Por marta.valim

Um ano após o fato relevante que implodiu qualquer esperança de recuperação da petroleira de Eike Batista, a percepção no mercado é que pouca coisa mudou no sentido de proteger investidores de nova crise semelhante à vivida pelo grupo X, que trouxe prejuízos a pequenos acionistas, em particular, e à imagem do mercado acionário brasileiro, em geral. Com a derrocada da principal âncora dos negócios de Batista, as empresas X, a maior parte sob nova gestão, continuam lutando para sanear as finanças e sofrendo reflexos na bolsa. Desde 1º de julho de 2013, quando a então OGX (hoje, OGPar) declarou a inviabilidade de três projetos, as companhias listadas em bolsa perderam R$ 5,34 bilhões em valor de mercado.

A perda seria maior se não fosse a capitalização recente da Prumo (ex-LLX), que teve ganho de R$ 1,2 bilhão em seu valor de mercado, segundo cálculos feitos pela Economática a pedido do Brasil Econômico. O mau desempenho é reflexo das descrença de investidores com relação ao futuro das operações, mesmo que grandes companhias como a Eneva (ex-LLX) e a própria Prumo tenham passado para as mãos de novos controladores, em operações que reduziram a participação de Eike na gestão. Todas as ações do grupo valem hoje menos de R$ 2 — ou menos de 10% da máxima de R$ 23 atingida pela OGPar nos tempos de bonança.

No mercado, a avaliação é que as perdas dos investidores minoritários — que alegam ter sido ludibriados pela grande exposição de Batista na imprensa e em redes sociais — ainda não se mostraram suficientes para mobilizar os reguladores para prevenir problemas semelhantes. A única mudança relevante, dizem especialistas, foi a alteração na composição do principal índice da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), distorcido na maior parte de 2013 pelo grande peso conferido aos papéis da OGX. “Do ponto de vista legal, ainda não houve avanços, mas espero medidas após a conclusão dos processos contra o Eike”, diz um investidor.

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) tem hoje nove processos sancionadores contra administradores das empresas do grupo EBX, de Eike Batista. Além disso, há outras 13 investigações que poderão evoluir para sancionadores ou serem arquivadas. Entre os sancionadores, Eike é acusado de atuar em “insider trading” na OSX e na OGX e por não ter divulgado fato relevante em um episódio envolvendo a MPX. A omissão em divulgar informações é a base para os outros processos sancionadores, envolvendo LLX, OGX e CCX, em que Eike é acusado ao lado de executivos das companhias.

Para os acionistas minoritários, que apostaram na pujança das empresas do grupo X, as perdas foram catastróficas. “Calculo, por alto, um prejuízo de cerca de US$ 30 bilhões, somente na OGX”, afirma o conselheiro da Associação Nacional de Proteção aos Acionistas Minoritários, Aurélio Valporto. Ele critica inclusive a CVM por omissão e negligência em relação ás informações divulgadas e acusa Batista de camuflar a verdadeira situação da empresa. “As ações foram mantidas artificialmente elevadas no mercado”, reforça. Em um dos casos, há indícios de que Eike sabia da inviabilidade dos campos de Tubarão Tigre, Tubarão Gato e Tubarão Areia meses antes da divulgação do fato relevante sobre sua inviabilidade.

Investidores defendem maior controle sobre a divulgação de expectativas e projeções de empresas abertas — Eike era um usuário assíduo do Twitter, onde costumava comentar negócios de suas empresas. Para Valporto, o Brasil precisa adotar uma legislação no mercado de capitais similar a dos EUA, onde a lei Sarbanes-Oxley foi promulgada para evitar o esvaziamento dos investimentos financeiros e a fuga dos investidores causada pela aparente insegurança a respeito da governança adequada das empresas. “É um passo fundamental para dar credibilidade a um mercado que precisa ser moralizado. O número de empresas abertas brasileiras é medíocre, perde para países como a Mongólia”, conclui.

Atualmente, a mineradora MMX tem sido a mais penalizada no mercado, que tem dúvidas com relação à capacidade da empresa em encontrar sócios para seu principal projeto, de exploração de uma mina de minério de ferro na Serra Azul, em Minas Gerais. A empresa anunciou também que busca um comprador para sua mina em Corumbá (MS). Controlada pela alemã E.ON, a Eneva enfrentou problemas com o atraso no início da operação de uma de suas usinas, em um momento de preços recordes da energia no mercado de curto prazo, e anunciou recentemente novo aumento de capital, para garantir suas operações.

Operadora do Superporto do Açu, a Prumo realizou aumento de capital ainda no final de 2013 para cumprir os investimentos planejados e hoje conta com a Petrobras para transformar suas instalações em um grande polo de serviços para o pré-sal — a estatal recebe no fim do mês propostas de licitação para a implantação de sua nova base de apoio às plataformas em alto mar, com boas chances para o Açu. Entre as que continuam sob o controle de Batista, OGX e OSX encontram-se em recuperação judicial — a primeira com mais chance de sair do processo, ainda que bem menor do que o tamanho sonhado por Eike.

Crise teve início com retirada de blocos de rodada

O oba-oba e problemas de governança corporativa tiveram papel fundamental, mas nos bastidores do setor de petróleo, a decisão do governo de retirar blocos do pré-sal da 9º Rodada de Licitações da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) é tida como o estopim para a crise das empresas para o grupo X. A petroleira do grupo, então chamada OGX, foi criada pouco antes do leilão e vendida ao mercado internacional como uma alternativa à Petrobras na busca por reservas na maior província petrolífera brasileira.

O golpe de misericórdia se deu 40 dias antes do leilão, quando o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) decidiu excluir da lista de ofertas 41 blocos próximos ao campo de Lula, primeira descoberta gigante do pré-sal, alegando que a região poderia ter muito mais petróleo do que o estimado anteriormente — na ocasião, a então ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, falou em “preservar o interesse nacional. Entre as áreas, estão as que mais tarde viriam a ser Libra e Franco, as duas maiores descobertas brasileiras de petróleo.

Com o bolso cheio, a OGX acabou sendo o grande destaque do leilão, desembolsando R$ 1,5 bilhão para a aquisição de 21 blocos exploratórios. Foi dela o maior lance oferecido até então por uma concessão petrolífera no país: R$ 344 milhões por uma área na Bacia de Santos. Mas o dinheiro não foi gasto onde Batista queria e, sim, em áreas que, soube-se mais tarde, estavam longe de apresentar potencial parecido ao vendido pelo empresário aos investidores.

Nem a expertise de executivos contratados a peso de ouro na Petrobras permitiu a transformação das expectativas em realidade. Hoje, apenas duas das concessões marítimas da empresa estão em operação e, mesmo assim, com volumes de produção inferiores aos projetados inicialmente.

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