Mas, o que deveria servir de alento a quem está passando por dificuldades, transformou-se uma tremenda dor de cabeça. Isso porque ou o benefício simplesmente não é aprovado, mesmo que o trabalhador se enquadre nas regras de concessão, ou dinheiro "some" da conta.
E no meio desse desespero e inumeráveis idas ao banco à toa, a população padece com a falta de informações. Uma leitora procurou O DIA e contou sua história, devidamente documentada. Mãe soleira de uma menina de 4 anos, a mulher que chamaremos de X, 40 anos, perdeu sua fonte de renda com a pandemia de coronavírus. Sem recursos, ela deu entrada no auxílio emergencial e teve o benefício aprovado.
"Recebi as duas primeiras parcelas, mas a metade da terceira não consegui sacar, nem pagar conta e muito menos transferir. Entrei no aplicativo Caixa Tem e meu benefício não estava mais lá", comenta. Após essa consulta o acesso ao aplicativo não foi mais possível.
O que ela fez? Procurou a Caixa Econômica, pagadora do benefício. "A pessoa que me atendeu no banco disse que meu cadastro estava certo e que não sabia porque o dinheiro estava bloqueado. Ela me orientou a desinstalar o aplicativo e instalar de novo para ver se conseguiria movimentar o dinheiro. E nada. Voltei para casa e esperei para tentar novamente o processo. E de novo, nada", conta.
Situação similar passou Janaína Souza da Silva, 49 anos, moradora da Maré. "Apareceu um cadeado no aplicativo e não consegui fazer mais nada nele", explica Janaína, que esta semana esteve três vezes na Caixa de Bonsucesso para tentar resolver o problema e, assim como X, foi orientada a desinstalar o app do aparelho, refazer o cadastro, inclusive colocar outro e-mail, e ir para casa para esperar funcionar. Passados quatro dias das inúmeras tentativas, não funcionou. O dinheiro? Está na conta e a beneficiária, a ver navios.
Por mais de três horas Thiago Alexandre dos Santos, 22, morador de Belford Roxo, ficou na fila da caixa no largo da carioca. O motivo? O aplicativo bloqueou o acesso do beneficiário do auxílio emergencial e enviou a mensagem de que o "CPF está cadastrado em outro aparelho". Mas não estava. "O pessoal já está recebendo a quarta parcela e eu agora que vou conseguir receber a terceira porque o aplicativo deu erro", lamenta.
Jogo de empurra entre Cidadania e Caixa e nada do dinheiro aparecer
Com os prints do celular de X, O DIA entrou em contato com a Dataprev, o Ministério da Cidadania e a Caixa Econômica para saber o motivo do bloqueio e da dificuldade da beneficiária receber o auxílio emergencial.
A Dataprev informou que apenas faz o processamento dos dados e que o bloqueio e liberação são de competência do Ministério da Cidadania. A pasta, por sua vez, divulgou que o auxílio foi reavaliado por ter seu cadastro identificado com indícios de desconformidades com a Lei 13.982/2020. E que "confirmado que o cadastro respeita os critérios para o recebimento do auxílio emergencial, os recursos serão liberados". Mas não deu prazo para liberação.
O DIA questionou a Caixa sobre o não acesso à poupança social, o bloqueio do dinheiro e o aplicativo que não se consegue instalar.
O banco negou que o aplicativo esteja com problemas e pediu que a trabalhadora vá à agência bancária para regularizar o cadastro. Tudo o que X já fez e mesmo assim não teve o benefício liberado.
"A atendente checou tudo de novo e os documentos e informações estão corretos", explica X.
O jovem Leonardo Stephano dos Santos, 36, da Lapa, espera há cinco meses para ter o crédito do dinheiro. Embora a Lei 13.982 estabeleça que até duas pessoas da mesma casa tenham direito aos R$ 600, Leonardo teve o benefício negado.
Para tentar receber o auxílio, Leonardo aderiu ao mutirão de conciliação do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), que teve o prazo estendido até o dia 21.
A resposta da Advocacia-Geral da União (AGU) ao Núcleo de Conciliação do TRF-2 saiu esta semana, e as informações são desoladoras. Segundo a AGU, o auxílio foi negado porque consta no cadastro de Leonardo que ele mora com outras três pessoas que recebem os R$ 600: a sogra, a irmã da sogra, e a esposa Emily.
O que, segundo ele, não procede. "Eu e minha mulher moramos na Lapa e minha sogra e a irmã moram na Glória. A Emily morou lá até casarmos, mas agora vive na Lapa comigo", conta Leonardo. "Não é possível
que isso esteja acontecendo", lamenta.
Para fazer a reclamação é preciso preencher o formulário "Quero Conciliar Auxílio Emergencial" no site do TRF-2 ( https://www10.trf2.jus.br/conciliacao/auxilio-emergencial/).
Erro da Defesa garante o pagamento
Enquanto milhares amargam uma longa espera pelo auxílio emergencial e outros têm o benefício negado, mesmo se enquadrando nos requisitos do programa, 39,5 mil militares e 33,7 mil ex-militares das Forças Armadas estariam recebendo o auxílio emergencial de R$ 600 indevidamente.
O número representa quase a metade (46%) das "fraudes" identificadas em análise preliminar, realizada pela equipe técnica do Ministério da Defesa, divulgada no dia 12 de maio. Na verificação, a pasta informou que 73,2 mil auxílios de R$ 600 foram pagos a militares ativos, inativos, pensionistas e anistiados.
E isso pode ter prejudicado milhares de brasileiros, uma vez que o Ministério da Cidadania bloqueou mais de 1,3 milhão de CPFs com suspeitas de irregularidades. O Ministério da Defesa, comandado pelo general Fernando Azevedo Silva, admite as distorções que aconteceram durante o primeiro levantamento. Na ocasião, a pasta usou uma base de dados de março deste ano. "As distorções foram depuradas, chegando-se aos números atuais de 39,5 mil pagamentos indevidos", informou o Ministério da Defesa.