manifestações dos nazistas, na Alemanha da década de 1930. Criado em 1860, a KKK defende ideais de extrema-direita como a supremacia branca, o nacionalismo branco e a anti-imigração. No século passado, o grupo foi responsável pela perseguição e assassinato de negros e ativistas de direitos civis, além de ataques terroristas.
"A manifestação da Sara Winter demonstra algo que as próprias manifestações de rua têm demonstrado. Há um limite para os blogueiros e quem prioriza as redes virtuais porque aquilo que dá volume e substância a qualquer palavra de ordem ou tentativa de agitação por meio virtual é a realidade. Winter é completamente apoiada no virtual, e o limite do virtual está se mostrando através das investigações relacionadas às fake news porque, tal como qualquer mentira, ela se sustenta por pouco tempo. Esse limite parece estar se revelando, não só pelo número reduzido que não reproduz aquilo que indica no evento virtual, mas também pela sustentação de um governo eleito na base de fake news, e torna esse governo tão volúvel, volátil e vulnerável", avalia Clarisse Rangel, cientista política e professora da Unirio.
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(Colaborou a estagiária Julia Noia)
'Tão loucos mas, ainda bem, tão poucos', diz Moro
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Para o ex-juiz e ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sérgio Moro não há motivos para temer as manifestações de ativistas bolsonaristas. ''Tão loucos mas, ainda bem, tão poucos. O único inverno chegando é o das quatro estações", avaliou o ex-juiz em seu perfil no Twitter na manhã de ontem.
O comentário é uma clara alusão aos bolsonaristas que reiteram em manifestações que o país está próximo "de um inverno" ao fazerem ameaças a autoridades e instituições do país.
Os ativistas bolsonaristas são alvo de inquérito comandado pelo STF sob suspeita de organização criminosa para divulgar fake news envolvendo informações com conteúdo de injúria e difamação contra instituições, autoridades e opositores ao bolsonarismo.
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Uma das lideranças dessa organização sob suspeição e investigada pela Polícia Federal é Sara Winter, uma jovem de 27 anos que chamou um ministro do Supremo Tribunal Federal de 'arrombado'.

O ministro do STF, Alexandre de Moraes, disse que a ativista bolsonarista comenteu cinco crimes com suas declarações públicas. Em contrapartida, a militante pediu para ser presa ao ameaçar o ministro. O irmão de Sara Winter criticou o comportamento da irmã. "Deveriam ter levado você, irmã querida", afirmou.