Bolsonaro deve liberar deputados governistas para afazer mudanças na reforma a favor de policiais - Marcelo Camargo/Agência Brasil
Bolsonaro deve liberar deputados governistas para afazer mudanças na reforma a favor de policiaisMarcelo Camargo/Agência Brasil
Por Chico Alves

Política, como se sabe, é a arte de negociar com pessoas e grupos de interesses diversos em favor do bem comum. É certo que por décadas essa equação foi distorcida, e no Brasil se transformou na forma de pressionar pessoas e grupos em favor dos bens pessoais. Apesar disso, mesmo nos momentos mais fisiológicos, o país nunca pôde abrir mão da política verdadeira, com P maiúsculo. Sem ela, nenhuma nação funciona minimamente. É esse o drama que o presidente Jair Bolsonaro enfrenta nesses dias, ao ser cobrado por representantes de policiais, na maioria seus eleitores, que querem ter na Reforma da Previdência o mesmo tratamento generoso dado às Forças Armadas.

O dilema é: atender os eleitores, confirmando o compromisso político de campanha de lutar pela melhoria profissional e previdenciária dos agentes de segurança, ou atender o ministro da Economia Paulo Guedes, que não quer fazer mais nenhuma mudança no projeto que prejudique a meta de enxugar R$ 1 trilhão em dez anos? A princípio, Bolsonaro sinalizou que seguiria as diretrizes do ministro. Enviou orientações aos deputados do PSL para que não sugiram qualquer concessão aos policiais no projeto da reforma. O próprio partido governista emitiu nota com esse teor.

Ontem, porém, representantes da categoria foram à Brasília com faixas e camisetas para fazer um protesto e chamar o presidente de traidor. Insistem em ser equiparados ás Forças Armadas (Veja aqui). Bolsonaro sentiu o golpe. Acabou por sinalizar à noite que vai ceder em favor PMs e agentes civis. "Por mim, não apresentaria nenhum destaque desse tipo, mas a orientação do governo mudou e eu sigo o governo", confirma o deputado Carlos Jordy (PSL-RJ) à coluna. "O impacto dessas concessões aos policiais é pequeno, algo em torno de R$ 2 bilhões. A maior preocupação é que isso abra caminho para outras categorias também reivindicarem mudanças no relatório".

O líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO), recebeu ligação do presidente e já distribuiu as novas orientações. Também o ministro Guedes tem novas ordens do presidente: ele não deverá se manifestar sobre as alterações sugeridas em favor dos policiais, informa a Folha de S. Paulo. Não é difícil imaginar a insatisfação do titular da pasta da Economia diante de mais algumas desidratações em seu projeto original de Reforma da Previdência.

Bolsonaro aprende na prática que ele ou qualquer presidente não pode ter como foco único um projeto econômico predeterminado, sem colocá-lo em discussão com a sociedade. Ainda mais tendo como ponto de partida algo tão importante como a mudança no sistema de aposentadoria. Negociar com os interessados, sem que haja nenhuma contrapartida ilegal, é a boa política, a atividade que busca o consenso. Fora disso, é o autoritarismo.

Nesse episódio, o presidente parece estar assimilando isso. Paulo Guedes, pelo visto, ainda não.