Por tabata.uchoa

Rio - Após 40 anos de carreira, Fafá de Belém tem horror a se repetir. Lançando o DVD ‘Do Tamanho Certo Para o Meu Sorriso — Ao Vivo’, gravado em agosto de 2016 no Teatro Bradesco (São Paulo), ela lembra que o disco de estúdio de mesmo nome (lançado há dois anos), que originou o DVD, surgiu após uma série de propostas recusadas. 

'Nunca me vendi nem pra marido%2C nem pra namorado%2C nem pra produtor%2C nem pro sistema. Sempre fui empoderada'%2C diz Fafá de BelémDivulgação

“Me convidavam só para fazer aquele requentado de sempre. Requentado, nem café eu tomo!”, brinca, revelando que já não tem mais a mesma paciência para ficar trancada em estúdio. “Me propunham fazer disco de duetos, um ‘best of’ de 40 anos. E eu estava há oito anos fora do mercado fonográfico”.

Os desafios que Fafá está enfrentando agora são bem mais animadores do que o que o mercado lhe propunha. Participando semanalmente do quadro ‘Show dos Famosos’, do ‘Domingão do Faustão’ — em que já interpretou Adele, Maria Bethânia e Alcione —, Fafá está envolvida com aulas de canto, expressão corporal e com acompanhamento de fonoaudióloga — um trabalho que lhe preenche, estima ela, “de dez da manhã às oito da noite, de segunda a sábado”. Detalhe: pela primeira vez na vida.

“Eu nunca fiz aula de canto. Não é da minha geração”, diz, rindo. “A gente saía fazendo. Hoje, tô tendo aula de gestual, de canto. Me ligo na voz e no conjunto da pessoa também”. À exceção de uma ou outra aparição no palco, a agenda de shows de Fafá só retorna de verdade no fim do mês — em 29 de junho ela passa pelo Teatro Bradesco, na Barra, para lançar o DVD. “Eu nunca tive tempo de ter disciplina. Sou muito profissional, mas às vezes a disciplina se perde. Estou adorando tudo. É como se eu tivesse me reinventado, me recolocado diante da vida aos 60 anos”, conta.

FAFÁ EM INGLÊS
A produção do ‘Domingão’ pediu a Fafá, assim que ela entrou na competição, uma lista de 25 nomes que ela gostaria de incorporar. A cantora fez as escolhas pela identificação. “Peguei homens e mulheres, nacionais e internacionais, pelos quais tenho admiração. Nem fui só pela voz, peguei pessoas que me ajudaram a enfrentar esse nosso meio — que é terrível — e mantiveram a privacidade. Privacidade é minha loucura!”

O maior desafio, claro, foi fazer a britânica Adele. Fafá, que ficou nos tópicos mais compartilhados do Twitter por causa do quadro, não fala inglês. “Dormi com Adele durante dez dias, querido!”, brinca Fafá, rindo bastante.

“A letra chegou até mim escrita em fonemas. Eu queria pegar o sotaque dela, foi meu pulo do gato. A (fonoaudióloga do programa) Maria Silvia Siqueira Campos me aqueceu, a minha fono Silvia Pinho me ajudou, o (preparador vocal do quadro) Felipe Habib me botou no palco... A Adele parece uma criança cantando com o olhar de uma mulher amargurada. Essa decupação da personagem é feita exaustivamente”, conta Fafá.

“Temos que entender até onde o homenageado usa a voz, em que lugar da parede vocal. Acredita? O trabalho do Habib chega a esse ponto”, conta Fafá, que continua envolvida com a TV: participa em breve de ‘A Força do Querer’, de Glória Perez. E no teatro, em agosto, volta com o musical ‘O Homem de La Mancha’, de Miguel Falabella.


DIRETAS
“Fiz a campanha das Diretas Já em 1984 e nunca tive cargo político, nem botei um dinheiro sequer no bolso. Só fiz por ideologia”, lembra Fafá, que não tem muito a se alegrar com o país que ajudou a construir nos anos 1980. “O Brasil tá muito manipulado. Não existe essa coisa de ‘ou isso ou aquilo’. Existe um país a ser construído novamente após um terremoto moral. A discussão é mais profunda do que essa”.

Fafá apoiou Aécio Neves na eleição de 2014. Assim que estouraram os áudios que denunciavam corrupção do senador, a cantora postou uma bandeira do Brasil no Twitter. E diz ter sido escorraçada na rede social. “Nunca fui tão ofendida! Que ódio é esse, né? É um troço tão odioso que no dia seguinte publiquei foto com minha neta e um cara fez um comentário tão ofensivo que ele poderia ser preso por pedofilia”, indigna-se Fafá. Ela soube da manifestação que artistas e alguns políticos fizeram no Rio, pedindo eleições diretas. “Estou assistindo”, conta.

EMPODERADA HÁ 40 ANOS
O termo “empoderamento” empolga Fafá, que faz questão de falar que nunca ninguém comandou sua vida. “Nunca me vendi nem pra marido, nem pra namorado, nem pra produtor, nem pro sistema”, conta. “Sempre fui empoderada”. O produtor Roberto Santana, que a lançou nos anos 1970 na PolyGram (hoje Universal) e passou para a história como o cara que apresentou Caetano Veloso a Gilberto Gil, a aconselhou bastante a seguir essa trilha, como ela lembra.

“Eu estourei com 18 anos! O Roberto é um cara que acredita no que ele acredita e pronto. Eu falava pra ele: ‘Olha, fulano me sugeriu isso e aquilo’, e ele: ‘Então vai trabalhar com fulano!’”, conta. “Eu reclamava: ‘Roberto, meu pai botou você pra cuidar de mim e você faz isso?” E ele: ‘Eu quero construir uma carreira com você. Você tem que entender a diferença entre ter uma carreira e ter sucesso fácil’. Eu entendi. Tanto que fiquei oito anos sem lançar disco, né?”

Fafá avisa que é para todo mundo se programar para o show do DVD no Rio. E dá só um spoiler da apresentação. “Se prepara que a cena da cama é quente!”, diz. 

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