Por monica.lima

Falta uma semana para a presidente Dilma Rousseff anunciar sua nova equipe econômica. Os nomes dos futuros ministros da Fazenda e do Planejamento, do secretário do Tesouro e do presidente do Banco Central devem ser conhecidos após o retorno da comitiva presidencial que participará, no próximo fim de semana, da reunião de cúpula do G-20. Para o mercado, serão cinco dias de muita tensão e expectativa. Como nos momentos mais críticos das eleições, boatos e vazamentos rondarão as mesas de operações.  Mas os investidores não devem abandonar a postura cética que prevaleceu na semana passada. Os mercados de câmbio e juros simplesmente não acreditam que Dilma fará um segundo mandato substancialmente diferente do que foi o primeiro.

Exemplo eloquente do ceticismo foi dado pelo comportamento do dólar na sexta-feira. Apesar das enfáticas garantias de que o governo está disposto a cortar gastos públicos, não apareceram os vendedores de moeda americana. A entrevista da presidente Dilma na tarde de quinta-feira e a do ministro Guido Mantega na manhã de sexta foram entendidas como um movimento unicamente orquestrado para acalmar o câmbio, após a moeda ter acumulado valorização de 6,35% em apenas cinco dias. Não deu muito certo. Na sexta, nova alta. Embora pequena, de apenas 0,11%, com a moeda cotada a R$ 2,5634, mostra que o mercado persiste descrente.

Mas por que as juras de ortodoxia econômica não surtiram efeito? Dilma e Mantega falaram o que o mercado queria ouvir — corte pesado de despesas, modificações em importantes plataformas sociais (seguro desemprego, abono salarial e pensão por morte), redução de subsídios e atuação mais discreta e menos dispendiosa dos bancos oficiais. Em seus blogs pessoais, alguns economistas liberais voltaram a acusar o governo de “estelionato eleitoral”: Dilma irá baixar exatamente as medidas que, para se reeleger, condenou no programa do seu adversário. Tais acusações são um desperdício de tempo porque, para o mercado, o estelionato não irá se consumar. Para se consumar, o discurso austero teria de se transformar em providências concretas.

Analistas acreditam que está se vivendo agora um dèjá vu da pantomina fiscal encenada em fevereiro, durante a qual foi firmado compromisso solene e inarredável de se entregar este ano um superávit primário equivalente a 1,9% do PIB, com o fim específico de evitar que a agência S&P rebaixasse o rating brasileiro. Não foi convincente, e a classificadora reduziu a nota menos de um mês depois. O curioso foi que nos dias seguintes ao anúncio da nova meta o mercado acreditou. Não está agora disposto a incorrer na mesma boa-fé.

Por que o mercado está tão desconfiado e arredio? O motivo é que Dilma e Mantega estão fazendo promessas de austeridade fiscal e monetária como se ambos ainda fossem comandar a economia a partir de 2015. O ministro não irá, mas fala como se fosse continuar na Fazenda. E a presidente fala como se não estivesse disposta a afrouxar a rédea do controle estrito dos assuntos econômicos. Um pesado ar de velório permeou as mesas de operações na sexta-feira. A impressão foi de que a nova equipe econômica, mesmo que recheada de nomes apoiados pelos investidores, já assumirá enfraquecida, sem autonomia para fazer o ajuste defendido pelo mercado — um ajuste que não se restringe aos temas macroeconômicos (fiscal, monetário e cambial), mas avança por reformas modernizantes e o fim das intervenções governamentais nos setores produtivos.

O mercado não quer uma nova agenda de compromissos se esta for formulada por quem perdeu a credibilidade. Quer uma equipe econômica liberal-ortodoxa com independência para agir. O mercado ainda sonha em ganhar o terceiro turno das eleições, como aconteceu em 2003. Os executivos mais experientes alertam que, com Dilma, isso simplesmente não acontecerá. Um indício de que Dilma continua sendo a Dilma de sempre está sendo fornecido, segundo eles, pela sua teimosia em não definir e anunciar logo o novo ministro da Fazenda: está fazendo questão de submeter o mercado ao seu calendário pessoal. Resultado idêntico se obtém pelo emprego do raciocínio inverso: ela só estaria adiando o anúncio para não passar a impressão de estar se vergando ao calendário do mercado.
Restará ao mercado aceitar o fato de que perdeu as eleições de 2014. Mas a aceitação não implica em resignação, muito menos em capitulação. Pelo contrário, significará bombardeio direto e contínuo. Passará a exigir todos os dias que o governo aja, sob pena de retaliação, pragmaticamente. Nos últimos seis dias úteis, de 31 de outubro a 7 de novembro, o dólar subiu 6,46% mesmo em meio a um fluxo cambial positivo. O nome disso é coação. Na definição sucinta e primorosa do Houaiss: “Constrangimento, violência física ou moral imposta a alguém para que faça, deixe de fazer ou permita que se faça alguma coisa”.

O mercado não admite que há uma boa e uma má política desenvolvimentista, ou novo-desenvolvimentista ou social-desenvolvimentista. Qualquer versão desta política é um equívoco colossal. Não é possível corrigir o que deu errado no primeiro mandato de Dilma mantendo-se as mesmas matrizes desenvolvimentistas. Não é uma questão de ajuste fino das políticas sociais, de um pouco menos de concessão de subsídios aqui ou ali, da diminuição ou eliminação localizada de alguma desoneração tributária ou de reorientação menos intervencionista dos esforços industriais. Não é uma questão de trocar um mau gestor desenvolvimentista ou por bom gestor desenvolvimentista. O mercado prefere um péssimo liberal-conservador a um excelente desenvolvimentista. É por isso que, informalmente, analistas comentam que a troca de Guido Mantega por Nelson Barbosa não autoriza, essencialmente, nenhuma celebração. Para segmentos petistas e simpatizantes, se não adianta mais à presidente fingir que está jogando segundo as regras do mercado, só lhe resta afrontá-las de vez. No mundo financeiramente globalizado, não dá. Precisaria antes fechar a conta de capitais do balanço de pagamentos. Caso contrário, as reservas cambiais de US$ 380 bilhões irão se vaporizar. O confronto irá trazer o pior dos mundos. O único caminho é aquele traçado no dia 26, o do diálogo franco e honesto.

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