Por diana.dantas

Quando saí de casa na manhã de quinta-feira, recebi uma recomendação de minha filha caçula: “Pai, não escreva nada sobre essas manifestações marcadas para o domingo. É coisa de coxinha, gente de direita, a favor de um golpe contra a Dilma”. Acatei o conselho com um sorriso, mas argumentei que seria muito difícil evitar o tema. Veio, então, nova advertência: “Veja lá o que você vai escrever”. Quanto ao primeiro pedido, é impossível atendê-lo. Não há como ignorar a preocupação em torno do que pode acontecer neste domingo, principalmente em São Paulo. Só se fala nisso. Há muita tensão no ar e é quase certo que haverá milhares de pessoas no entorno da Avenida Paulista. Outra questão, que merece cautela, é como escrever a respeito sem se deixar contaminar pelo clima de confronto entre os grupos que convocam os atos públicos e os militantes petistas, que não aceitam protestos contra o governo.

Até mesmo no meio acadêmico, cientistas políticos de renome preferem não falar sobre o tema antes de ver a real dimensão do evento. Não querem correr o risco de embarcar em avaliações apressadas. Qual São Tomé, querem ver para crer. Nas redações do Rio, a impressão generalizada é que a mobilização na cidade tem sido muito limitada. Dificilmente acontecerá algo de maior porte. Acredita-se que os atos convocados para Copacabana e Ipanema vão atrair poucos adeptos, contados às centenas e olhe lá. Por aqui, não se vê clima para qualquer coisa mais expressiva. Isso não significa que os eleitores cariocas estejam felizes com os rumos da economia e da política. Estão desconfiados e descontentes, mas não jogam toda a responsabilidade nas costas da presidente da República. Não fazem julgamento tão severo quanto os paulistas.

Em São Paulo, porém, parece que o bicho vai pegar. A mobilização vai muito além dos “coxinhas” que, no ano passado, vaiaram Dilma Rousseff na Arena Corinthians. Disseminou-se pela maior cidade do país um sentimento de forte antipetismo, que chega às raias do ódio. Durante a campanha eleitoral, dirigentes do PT já tinham identificado esta tendência. Alguns deles foram alvo de agressões verbais em shoppings centers e restaurantes. Depois, com o acirramento do confronto entre Aécio Neves e Dilma Rousseff, o ambiente piorou e se tornou ainda mais hostil. Eis uma explicação possível para a forte rejeição que o PT e Dilma sofrem: quem está pagando a fatura da crise econômica é a indústria nacional, que se concentra exatamente às margens do rio Tietê e na região do ABC.

Desaquecimento e recessão significam ameaça de desemprego e queda no padrão de consumo. Enfim, um tempo ruim que ronda não só “a alta burguesia”, mas também as famílias de classe média e os trabalhadores de São Paulo. É natural, portanto, que se concentre ali o foco de maior insatisfação com as dificuldades que o país atravessa. Acuado, o PT faz pouco das críticas e atribui as reações a uma minoria privilegiada. Mas a própria presidente Dilma admite que há motivo para a irritação. Ao contrário do PT, que considera os protestos antessala do golpismo, Dilma voltou a afirmar na quinta-feira que “manifestação no Brasil tem de se olhar com absoluta naturalidade”. Desde que não se transforme em violência. A presidente também lembrou que pertence a uma época na qual quem se manifestava ia preso.

Em suma, as manifestações não representam ameaça ao governo Dilma. Fazem parte da democracia.

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