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'Esquerda da frente ampla saiu fortalecida no Uruguai', diz cientista político

O professor da Unirio Guilherme Reis diz que com a eleição de Tabaré Vásquez a condução das políticas econômicas e sociais não deve mudar muito com relação ao governo Pepe Mujica

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'Esquerda da frente ampla saiu fortalecida no Uruguai', diz cientista político

O professor da Unirio Guilherme Reis diz que com a eleição de Tabaré Vásquez a condução das políticas econômicas e sociais não deve mudar muito com relação ao governo Pepe Mujica

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A FA manteve a maioria no legislativo, mas esta será a menor bancada dos seus três mandatos. Porque isso aconteceu?

A vantagem da Frente Ampla foi maior durante o primeiro mandato de Tabaré Vázquez, que havia vencido no primeiro turno. No Uruguai, a votação para o Senado e para a Câmara de Representantes é atrelada ao voto para presidente. Lá não é possível votar em um partido para presidente e no grupo adversário para deputado ou senador, como fazemos no Brasil. Então, se um candidato a presidente vence no primeiro turno, necessariamente ele terá maioria parlamentar. A Frente Ampla conseguiu maioria apertada em 2009 e, agora, em 2014 porque, mesmo não vencendo no primeiro turno, chegou muito perto disso.
Apesar do sucesso no exterior, se comenta no Uruguai que Mujica avançou nas liberdades civis, com a regulamentação da maconha e do aborto, mas não fez o mesmo com relação às reformas de base, como a agrária…

É impressionante o quanto Mujica conseguiu avançar nas liberdades civis. Acrescente aí ainda os casamentos homossexuais. Isso tende a pôr o resto à sombra. Ao mesmo tempo, como as conquistas de teor mais econômico foram profundas com Vázquez na Presidência, visto que havia muito o que mudar em relação ao modelo anterior, de caráter neoliberal, avançar mais fica mais difícil agora. Acho essa crítica, muito comum, bastante injusta. Mujica tentou implementar um novo imposto sobre o agronegócio, mas a Suprema Corte o declarou inconstitucional. Além disso, em 2010, ele criou o Fundo para o Desenvolvimento (FONDES), para apoiar empreendimentos com a participação dos trabalhadores na direção e no capital das empresas. Isso é autogestão, é um passo rumo ao socialismo, não é pouca coisa. Ele incentivou que essa fosse a solução dada, por exemplo, para a empresa de aviação Pluna, que havia falido.

Outros questionamentos ao governo Mujica dizem respeito à Educação e à Segurança, que viu os índices de criminalidade aumentarem. Podemos esperar maior atenção do novo governo a estas áreas?

Sim, foram os pontos fracos do governo Mujica. A direita tentou explorá-los. O líder do Partido Colorado, Pedro Bordaberry, filho do ex-ditador Juan María Bordaberry, tentou não apenas debilitar o governo como também apontar como solução para o problema a redução da maioridade penal. Não funcionou. Os uruguaios apoiaram a posição da FA e rejeitaram a medida em plebiscito. Na eleição legislativa, o Partido Colorado teve votação magra, o que inclusive enfraqueceu a liderança interna de Bordaberry.

A que você atribui a boa acolhida da sociedade uruguaia a medidas progressistas?

A população uruguaia é realmente mais politizada e menos influenciada por questões religiosas do que a brasileira, por exemplo. E a FA tem mais força lá do que a esquerda do Brasil para politizar tais questões. Mas não podemos idealizar o Uruguai como um mar de rosas. Incrivelmente, a população uruguaia rejeitou por duas vezes em plebiscito a derrubada da Lei da Caducidade, que prescreve os crimes cometidos pela ditadura no país.
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Tabaré anunciou, em campanha, que uma prioridade será a regulamentação da mídia uruguaia. Isso contribui para uma tendência continental, por suceder a “Lei de Meios” argentina?

O cenário se repete nos diferentes países da região. Há uma mídia majoritariamente conservadora, cujo noticiário acaba se tornando enviesado, tanto pelos temas que repercute como pelos problemas e virtudes que escolhe destacar. No Brasil isso é mais grave, pois há uma concentração ainda maior em poucas empresas. Ainda, assim, acho saudável que o Uruguai aprove essa lei, que tem semelhanças com outras na Europa e em outras partes do mundo. Seria muito bom que a presidente Dilma conseguisse fazer o mesmo, mas a correlação de forças no Congresso, inclusive com muitos parlamentares ligados a empresas do setor, tornam a meta difícil.
Mujica disse, à época das eleições no Brasil que, para o Uruguai, o resultado do nosso pleito era tão ou mais importante que a própria eleição uruguaia , se referindo a cooperação no cone sul. Como isso acontece em termos práticos?

A eleição no Brasil é extremamente importante para toda a América do Sul. Existe um efeito de contágio: tivemos a era neoliberal, depois a onda de vitórias de esquerda. A vitória de Dilma fortaleceu bastante a continuidade da esquerda no poder nos países vizinhos, assim como uma eventual derrota para o PSDB daria novo ânimo às candidaturas de direita. No caso uruguaio, em particular, a reeleição de Dilma era fundamental para eles. A economia uruguaia é pequena e, portanto, muito afetada pelo que ocorre na Argentina e, de forma crescente, no Brasil. Mujica sempre disse que a produção uruguaia deveria ser complementar à brasileira. Ele sabe que o país não tem como ser autossuficiente e ganha com a parceria. Aécio Neves, por sua vez, sempre tratou a política externa dos governos petistas como enviesada pela ideologia e equivocada por se desviar do que era feito antes, do que seria o “tecnicamente neutro e correto”. Aécio declaradamente pretendia esvaziar ou extinguir o Mercosul, acabar com a ênfase nas relações Sul-Sul e voltar ao alinhamento com os Estados Unidos e a Europa. Uma virada tucana seria catastrófica para o Uruguai.
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Colaborou o estagiário Gabriel Vasconcelos
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