Por O Dia
A gravidade da pandemia da Covid-19 nos obriga ao confinamento, seguindo orientações das autoridades sanitárias. Devemos ficar em casa com nossas famílias o máximo possível para evitar a disseminação do vírus. É um momento duro e difícil. Mas não é igual para todos.

Em 25 de maio, Dia Nacional da Adoção, foi impossível não pensar nas milhares de crianças em todo o país que estão vivenciando tudo isso sem uma família, sem um abraço, apoio ou carinho de pais. Por terem sido abandonadas, terem sofrido violência física ou sexual, orfandade ou por estarem em condições de extrema vulnerabilidade, elas foram encaminhadas para acolhimento.

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) divulgou esta semana que nos últimos cinco anos (entre maio de 2015 e início de maio deste ano), 10.120 crianças foram adotadas no país. Sendo 57% de 2018 para cá, o que indicaria um bem-vindo aumento de casos de novas famílias sendo formadas.

No início do mês, oficialmente, havia 32.791 crianças em acolhimento institucional e 1.366 em acolhimento familiar segundo o Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA).

Mas ONGs e grupos que trabalham com o tema avaliam que o número de crianças e adolescentes à espera de uma família e de um lar definitivo estaria subnotificado. Seriam cerca de 40 mil em todo o país.

Em vista disso, é importante dar celeridade a esses processos para aumentar as chances de crianças terem novos pais. As estatísticas mostram que a idade é um fator crucial no desenlace positivo. Quanto mais jovem, maior a possibilidade de se conseguir deixar uma instituição. Das adoções desde 2015, 51% foram de menores de 3 anos (5.204); enquanto 6% foram de adolescentes acima de 12 anos (649).

A Constituição determina, em seu artigo 227, que crianças e adolescentes são prioridades absolutas. Infelizmente não é o que ocorre. O Provimento 36/2014 do CNJ estabelece, por exemplo, que a cada 100 mil habitantes toda comarca deveria ter uma vara específica para tratar exclusivamente de criança e adolescente, com uma estrutura com psicólogo, assistente social e pedagogo.

Não é o que ocorre. Na cidade do Rio de Janeiro, com quase 7 milhões de habitantes, temos apenas 4 varas, nenhuma delas exclusiva.

Seria importante que o Tribunal de Justiça investisse na abertura de novas varas, de preferência eletrônicas, pois desburocratizam o processo, ou na transformação das varas de família em extinção.

Atualmente, a média de espera para uma família conseguir adotar (entre o pedido de habilitação e a data da sentença) é de 4,3 anos. É preciso considerar que, em muitos casos, o perfil específico da criança pretendida pode prolongar esse tempo de espera. Seria importante facilitar a adoção por parte de famílias de outros países também. No ano passado, apenas 12 crianças foram adotadas por estrangeiros no estado do Rio. Neste ano, até agora, nenhuma.

Um problema grave é que algumas das entidades de acolhimento para criança e adolescentes na fila para a adoção estão longe de serem adequados. São instalações precárias, com goteiras e infiltrações, sem condições de higiene e falta de privacidade.

Tradicionalmente, a demanda maior é por crianças pequenas. Mas gênero e etnia deixaram de ser critérios tão relevantes quanto no passado, quando meninas e crianças brancas eram mais procuradas.

Outro fato positivo é que o trabalho incansável de grupos de apoio à adoção, muitos auxiliados por advogados em todo o Brasil, têm conseguido agilizar a solução de casos que poderiam ser mais difíceis, como a adoção conjunta de irmãos, crianças maiores ou com algum tipo de deficiência.

É auspicioso, mas não é suficiente.
Luciano Bandeira é presidente da OABRJ.