Por tiago.frederico
Rio - Numa noite abafada de fevereiro, pouco antes do Carnaval de 2005, Perfeito Fortuna e Márcio Libar observavam impressionados, de uma das esquinas da Rua do Lavradio, o desfile do Cordão do Boitatá. Ficaram surpresos ao perceber como o grupo, que apenas cinco anos antes contava com, no máximo, 50 integrantes, havia se transformado num bloco com mais de 500 pessoas. Naquele instante, Fortuna — ex-integrante do grupo teatral Asdrúbal Trouxe o Trombone e um dos idealizadores do Circo Voador — teve uma ideia: por que não criar uma competição de marchinhas? Seria uma forma de garantir a trilha sonora para muitos blocos, que, àquela altura, ainda nem haviam nascido, e ainda estimularia o surgimento de novos compositores.
O Cordão do Boitatá inspirou o concurso e se apresenta hoje na finalDivulgação

Dez anos depois, a ideia, que nasceu de forma despretensiosa, se transformou em tradição, e o Concurso Nacional de Marchinhas passou a ser um sinal infalível da aproximação do Carnaval. Hoje, ao acompanhar a chegada da final da décima edição do evento que concebeu, Fortuna não deixa de pensar no futuro, mas sem esquecer o vínculo com o passado.

“Somos herdeiros de uma tradição musical muito rica, construída por nomes como Braguinha, Pixinguinha e João Roberto Kelly. De certa forma, eventos como o concurso de marchinhas estimulam a criatividade dos compositores. Por consequência, essa herança permanecerá viva pelos Carnavais que ainda estão por vir. E não apenas no Rio, mas em todo o Brasil”, teoriza.

Como que para confirmar as palavras de Fortuna, duas das três marchas participantes da final da edição 2015 do concurso — que acontece hoje, às 19h, na Fundição Progresso, e cuja abertura ficará a cargo do Cordão do Boitatá — não nasceram em território fluminense: ‘Adoro Celulite’, de Jota Michiles e Gustavo Krause, vem de Recife. ‘Fucei seu Feice’, de Paulo Padilha, tem DNA paulistano. Já ‘Marchinha Literária’, composta por Roni Valk, é a representante carioca.
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“Nas edições anteriores, as três marchas que competiam pelo prêmio final eram conhecidas apenas no último dia. Este ano, decidimos antecipar os nomes das finalistas. Os autores das duas composições que não são do Rio deverão trazer torcidas de seus próprios estados. No fim, todas se igualam aqui na Lapa”, afirma a produtora do Concurso de Marchinhas, Vanessa Damasco.
A revitalização da área mais boêmia da região central da cidade tem ligação direta com o ressurgimento do Carnaval de rua e, por consequência, com as marchinhas.
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“Foi ali pelo fim da década de 1990 e início dos anos 2000 que a Lapa renasceu. Naquela época, durante o Carnaval, blocos como o Cordão do Boitatá e o Céu na Terra, que no início eram bem pequenos, começaram a crescer e a desfilar pela região, num movimento que se espalhou por outras regiões e, de certa forma, transformou o Carnaval em toda a cidade. Naquele momento, voltamos a perceber o quanto as marchas eram indispensáveis para animar os foliões”, relembra o ator Márcio Libar, que participou da concepção do Concurso Nacional de Marchinhas.
As três marchas que chegaram à final concorreram com outras sete canções, enviadas por compositores que vivem em Brasília, Campinas, Manaus, Porto Alegre, Rio de Janeiro, São Paulo e Londrina. Apenas na disputa deste ano, 1.339 músicas foram inscritas — na década de existência da competição, foram mais de 10 mil marchinhas inscritas, vindas de todos os estados do Brasil.