Por bruno.dutra

A importância exagerada das enquetes para a definição das rotas dos ativos está embrutecendo a brincadeira de comprar e vender dólares e contratos futuros de juros. A imensa maioria dos investidores não tem acesso privilegiado ao resultado das consultas. E os boatos que volta e meia pipocam nas mesas de operações, destinados a antecipar guinadas nos humores eleitorais, não costumam ser confiáveis. É difícil saber se refletem a realidade ou se prestam a plantar falsas pistas à condução da manada a uma emboscada.

A situação tornou-se aflitiva ontem por causa da discrepância entre as pesquisas anteriores do Datafolha e do Sensus, que não só apontavam a necessidade de realização de um segundo turno como indicavam um empate técnico entre Dilma Rousseff e Aécio Neves no dia 26 de outubro, e a publicada na noite de terça-feira pelo Ibope, segundo a qual talvez nem seja preciso haver um escrutínio adicional e, caso se tornasse indispensável, a vitória da presidente seria cabal. E agora, quem está certo?

Por causa dos riscos implícitos na confiança cega depositada na direção indicada por uma determinada pesquisa e da possibilidade de o investidor amargar perdas consideráveis em curto período de tempo, doravante as reações dos mercados podem não ser tão radicalmente otimistas ou negativas. Enquanto todos os institutos dedicados a perscrutar as intenções do eleitor não se alinharem num curso mais homogêneo, a cautela deve prevalecer. O principal perigo é de o investidor ficar tão inebriado com as sondagens que passe a operar desirmanado das tendências internacionais. Foi o que aconteceu ontem.

Dólar e juros futuros subiram sem fazer contato visual com as setas globais indicando a trilha oposta. Foi uma tentativa de correção das extravagâncias cometidas nos últimos dias em comemoração da certeza de que haveria um segundo turno e de que, nele, o senador tucano teria chances reais de empalmar o pleito. O mercado caiu na real ontem. Ainda é muito cedo para cultivar tanta confiança. Contrariando os ventos externos, o dólar só operou em alta ontem. Após três pregões em queda, durante os quais acumulou desvalorização de 2,08%, subiu 0,39%, cotado a R$ 2,2205.

Não só ignorou o viés global de queda como também relativizou a influência de duas informações positivas. A primeira foi a operação externa do Tesouro de troca de bônus com vencimentos mais curtos por títulos denominados em dólares com resgate em 2045. Ela se destina a melhorar o perfil da dívida e reduzir o seu custo, já que os novos bônus irão se referenciar numa curva de “treasuries” bem mais favorável ao país. Essa emissão soberana abrirá, como sempre ocorre, nova janela de oportunidade à colocação de títulos privados, ou seja, irá crescer a oferta de dólares no mercado interno.

A segunda foi o superávit de US$ 1,388 bilhão registrado na semana passada pelo fluxo cambial. Segundo dados divulgados ontem pelo Banco Central, as entradas foram liquidamente positivas tanto pela conta financeira (US$ 497 milhões) quanto pela comercial (US$ 891 milhões). O fluxo positivo na semana terminada no dia 18 serviu para reduzir a US$ 4,04 bilhões o saldo negativo acumulado no mês. No acumulado do ano a balança cambial mostra um pequeno superávit de US$ 108 milhões.

Como a força compradora de dólar não conseguiu ontem recuperar as perdas sofridas nas três sessões anteriores, o mercado sustenta a crença de que as últimas pesquisas Datafolha e Sensus podem estar mais próximas da verdade do que a sondagem do Ibope. Esse posicionamento algo otimista pode dispensar o BC de acelerar, nessa reta final do mês, a rolagem dos swaps cambiais que irão vencer no dia 1°. Ao ritmo de 7 mil contratos por dia, o BC já renovou até ontem US$ 4,557 bilhões do lote total de US$ 9,457 bilhões. Mantido o mesmo passo, levará ao vencimento – ou seja, fará uma compra de dólares no mercado futuro —, cerca de US$ 2,81 bilhões, o equivalente a 29,7% do montante integral.

Como o câmbio, o pregão de juros futuros da BM&F assumiu os riscos decorrentes de uma conduta autônoma, desvinculada tanto dos ditames externos quanto das notícias domésticas. O dia favoreceria novas baixas nos contratos futuros. As taxas dos títulos de 10 anos do Tesouro americano escavaram um pouco mais o fundo do poço, recuando de 2,46% para 2,45%. Não há clima de aperto monetário. Ontem o FMI reduziu a estimativa de crescimento dos EUA este ano dos 2% previstos em junho para 1,7%. O diagnóstico do fundo foi de que a ampla ociosidade na maior economia do mundo irá retardar o início da alta do juro.

Internamente, o DI passou por cima de mais uma queda na confiança da indústria e de novas revisões para baixo dos índices de inflação. A Sondagem da Indústria de Transformação da FGV apontou que este mês o Índice de Confiança da Indústria (ICI) tombou 3,2%, descendo ao menor patamar desde abril de 2009. E os grandes bancos, depois da alta de 0,17% registrada pelo IPCA-15 de julho, reduziram suas projeções para o índice fechado do mês. Enquanto o boletim Focus do BC sustenta estimativa de 0,22%, o Bradesco baixou a sua para 0,18%, e o Itaú para 0,12%. Mas os DIs trabalharam em alta por causa da frustração trazida pela consulta popular do Ibope.

A taxa para a virada do ano subiu de 10,72% para 10,74%. O contrato com vencimento em janeiro de 2016 avançou de 10,90% para 10,95%. E, para janeiro de 2017, de 11,05% para 11,14%. Mas os juros ainda estão longe dos níveis em que estavam na quarta-feira – de 10,77%, 11,05% e 11,36%, respectivamente – horas antes de o Copom supostamente sinalizar, por meio da manutenção da advertência “neste momento”, a possibilidade de queda futura da Selic. A ata deste encontro, que será publicada hoje cedo no site do BC, vai esclarecer se a interpretação do mercado estava correta ou não. Os juros futuros despencaram antes da divulgação das pesquisas Datafolha e Sensus. Não dá portanto para atribuir só a elas o desabamento da curva. A maior parte da responsabilidade ainda é do entendimento suscitado pela nota pós-Copom.

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