Alexandre Lino em 'O Porteiro': seis meses recolhendo depoimentos para a peça
 - Janderson Pires
Alexandre Lino em 'O Porteiro': seis meses recolhendo depoimentos para a peça Janderson Pires
Por BRUNNA CONDINI | brunna.condini@odia.com.br

Rio - Migrar é mudar de lugar. E todo migrante deixa para trás uma história. Segue em busca de viver outra história, geralmente com melhores oportunidades. Nos últimos anos, o ator Alexandre Lino mergulhou fundo no universo de migrantes que ele conhece de perto: os nordestinos. Lino é de Gravatá, Pernambuco, e vem trabalhando no que ele chama de trilogia nordestina, com 'Domésticas' (2012), 'Nordestinos' (2015) e 'O Porteiro', que estreou ano passado e cumpriu temporada em 2018.

"Esses espetáculos têm compromisso com a realidade de meu povo. Em 'O Porteiro', foram seis meses recolhendo depoimentos", conta Alexandre. "Já fizemos mais de 20 cidades em cinco capitais, um público estimado em 25 mil espectadores. As cidades em que passamos solicitam nosso retorno. Em fevereiro, voltaremos a Brasília nos dias 23 e 24 no Teatro dos Bancários. E na última semana de março, já temos agenda de apresentações em Curitiba. E seguiremos fazendo outras cidades que estão em negociação como São Luis, no Maranhão, e região dos Lagos do Rio", anuncia.

HOMENAGEM

A montagem é uma divertida homenagem a todos os profissionais que cuidam das portarias pelo país. "O humor que faço tem perspectiva documental. No meio de nossa sociedade existe um Brasil notado por poucos. Um grupo formado por pessoas que, apesar de conviver conosco, é como se não estivesse lá. O espetáculo inverte isso, e são eles, os porteiros, os protagonistas", define. "Há uma força imensa em alguém que se abre para contar sua história. Se me permitem contá-las, tenho que honrar esse compromisso. Sou um migrante nordestino e sei do tamanho desses sentimentos".

Ele salienta ainda o que marcou na história dos profissionais que indicou para esta entrevista: "A determinação e a coragem. Ambos vieram em busca de realização de seus sonhos e se sentem vitoriosos. Isso é de uma potência extraordinária. Não é fácil ser migrante nordestino no Sudeste".

DUAS PROFISSÕES

José Marcos Teixeira de Miranda, 47 anos, chegou ao Rio em 1994 e começou a trabalhar como porteiro em 1996.

"No começo, foi difícil, mas me acostumei. Gosto demais dessa cidade. Sou realizado. Tenho um filho que é tudo na minha vida. Já comprei minha casa, meu carro, e foi aqui que construí minha história e não quero nunca mais sair daqui", diz ele, que costuma ir uma vez por ano para sua cidade. "É uma profissão, tem importância. Você lida com o público, com vários tipos de pessoas, e acabo aprendendo muito com isso".

Exercendo a função há 22 anos, ele conta que já sofreu discriminação. "Já me trataram mal. Já teve gente se achando melhor do que eu", lembra. "Mas me sinto realizado. Através desta profissão me formei, fiz licenciatura em história. Sou uma pessoa bem melhor agora. Tenho tudo que eu queria, graças à minha profissão", completa.

APAIXONADO

Natural da Paraíba, José Ailton Ferreira também chegou à cidade em 1996, desempregado por conta da seca, mas só foi trabalhar na portaria três anos depois. Antes, trabalhou como auxiliar de serviços gerais. "Construir sua história longe do seu lugar de origem é começar do zero, num lugar desconhecido, ter fé que vai dar tudo certo e trabalhar bastante. Hoje estou tranquilo", diz. "Consegui trazer minha família para cá. Hoje, todo mundo tem seu emprego e suas casas. Então, valeu a pena eu sair lá do meu Nordeste e batalhar a vida em outro estado, que eu amo de paixão. Faria tudo de novo", conta o profissional, que é porteiro há 20 dos seus 47 anos.

José Ailton afirma que é gratificante participar tão de perto da vida dos moradores. "Acompanhar as crianças crescendo. Tenho o respeito deles, e acaba que participo até um pouco da educação, pois formamos um laço", diz. "Sou apaixonado pela minha profissão, e o Rio me acolheu muito bem. Um porteiro é um amigo que está ali para os moradores, independentemente da cor, da opção sexual. É a minha visão".

E revela um sonho: "Quero ainda comprar uma casa de praia. Quem sabe, no futuro".

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