Hannah Maruci, Professora de Ciência Política na UFRJ, co-fundadora e coordenadora de educação e articulação política d'A Tenda das Candidatas @instadatendaReprodução/Arquivo Pessoal
Publicado 01/11/2021 09:00
Professora de Ciência Política da UFRJ, Hannah Maruci é uma das responsáveis pelo Tenda das Candidatas, curso que busca atrair mais mulheres à política. A primeira edição, deita de forma voluntária, surgiu em 2020, pensando em ajudar mais mulheres negras a se eleger. Na próxima, que começa esta semana, a ideia é formar 90 lideranças que se tornem candidatas competitivas. Na entrevista ao jornal O DIA, a co-fundadora do projeto fala sobre a importância da diversidade na política, e explica que a formação é para "mulheres que já fazem política no dia a dia (...) mas que, por causa de uma barreira, não entendem que podem ocupar cargos eletivos".
O que a motivou a criar o Tenda das Candidatas?
Hannah Maruci: Atuo há mais de oito anos formando mulheres. Quando estava cursando o mestrado, percebi barreiras à entrada delas, incluindo a falta de acesso a informações. Também atuei como agente do governo aberto em São Paulo, um programa de treinamentos em todo o território, que levou mais de 100 mulheres à política. 
Como é essa formação?
Vamos começar trabalhando o emocional: quem são as alunas como candidatas? Suas pautas? Como se organizar financeiramente? Trabalhamos na criação de uma rede de apoio, e orientamos a escolha de partido. Temos outro bloco sobre saberes como: montagem da equipe, estratégia de campanha, cronograma, além de comunicação online, que tem muito peso. Também entram aí o combate às fake news e ao discurso de ódio. Nosso trabalho tem uma vertente em relação às regras eleitorais, que incentivem a participação das mulheres.
É possível mensurar o impacto do trabalho realizado?
Na edição passada, em duas semanas, assessoramos dez mulheres, e duas foram eleitas — uma quilombola e a outra, a vereadora Thais Ferreira, do Rio. Mais do que eleger candidatas, queremos formar lideranças. Nosso foco é em mulheres que já fazem política no dia a dia, nos seus bairros e comunidades, mas que, por causa de uma barreira, não entendem que podem ocupar cargos eletivos. A formação é para afirmar que a política é nosso lugar. Pensando nessas 20% de eleitas, entendemos que elas também vão multiplicar o conhecimento e criar outras lideranças. Nosso trabalho não é pontual, mas de ciclo. 
Como a diversidade afeta a política? 
Ao melhorarmos a representação, as políticas públicas se transformam; as pessoas que serão alvo desses programas terão voz. Mulheres têm constrangimentos, medo de estar sozinha à noite, de sofrer assédio, coisas que um homem não vive. A chance de essas questões serem colocadas como prioridades diminuem quando há apenas legisladores homens. A importunação sexual, comum no transporte público, só foi tipificada recentemente. 
E quanto às fake news e o discurso de ódio? Como combater? 
Chamamos uma pessoa especializada em segurança digital para preparar as candidatas, ensiná-las como denunciar, saber quem ativar. Na Tenda passada, vimos intimidação para as mulheres desistirem, xingamentos, injúrias raciais e machistas. Uma candidata trans sofreu agressão física. Quando se está sozinha, ou com poucas companheiras, é mais fácil de a violência se instalar. Até os partidos praticam violência, por exemplo, ao não dar apoio à candidata.
Como aproximar a população da democracia? 
Os currículos escolares deveriam ter uma disciplina de política para ensinar aos alunos como funciona o nosso sistema: os papéis de um vereador ou um prefeito, a divisão dos poderes... Isso não vai influenciar os valores, e sim deixar as pessoas mais capazes de atuar, de defender o que acreditam e de escolher seus candidatos.
Como você avalia a reforma eleitoral recente? 
Temos um avanço na aprovação do "peso dois", com os votos recebidos por mulheres e negros contando em dobro para a divisão dos recursos partidários. É um incentivo para os partidos investirem em candidaturas de pessoas negras, pois terão mais recursos públicos no futuro. A regra seria mais efetiva se o peso dois fosse aplicado sobre os eleitos, estimulando a busca por candidatos mais competitivos. Precisamos de mais mulheres e, principalmente, negras eleitas.
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