Por karilayn.areias
Marco Ricca interpreta Chatô de forma histriônicaDivulgação

Rio - Enfim, chega às telas ‘Chatô’, a mais conturbada produção da história do cinema brasileiro. Desde a compra dos direitos autorais da biografia de Fernando Morais, ‘Chatô , O Rei do Brasil’, até a entrega das cópias às salas de exibição passaram-se 20 anos de problemas com a Justiça, o fisco e patrocinadores em geral. Pensou-se que jamais estrearia. Porém, estreou. E do ponto de vista da crítica, bem.

Supunha-se que um dos maiores inimigos do filme seria justamente o tempo. A possibilidade de o filme ter envelhecido após mais de 15 anos de filmagens era dada como certa, sobretudo quando sabia-se que alguns atores, como Walmor Chagas e José Lewgoy já haviam falecido. Mas ‘Chatô’ é salvo pela opção por uma narrativa que dribla a linearidade e o transforma numa obra onírica, alegórica e de uma atemporalidade que o faz transcender o tempo do Brasil que retrata e a distância do período em que foi produzido.

Do ponto de vista cinematográfico, o diretor Guilherme Fontes dialoga com a cinematografia internacional e brasileira. Há ressonâncias de Orson Welles, Fellini e Bob Fosse. Assis Chateaubriand, o protagonista, é interpretado em seus arroubos nacionalistas como um Cidadão Kane da caatinga, cuja Rosebud, sem sutileza lhe será esfregada na cara na sequência final. No leito de morte, vive entre delírios e alucinações, muitas músicas, que remetem a ‘All That Jazz’, de Fosse, e aos personagens do imaginário felliniano.
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Mas é o Brasil que ‘Chatô’ mais reverencia. A opção por uma narrativa carnavalizada, em que a história das comunicações no país se apresenta como um enredo amalucado, mostra Getúlio Vargas (Paulo Betti), Chatô (Marco Ricca) e a onipresente socialite Vivi (Andréa Beltrão) acenando dos seus carros alegóricos como representações abstratas de estratos da sociedade que vivem um embate altamente contemporâneo: o poder, os meios de comunicação e a elite.
‘Chatô’, portanto, é uma releitura do Brasil pelos olhos da chanchada. A caricatura, assumida, sobretudo na atuação histriônica de Marco Ricca, retoma o poder da crítica avacalhada, hiperbólica, mas nem por isso menos oportuna, de clássicos como ‘Nem Sansão Nem Dalila’, de 1955, de Carlos Manga, com Oscarito e Grande Otelo. Reflete um estado de anarquia bem brasileiro, seja dentro ou fora das telas.
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