Rio - Viver sem medo. Esse deveria ser um direito de todas as mulheres. Mas, em uma sociedade onde uma de nós é morta a cada duas horas, fica difícil acreditar que essa é uma realidade possível. A atriz Cristiane Machado virou um exemplo público do que muitas mulheres passam todos os dias em suas casas. Em 2018, ela divulgou imagens em que aparece sendo agredida pelo então marido. O que motivou essa exposição?
Fim das agressões
Hoje, o ex-marido já sentenciado e condenado, cumpre três anos de prisão em regime semiaberto por dois processos de violência doméstica e um de cárcere privado. "Ele ameaçou me matar e matar meus pais se eu o entregasse. Vivia coagida, com medo das ameaças. Não podia discordar de nada. Até que um dia, ele chegou muito nervoso, me deu um empurrão e não me deixou sair de casa. Eu queria ir embora, mas ele pegou um fio de telefone grosso e me enforcou e ali achei que ia morrer. Fiquei em cárcere privado e só consegui sair quando, ele deitado, mandou eu deitar, e dormiu. Foi uma madrugada de terror. Saí no dia seguinte escondida, porque os funcionários chegaram e ele queria disfarçar. Fugi e ele ficou atrás de mim na delegacia e no IML para me impedir de denunciar, mas consegui", lembra Cristiane ao dar o relato de uma das agressões que sofreu no dia fatídico em que saiu de casa.
Mesmo com medo, a atriz continua tentando seguir em frente e dar a volta por cima. "Penso e agradeço todos os dias por sair viva daquela casa. Afinal, poderia não estar aqui para contar a minha história. Faço psicoterapia com especialista de violência contra mulher, porque tive várias doenças como consequências do trauma que vive. Como meu agressor ainda me persegue é natural. Mas estou sim, com muita garra, força tentando colocar minha vida no lugar. Ainda existe um enfrentamento de julgamentos de outros crimes praticados por ele e ainda estou nesse momento. Mas todos os dias acordo pensando que Deus me deu a chance de viver de novo. E assim farei. Sorrirei e ainda com mais vontade de ser feliz e fazer tudo que amava e estar com as pessoas que amo: meus amigos e família. E viver, sim, feliz uma nova vida", sonha.
Uma nova missão
Mesmo sem querer, Cristiane conseguiu tirar algo de bom de toda a experiência com o ex-marido. Atualmente, a atriz tem usado o conhecimento recém-adquirido para ajudar outras mulheres. "Levanto a bandeira não por uma ideologia, mas porque senti e sinto hoje a dor em cada parte. Sei cada falha, sei de leis que nunca imaginei que saberia. Conheço o medo da coação, cada ciclo da violência e a necessidade da coragem. Por isso, quero ajudar mulheres no que posso. E tenho essa missão, não por obrigação, mas porque meu coração diz que preciso ajudar a tentar fazer um mundo melhor, um mundo seguro", argumenta a atriz que aproveita para dar um conselho a quem passa pelo mesmo tipo de violência que ela passou.
"Denunciem. O caminho é longo, difícil e traumático. Até hoje, quase um ano depois, tenho pesadelos e medo de morrer. Mas precisamos ter coragem e denunciar! Temos que acreditar que a justiça vai ser feita. Não há nada que justifique a violência. A vergonha quem tem que sentir é o agressor. Tenham coragem e, quanto mais falarem, melhor, porque o agressor gosta do silêncio da vítima. Enfrente", encoraja Cristiane.