Presidente Jair Bolsonaro - Alan Santos / Presidência da República
Presidente Jair BolsonaroAlan Santos / Presidência da República
Por Chico Alves
Desde que Jair Bolsonaro chegou à presidência, pautas que há anos são defendidas pela esquerda foram jogadas no lixo. A conservação do meio ambiente deixou de ser prioridade, as políticas de igualdade de gênero ficaram de lado, as propostas armamentistas dão trabalho ao Congresso, o Brasil se aproxima cada vez mais dos Estados Unidos e por aí vai. A impressão de que a direita imprensou o outro lado foi reforçada pela goleada na aprovação da Reforma da Previdência: 379 votos contra 131, na Câmara. Como o ideal na democracia é que haja algum equilíbrio entre as forças políticas, cabe perguntar: haverá condições para uma retomada da esquerda ou a única alternativa dos militantes é torcer por um novo vazamento do The Intercept para ganhar fôlego?

Líder da Minoria, a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) não enxerga tanta supremacia do governo no Congresso. "A base governista é pequena, ninguém tem maioria. Nem nós, nem eles. Tudo depende de com quem o centro vai fechar", explica. A deputada também lista vitórias conseguidas pela oposição, como a manutenção do Coaf no Ministério da Economia, o descarte da MP do Saneamento (que abrira espaço para empresas privadas atuarem na área), a rejeição do porte de armas no Senado.

Todos esses exemplos, porém, são de reação ao governo. Pouco se viu de propostas colocadas pela esquerda, mesmo no caso da mudança das regras da aposentadoria. "A reforma apresentada foi tão cruel que só nos cabia resistir, não tinha espaço para debater. Essa vitória deles na reforma teve métodos bem pouco republicanos", argumenta Jandira. (Veja aqui)

O deputado Alessandro Molon (PSB-RJ), líder da Oposição, também lista as votações importantes em que propostas do governo foram derrotadas, mas concorda que os partidos do seu grupo ficaram na defesa, para evitar perder muito. "Como somos minoria, o que se pode fazer é reduzir o retrocesso. Mas não basta mostrar que as ideias do governo são ruins, a oposição tem que propor alternativas", diz ele. Molon acredita que isso vá acontecer na volta do recesso parlamentar.

Nesses primeiros meses de legislatura, também a militância nas ruas, que já foi o forte da esquerda, mostrou-se abaixo do esperado para se contrapor a pautas tão importantes como a Reforma da Previdência, por exemplo. Tanto Molon quanto Jandira atribuem esse fato ao desemprego e à falta de recursos dos sindicatos. "Antes, você estalava os dedos e no ABC colocava 100 mil pessoas na rua. Hoje, na fábrica não tem nem 5 mil pessoas", avalia a deputada.

Para o cientista político Felipe Borba, da Unirio, a falta de mobilização tem outro motivo: o desgaste da esquerda, que após o último ciclo no poder passou a ser vista por boa parte da população como causadora das dificuldades econômicas atuais. "Se esse grupo é visto como a origem do problema, como as pessoas acreditarão que vai encaminhar uma solução para a crise?", questiona. Outra marca que ficou foi a da corrupção, por conta da Operação Lava Jato. Com isso, o professor acredita que a esquerda perdeu a capacidade de catalizar o centro, algo que, segundo ele, Lula fazia bem. "Quem mobiliza o centro político hoje é a direita. A esquerda fica isolada, encastelada no discurso de costumes, nas questões identitárias".

O professor da UniRio prevê um longo inverno para os esquerdistas. "Não vejo possibilidade de crescimento da esquerda em futuro próximo", diz Felipe Borba. Jandira, porém, acredita que o desgaste do governo começou e vai abrir espaço para seu grupo político conquistar novas vitórias. "Temos uma crise político-institucional, uma crise moral, que vem à tona com os vazamentos das conversas de Moro e da Lava Jato. Nós vamos construir a instalação da CPI", diz ela. A deputada acha que a população voltará a se mobilizar contra a privatização das universidades, contra a Reforma da Previdência que será votada no Senado e por medidas contra o desemprego.

Em pouco tempo, saberemos quem tem razão.