Publicado 07/06/2021 19:58 | Atualizado 07/06/2021 20:07
Esperava o ônibus para voltar para casa. A última aula da PUC terminava à noite. Com 17 anos nas costas, só multiplicavam incertezas sobre a universidade e o próprio curso de jornalismo.
Não tardou dez minutos e um Fiat Uno prata parou no ponto. Em uma época pré-insulfim e com a iluminação pública capenga, percebi um cidadão se esforçando pra abrir manualmente o vidro do carona. Todos no ponto olharam atravessado. Rio de Janeiro é Rio de Janeiro, convenhamos. "Tá indo pra onde, Thiago?", me perguntou um companheiro de aula.
Só fui saber que o sobrenome do Thales é Coutinho quando, junto de uma moçada incrível, montamos um programa na rádio Viva Rio. Antes e até hoje só reconheço como Thales Macaé ou Tátá. Nunca vi ninguém falar tão bem de Macaé, na boa. Brincava que, se tivesse os botecos da Lapa, até me mudaria. "Beijo o chão da cidade quando chego lá, como o Papa", gostava de dizer, rindo. Nas inúmeras caronas, conversávamos sobre tantos assuntos, e de forma tão leve, que me conforta só de lembrar.
Dono de um bom humor invejável, fez do apartamento em Botafogo uma redação que misturava risos, comida e a ideia que iríamos mudar o mundo com o "Plano B", o tal programa na rádio Viva Rio. No estúdio no alto da casa na Glória, sede da ONG, entrevistamos de ídolos a aspirantes ao sucesso. As saideiras nos bares ao redor se tornaram tão tradicionais que os garçons já nos esperavam. Ele não bebia uma gota de álcool, mas acompanhava bonitinho na Coca-Cola.
Ao me tornar estagiário da RedeTV!, consegui levar dois amigos para me fazer companhia: Oswaldo e o próprio Thales Macaé. Sonhando em ser jornalista de esporte, talvez fosse na "emissora que mais cresce no Brasil" que ele realizasse. Nos Fla-Flus da vida, rivalizávamos de maneira desigual. Tátá sabia e sabe infinitamente mais do Flamengo a mim do Fluminense. Nas poucas vezes que cobri futebol, ele me ajudou com detalhes fundamentais para que eu não cometesse erros crassos.
Entrei no prédio da mamãe, onde morava, com a pressa que me acompanha desde garoto. "Chegou alguma coisa, Mariano?", fiz a pergunta que também me acompanha desde jovem. Só um envelope. No elevador, abro e vejo que é o convite de casamento do Thales Macaé. Em Macaé, claro. Não via-o mais com frequência desde quando a faculdade terminou e ele decidiu voltar para a terra natal. Em uma pegada insana de trabalho, não consegui ir, mas liguei emocionado com a lembrança e desejando um mundo de felicidade. Ele merece.
No começo desse ano, ao assumir a presidência de uma rádio, enviei mensagem para o amigo, atualmente vereador em...Macaé, claro. Lembramos o quanto tentamos emplacar o "Plano B" em qualquer muquifo que fosse, mas sem sucesso. Bem mais experientes, talvez seja mais fácil entender o sabor do insucesso. Repetindo o gesto de tantas e tantas vezes que nos falamos, ficou no ar aquele convite de "venha aqui ver como está" ou "Macaé tá uma beleza".
Hoje (7), pela manhã, passei pela porta lateral da PUC. O mesmo ponto. Os mesmos sonhos, adequados ao peso e maturidade. Para um cidadão que dormia pensando se não era melhor logo se lançar à História, o Uninho ajudou a pisar no acelerador do jornalismo. "A rádio Viva Rio faliu, o que vamos fazer?", nos perguntávamos quando demos de cara com o portão fechado, sem um aviso sequer. Sentamos no Tribuna da Glória. Tátá bebeu uma Coca e eu uma cervejinha gelada.
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Coluna dedicada à Oswaldo Coelho, Fred Huber, Dadá Coelho, Vinícius Faustini, Victor Rios e Jorge Moreno.
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