Parlamentares vão analisar texto da proposta de Reforma da Previdência na CCJ da Câmara - Pablo Valadares/Câmara dos Deputados
Parlamentares vão analisar texto da proposta de Reforma da Previdência na CCJ da CâmaraPablo Valadares/Câmara dos Deputados
Por MARTHA IMENES

Rio - A decisão do governo Bolsonaro em impor sigilo a documentos que embasam estudos para a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 6 põe no mesmo campo aliados e opositores e pode complicar ainda mais a tramitação da Reforma da Previdência no Congresso. Hoje, por exemplo, está marcada a votação do relatório da reforma na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), mas diante da restrição de acesso a informações que deveriam ser públicas, a sessão promete ser tumultuada. Segundo o governo, os dados serão conhecidos pelos parlamentares que fazem parte da Comissão Especial. Ontem, O DIA solicitou os dados que não foram repassados pelo Ministério da Economia.

Para o deputado federal Alessandro Molon (PSB-RJ) não há porque dar tratamento diferenciado a parlamentares da CCJ e da Comissão Especial. "O governo precisa entender que não votar (a PEC 6) na CCJ atrasa a reforma. E o único responsável por isso é ele mesmo, que negou acesso aos dados ao país inteiro", afirmou Molon.

Requerimento de acesso aos estudos foi feito pelo senador José Serra (PSDB-SP). "O melhor para o próprio governo seria abrir todos os cálculos e pareceres que embasaram sua proposta. Daria mais argumentos aos que defendem a reforma”, afirmou o parlamentar tucano.

A restrição de dados também é questionada pelo senador Paulo Paim (PT-RS) e por advogados, que não veem motivo para que o governo blinde os números. "Não pode restringir o acesso, a Previdência Social é pública", adverte Paim. "O governo somente poderia impedir o acesso antes de apresentar a PEC. Como ela já está na CCJ, isso não pode ocorrer", informou Guilherme Portanova, advogado da Federação das Associações dos Aposentados e Pensionistas do Rio.

Interesse público

Especialista em Direitos Constitucional e Administrativo e professor da PUC-Rio, Manoel Peixinho vai mais além e avalia que manter o sigilo é inconstitucional. "Ele (sigilo) só pode ser decretado para a segurança do Estado e da sociedade e a Reforma da Previdência é de interesse público", diz Peixinho. E acrescenta: "Decretar o sigilo é violar o princípio da publicidade, que é um dos princípios fundamentais norteadores da Administração Pública, e está previsto na Constituição".

"Se o governo não apresentar esses estudos, a PEC 6 vai violar os Artigos 113 e 114 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que determina toda a proposição legislativa que crie ou altere despesa obrigatória ou renúncia de receita deve ser acompanhada da estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro", diz Portanova.

Cálculo guardado a sete chaves

Um dos pontos mantidos em segredo pela equipe econômica do governo Bolsonaro é o detalhamento do valor do impacto fiscal de cada item proposto na Reforma da Previdência. O Planalto afirma que o projeto gera economia de aproximadamente R$ 1 trilhão em dez anos, mas se nega a abrir o cálculo desse valor a parlamentares e à imprensa, segundo a "Folha de S.Paulo".

Congressistas questionam, por exemplo, qual seria o impacto de eventual supressão dos trechos da PEC que promovem mudanças em aposentadorias rurais e nos benefícios pagos a idosos em situação de miséria. Os pontos têm chances de retirada da proposta, com aval de aliados. A informação poderia ser esclarecida com o acesso aos estudos elaborados pelo Ministério da Economia, agora classificados como de acesso restrito.

Divulgação dos números só na Comissão Especial

Procurado pelo DIA, o Ministério da Economia informou ontem que os dados são de responsabilidade da Secretaria de Previdência, subordinada à pasta, que por sua vez, divulgou que "desde o envio da proposta da Nova Previdência à Câmara dos Deputados, os dados que embasam a PEC 06/2019 foram amplamente divulgados e constam na exposição de motivos". "Cabe ressaltar que o modelo de análise de impacto previdenciário é público e pode ser acessado por qualquer cidadão", respondeu em nota. A secretaria, no entanto, não detalhou quais são os documentos e como podem ser localizados.

A pasta informou ainda que dados desagregados de impacto da economia serão apresentados na Comissão Especial da Câmara. Mas essa decisão é questionada pelo deputado federal Alessandro Molon (PSB-RJ), que defende abertura dos números já na CCJ. "A fase de tramitação da proposta de Reforma da Previdência já começou na Câmara. Por todas as comissões que ela vai passar os dados devem ser conhecidos", afirma.

"Todas as informações serão apresentadas e todas as perguntas respondidas na discussão de mérito", informou a Secretaria de Previdência.

Desde março tucanos pedem informações

No início de março o senador José Serra (PSDB-SP) já havia feito um requerimento direcionado ao ministro da Economia Paulo Guedes em que pedia o detalhamento dos cálculos feitos pelo governo. Serra queria ter acesso à "memória de cálculo das estimativas de impacto fiscal líquido apresentadas pela tabela da Exposição de Motivos que acompanhou a mencionada PEC". 

Já em abril a bancada do PSDB da Câmara dos Deputados cobrou que o governo apresentasse os dados sobre o impacto anunciado da Reforma da Previdência. Segundo uma nota emitida pelos tucanos, o partido entende a necessidade da reforma, mas alerta que a discussão da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) só irá avançar "com a necessária transparência" quando o governo apresentar as informações sobre o tema.

"Apesar de estarmos convencidos da importância da Reforma da Previdência, os deputados do PSDB cobram, com razão, os dados numéricos que fundamentam a sua aprovação", afirmou o líder tucano, Carlos Sampaio (SP), na nota.

Na audiência pública na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, a primeira a analisar a PEC da Previdência, o ministro defendeu a proposta. E repetiu que a economia prevista com a reforma é de aproximadamente R$ 1 trilhão em dez anos e citou os mesmos dados já divulgados quando a PEC foi apresentada ao Congresso.

Quando apresentou a PEC da Previdência, o governo calculou que a maior economia viria com a reforma do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), dos trabalhadores da iniciativa privada. Com as alterações de regras nessa frente, serão poupados R$ 715 bilhões em dez anos.

Como estruturada, a PEC também prevê economia maior de recursos com corte de benefícios assistenciais (R$ 182,2 bilhões) do que com mudanças nas regras para servidores públicos (R$ 173,5 bilhões). O PSDB quer, no entanto, detalhes dessa conta para saber como o governo chegou a esses números.

Você pode gostar
Comentários