Por fabio.klotz
São Paulo - Guerrinha representa o projeto (e sucesso) de Bauru. Há seis anos, ele iniciou o planejamento do clube paulista e é o responsável pelo trabalho que acaba de ser coroado com o título do Campeonato Paulista. Um dos pilares do time é manutenção de peças-chave. Guerrinha, por exemplo, é o técnico no NBB com mais tempo no cargo. Ao todo, são 800 jogos como técnico do Bauru.
Após 14 anos%2C Bauru voltou a conquistar o título paulistaCaio Casagrande / Divulgação

"No Brasil, até pela cultura do futebol, há uma pressão por trocas de treinador e de jogadores. Aqui pensamos ao contrário. Buscamos a fidelização da comissão técnica e dos jogadores. Temos jogadores com cinco, seis anos de clube. Isso é muito difícil e até incomoda. Eu sou o único técnico que não foi trocado no NBB. Se está dando certo, por que trocar? Basquete se faz em equipe. Se você está dando certo, tem uma química boa, quanto mais tempo, melhor. Mudanças são importantes e necessárias, mas pontuais. Nós tentamos manter uma linha. Temos uma equipe atual, nova e para o futuro", explica Guerrinha, que lembra como iniciou o projeto em Bauru:

"Inicialmente, começou com uma empresa multinacional me procurando pois queria melhorar no mercado e via que o basquete seria um bom caminho. Então me convidaram para ser gestor e técnico. Montei todo o projeto, dentro e fora de quadra. A minha credibilidade ajudou. Então começamos, pouco a pouco, contamos com mais patrocinadores, sempre pensando em envolver a cidade, com projetos sociais, levando o time a todas as situações possíveis, hospitais, escolas, creches, eventos de patrocinadores. Temos conseguido coisas inovadores no basquete, como patrocínio de três anos com a Paschoalotto, temos bônus e muito profissionalismo."
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Em quadra, um dos sucesso de Bauru é a mescla de jogadores experientes, como Larry Taylor, Murilo e Fernando Fischer, com novos e talentos atletas, casos de Gui Deodato, Ricardo Fischer e Andrezão.
"O atleta tem um tempo de pico pela parte física. É importante mesclar jogadores novos com experientes. Até para ter um jeito moleque, para não ficar um time muito sério. Eles se dão muito bem. O time é muito amigo, com uma química muito grande."
Guerrinha colhe o sucesso do projeto de BauruCaio Casagrande / Divulgação

Gui Deodato já é uma realidade no Bauru. O ala-armador é um dos destaques do time. Aos 22 anos, conta com passagem pela seleção brasileira e desponta como um dos craques do futuro.

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"Gui tem um potencial incrível, um arremesso fantástico, é importante na defesa. Ele precisa melhorar passe e drible. Está evoluindo aos poucos, já chegou à Seleção. Precisa trabalhar a parte técnica. Ele não teve categoria de base, na qual tem este trabalho de fundamento. Então está aprendendo no adulto", elogia Guerrinha.
História como jogador ajuda
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Guerrinha não entra mais em quadra. Porém, usa toda a bagagem acumulada de seu tempo como jogador, foi armador, na função de técnico. Ele fez mais de 1.200 jogos na carreira. Com a Seleção, fez parte da histórica conquista da medalha de ouro no Pan-Americano de 1987.
"Tive o privilégio de aprender a parte acadêmica do basquete com Flávio Davis e Lula Ferreira, a parte tática e técnica. Eu trouxe para técnico a parte prática do técnico. É a história do boleiro que vira técnico. Em muitas situações de decisão como técnico, eu trago experiência como capitão do time, que fui por 15 anos de Franca e também da seleção brasileira, jogando em alto nível, Olimpíadas, Mundiais e Pan-Americanos", analisa.
Guerrinha na histórica medalha de ouro no Pan-AmericanoDivulgação

Um dos desafios de Guerrinha é saber lidar com a nova geração de jogadores, bem diferente da época em que atuava.

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"A parte tática, técnica, você se atualiza. É igual a andar de bicicleta. Vai aparecer uma com mais coisas, marcha, mas daqui a pouco você está no ritmo. É preciso saber lidar com a geração de hoje. Ela é mais positiva do que a nossa. A nossa respeitava muito, tinha hierarquia. Era difícil jogar contra Hélio Rubens, Edvar. Esta geração não respeita. É toda personalizada, cheia de si. Para eles, é normal jogar contra o Kobe Bryant. Por um lado é bom. Por outro, ela não tem limite, então você precisa impor limites. É um trabalho de grupo diferente da minha época, que era mais familiar, pessoal. Hoje é mais profissional."
Seleção como consequência
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O foco de Guerrinha é no Bauru. Ele evita traçar planos para o futuro fora do clube paulista, mesmo que seja uma eventual possibilidade de dirigir a seleção brasileira.
"Já contribuí muito com a Seleção, com 15 anos como atleta e seis como assistente-técnico. Foram 20 temporadas sem férias, só de doação. Cada um tem seu momento. A Seleção tem um grupo de trabalho muito legal. Pode não conseguir o resultado esperado, mas são bem-intencionados. Não trabalho pensando nisso. É algo que precisa surgir naturalmente. Se estiver pronto para isso, posso participar ou não. Meu foco é o Bauru", declara.
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O técnico não se esquiva de opinar sobre a presença de treinadores estrangeiros no país, prática cada vez maior. Neste NBB, o argentino Sergio Hernandez comanda o Brasília, o argentino Carlos Romano está à frente do Minas e o espanhol Paco García dirige o Mogi das Cruzes.
"É bom para mostrar aos que falam que os técnicos brasileiros estão defasados... Está aí o supercampeão (Hernandez) tendo o pior início de temporada com o Brasília. É bom para mostrar que todo mundo tem suas limitações. Ninguém é muito superior ao técnico brasileiro, que tem uma capacidade muito grande de trabalho, como o povo brasileiro, sendo criativo e enfrentando dificuldades. O basquete espanhol e argentino têm culturas diferentes. Jogam mais para não errar do que para acertar. O brasileiro arrisca muito mais. Por isso é difícil controlar a parte tática do jogo. Por outro lado, o contato com culturas diferentes favorece esta troca, intercâmbio nos jogos. É importante para os técnicos que não podem vivenciar este nível internacional."
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Evolução nacional
Guerrinha demonstra otimismo com o momento do basquete brasileiro, com a consolidação do Novo Basquete Brasil e também da Liga de Desenvolvimento do Basquete (LDB) para os jovens atletas.
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"Nunca o Brasil teve um momento tão bom como o de hoje. Nunca tivemos um campeonato de seis, sete meses. Antigamente, o Brasileiro durava um mês e meio. Hoje jogamos em turno e returno, com 17 equipes, mais estados envolvidos. Antigamente era Rio, São Paulo, Minas e eventualmente outro. Então o basquete vem sendo difundido. Temos a LDB. Na Espanha, eu fui lá, não existe. Tem apenas nos Estados Unidos. Em nenhum outro país há um campeonato com 22 equipes e cinco anos de projeto, desenvolvendo jogadores, técnicos, dirigentes e arbitragem. Temos grandes clubes, patrocinadores. Ainda tem coisas a melhorar, certamente, mas é o melhor momento do basquete brasileiro", analisa.