Alcides Caminha posa com as coelhinhas da Playboy em 1991. Só nesta data, numa reportagem do jornalista Juca Kfouri, foi revelado que o funcionário público e compositor era também o lendário Carlos Zéfiro, o autor dos catecismos, revistas de quadrinhos eróticos produzidas artesanalmente e vendidas às escondidas entre os anos 1950 e 1970. Caminha morreria no ano seguinte, em 1992. - Arquivo O DIA
Alcides Caminha posa com as coelhinhas da Playboy em 1991. Só nesta data, numa reportagem do jornalista Juca Kfouri, foi revelado que o funcionário público e compositor era também o lendário Carlos Zéfiro, o autor dos catecismos, revistas de quadrinhos eróticos produzidas artesanalmente e vendidas às escondidas entre os anos 1950 e 1970. Caminha morreria no ano seguinte, em 1992.Arquivo O DIA
Por Thiago Gomide
Com a vida de Carlos Zéfiro, você vai entender três pontos importantes:
1) Atrás da sanha dos bons costumes, o regime militar caçou a diversão de uma multidão de moleques.
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2) A garotada sempre foi arisca: corria mesmo em busca dos livrinhos eróticos, tinha até tráfico de informações pra saber onde vendia Carlos Zéfiro.
3) A gente não conhece nossos vizinhos.
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Alcides Caminha era funcionário público, batia cartão no Ministério do Trabalho, morador de Anchieta, bairro querido do subúrbio carioca.
Os vizinhos chamavam de Seu Alcides. Casado, pai de cinco filhos.
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Seu Alcides a noite se transformava em Carlos Zéfiro, uma lenda dos quadrinhos eróticos do Brasil. Um homem, que sem querer, desafiava os bons costumes oferecendo a diversão solitária para os garotos.
Ninguém sabia quem era Carlos Zéfiro. Era um ídolo anônimo. Ficou sem mostrar o rosto por décadas. Décadas.
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Uma galera foi chamada de Carlos Zéfiro. Sabia desenhar? Uhmm, podia ser, hein? Tinha quem apostasse que Ziraldo era o homem por trás do mito. 
Enquanto a mulher dormia, ele desenhava histórias picantes.
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Os livrinhos do Carlos Zéfiro, chamados graciosamente de "catecismo", vendiam em bancas e foram pioneiras. E cabiam no bolso. Ou seja, super fácil de levar pra qualquer canto e passar para um outro ser desejoso por satisfação.
Os meninos ou até mesmo barbudos chegavam e pediam: "tem um catecismo aí pra eu acompanhar?". 
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Era a senha.

Não só no Rio de Janeiro as obras eram procuradas. Os distribuidores, também cheios de mistérios, levavam para os quatro cantos do Brasil.
A repressão militar, é evidente, queria acabar com essa parada. O soft porn, como os americanos definem, do Zéfiro atacava, sem interesse do autor, vale sempre ressaltar, as bases religiosas e desafiava um regime que queria trazer seriedade ao país.
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O distribuidor do Zéfiro, o Hélio Brandão, famoso Hélio Gordo, dono de um sebo na praça Tiradentes, centro do Rio de Janeiro, chegou a ser preso. Não dava para ficar distribuindo aquele conteúdo, ué.  
Essa prisão rolou em plena copa de 1970, em pleno jogo de Brasil e Romênia.
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Em Brasília, dezenas de milhares de revistas foram apreendidas.
Teve até uma investigação sobre o Alcides, mas não foi a frente por falta de provas.
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Alcides tinha pânico quando algum distribuidor era preso. Podia pegar pra ele.
Como funcionário público, ele podia acabar perdendo o emprego. Como homem de família, porque a sociedade podia julgá-lo e, por consequência, olhar atravessado para sua esposa e seus filhos. Depois de aposentado, Alcides também tinha medo de cortarem a aposentadoria.
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O mistério sobre quem era Carlos Zéfiro se arrastou por muito tempo, até que o jornalista Juca Kfouri conseguiu descobrir.
Vou contar rapidinho: Juca era diretor da playboy e queria revelar a identidade do homem mais misterioso do mundo erótico brasileiro.
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Conseguiu contatos e foi parar no sebo do Hélio Gordo, pertinho do João Caetano, em cima da entrada do antigo cinema Presidente. 
O Gordo só deu uma dica e pediu pro Juca nunca mais voltar: o Zéfiro era o codinome de um parceiro anônimo de uma grande composição da música popular brasileira.
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Fácil, né?
Juca procurou, procurou, até que bateu em Alcides Caminha, que dividia composição com Nelson Cavaquinho em “A Flor e o Espinho”.
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Não foi fácil convencer o Alcides a revelar a identidade não. Não foi mesmo. Os fantasmas que o fizeram permanecer escondido apareciam.
A reportagem publicada na Playboy, em 1991, conta esses detalhes. 
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O Brasil, finalmente, sabia quem era Carlos Zéfiro. Os vizinhos sabiam quem era também o Seu Alcides.
Alcides Caminha morreu em 1992, lotado de prêmios, de condecorações.
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Carlos Zéfiro já foi, é e será motivo pra teses e dissertações, livros, documentários, programas especiais...
A história é feita também por esses personagens. 
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*
Flor e o espinho
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A composição é do Alcides Caminha, Nelson Cavaquinho e Guilherme Brito: 
"Tire o seu sorriso do caminho
Que eu quero passar com a minha dor
Hoje pra você eu sou espinho
Espinho não machuca a flor
Eu só errei quando juntei minha'alma à sua
O sol não pode viver perto da lua
Tire o seu sorriso do caminho
Que eu quero passar com a minha dor
Hoje pra você eu sou espinho
Espinho não machuca a flor
Eu só errei quando juntei minh'alma à sua
O sol não pode viver perto da lua
É no espelho que eu vejo a minha mágoa
A minha dor e os meus olhos rasos d'água
Eu na sua vida já fui uma flor
Hoje sou espinho em seu amor
Tire o seu sorriso do caminho
Que eu quero passar com a minha dor
Hoje pra você eu sou espinho
Espinho não machuca a flor
Eu só errei quando juntei minh'alma a sua
O sol não pode viver perto da lua
Eu só errei quando juntei minh'alma à sua
O sol não pode viver perto da lua
Eu só errei quando juntei minh'alma a sua
O sol não pode viver perto da lua"
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Pérola.