A influenciadora digital Bielo PereiraDivulgação
Publicado 29/11/2021 09:00
Formada em Turismo e Lazer, Bielo Pereira trabalhava em uma agência até 2016, quando entrou em um processo depressivo e usou o momento para refletir sobre o que queria para si. Decidiu se aventurar pelo universo da internet, e o primeiro passo foi focar na mensagem que tinha a transmitir — e para quem. Vinda da periferia e identificada como uma pessoa não binária, ela investiu no nicho LGBTQIA+, mas diz que seu ponto de partida é a luta contra a gordofobia. Bielo estará na Bienal do Livro, na mesa "Política é pop", no dia 8 de dezembro. Com 206 mil seguidores no Instagram, ela atualmente presta consultoria sobre diversidade no ambiente corporativo.
O Dia: Na Bienal do Livro, você vai participar da mesa Política é Pop. É pop mesmo? Por quê?
Bielo: Acho que sim. Quando vemos a Anitta falando sobre o assunto, a discussão entrou na casa das pessoas. Acho que a pandemia também teve um papel importante nisso, pois tivemos muita clareza sobre o que um governo pode fazer ou não para ajudar as pessoas. A política é pop sim e é cada vez mais uma diva de sucesso.
O conteúdo que você produz não é partidário — mas nem por isso deixa de ser político. Como você vê essa diferença?
Quando as pessoas olham para mim, uma pessoa gorda, com vivência de periferia e trans, imediatamente já têm julgamentos. Estar plena e vivendo bem é um ato político, assim como o fato de existir em espaços que não seriam para pessoas como eu. O partido é a forma como você escolhe usar essa política frente a um grupo. Não sou partidária, mas faço política quando as pessoas me olham e pensam que eu não deveria estar lá.
Estar fora dos padrões é um posicionamento político?
Com certeza. Quando os corpos e vivências diferentes, à margem da sociedade, são considerados "errados", você tem mais poder sobre a manada. É bem mais fácil controlar as pessoas dentro de insatisfações do que num estado de felicidade, porque, dando o mínimo, você já é visto como um "salvador da pátria".
Fala-se em racismo dos algoritmos. Você sente diferença na entrega do seu conteúdo?
A desculpa para termos menos visibilidade é que o mecanismo da plataforma é treinável de acordo com a visão das pessoas. Ou seja, se ele é racista, é porque as pessoas também o são. Porém, as tentativas de corrigir isso acabam tendo o efeito inverso. Se você usa a palavra racismo, por exemplo, em texto ou áudio, seu conteúdo não é entregue. Mas como vamos falar sobre um assunto se não podemos fazer o básico, que é usar a palavra? No entanto, ao mesmo tempo que tem o lado negativo de uma rede que me repele, tenho o bônus de ter a minha voz ouvida.
Você vê alguma diferença no mercado desde o início da sua carreira de influenciadora?
Comecei a trabalhar com internet no fim de 2017, e senti um salto na pandemia. Vejo que pessoas e instituições começam a entender a necessidade de diversidade não como estratégia de marketing, mas com o viés da inclusão de verdade. A morte do George Floyd também teve um papel importante: brancos começaram a questionar o que fazer, a falar em inclusão, antirracismo. Ainda falta muito, mas pelo menos já passamos da fase de explicar conceitos para discutir ações.
Como é seu trabalho de consultoria?
É o que acho mais gratificante. Com a internet, a voz chega a lugares onde não se esperava, mas não sei quantificar a mudança que causei. Já no offline eu chego à empresa, analiso o clima e traço estratégias para ter mais inclusão. E depois disso posso ver um resultado mais concreto. Mas para as transformações acontecerem, é preciso ter diversidade no topo das organizações, além de preparar o ambiente para receber pessoas diferentes. As empresas têm que pensar diferente de cima para baixo.
De todas as barreiras que você enfrenta — raça, peso, gênero, sexualidade, e classe — qual a mais difícil de transpor?
Ainda é a gordofobia. O tema é muito recente, e ainda há muito preconceito por uma carga de patologização. É como se o peso fosse automaticamente uma doença, mas é possível ser saudável tendo um corpo gordo, fazendo exercício, tendo acompanhamento nutricional. Fui internada, e a primeira coisa que me disseram é que eu tinha que emagrecer. Imediatamente questionei: mas como você me fala isso sem ao menos ter um diagnóstico? No fim das contas o problema identificado era algo que me afetaria mesmo se eu fosse atleta. Essas experiências nos afastam dos consultórios médicos e nos tiram o direito à saúde. Já sofri racismo também — mas antes de reparar em qualquer outro recorte, você vê que a pessoa é gorda.
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