Por Luciano Bandeira
O problema do abastecimento de água e de saneamento no Estado do Rio é antigo. A crise atual é um agravamento de um situação crônica de total descaso que vem se perpetuando através de sucessivas administrações e de falta de investimento público.

Decisão do TJ no ano passado, por exemplo, obrigava a Cedae a “aperfeiçoar o plano de monitoramento e potabilidade da água e verificação de redes de distribuição de forma continua, transparente e eficaz”. Nessa ação a Cedae foi condenada a R$ 50 mil a título de danos morais coletivos. Uma ninharia.

A última vez em que a questão foi abordada com seriedade foi justamente na inauguração da Estação de Tratamento de Guandu, em 1955. A estação foi ampliada e modernizada algumas vezes nesses 65 anos, mas o sistema de abastecimento há muito encontra-se subdimensionado em virtude do aumento da população e do consumo.

Não é admissível que o fornecimento de água para milhões de pessoas seja dependente de uma sistema tão frágil – como ficou evidente na atual crise. Ficou claro, com a contaminação da água distribuída (por geosmina, por detergente e sabe-se lá pelo que mais), que não temos plano B. E isso é uma situação de imensa gravidade para a população das cidades que são atendidas pela Cedae.

É preciso saber o que ocasionou os dois problemas, a contaminação por geosmina e a entrada de detergente na estação de tratamento.

Além da contaminação em si, a maneira pouco transparente como a empresa reagiu e lidou com as informações contribuiu para minar sua credibilidade institucional. O produto deveria ser inodoro e incolor, mas adquiriu cheiro de terra e coloração turva.

Diante de tais fatos, não adiantou a direção da Cedae garantir que a água é própria para o consumo. Multidões correram para se abastecer de água mineral, provocando escassez e inflacionando o preço do produto em mais de 100%. Houve, portanto, um segundo prejuízo à população.

Infelizmente, estamos reféns da Cedae. A solução não virá do dia para a noite, mas é preciso enfrentar imediatamente a questão e nos prepararmos para o futuro.

Em função do agravamento do problema endêmico, e da incapacidade de a Cedae apresentar respostas e soluções aceitáveis para a sociedade, a OABRJ criou o Fórum Permanente de Recursos Hídricos e Saneamento, coordenado pela Comissão de Direito Ambiental.

O fórum tem um caráter interdisciplinar, reunindo as comissões da OABRJ relacionadas ao tema para alimentar a sociedade com dados e colocar a Ordem a serviço de iniciativas que visem a transparência e a gestão eficiente desse bem de uso comum.

No primeiro momento estamos mapeando as iniciativas já feitas a esse respeito. Vamos estreitar relações com órgãos e entidades que estão empenhadas em encontrar soluções e em obter mais transparência e confiabilidade por parte da Cedae. Iremos dialogar com a sociedade civil, Defensoria Pública, Ministério Público, Universidades, Alerj e colocar nosso conhecimento jurídico e estrutura à disposição dessa causa.

A qualidade da água distribuída para a população é assunto de extrema gravidade. Não é uma questão política ou partidária, mas de saúde pública. A Cedae mostrou não estar preparada para situações adversas. É importante que a direção da empresa venha a público apresentar um plano de emergência para evitar a repetição de problemas dessa magnitude. Mas, antes, é fundamental que a sociedade saiba o que causou a crise e que a Justiça atribua responsabilidades e punições.
Luciano Bandeira é presidente da OABRJ.