No setor de logística e de transportes, a rapidez é um dos fatores cruciais. Em muitos casos, poucos minutos podem fazer uma enorme diferença entre a entrega de um bom serviço e a má reputação perante os clientes. Um desafio diário das empresas do setor, o tempo, no entanto, foi um aliado da TNT Mercúrio, operação brasileira de cargas e encomendas expressas da holandesa TNT Express. Dezoito meses após ser colocada à venda, a subsidiária acaba de atingir - pela primeira vez em oito anos de atuação no país - seu ponto de equilíbrio. Passado o período de incertezas e desfeitos os planos de venda da operação, a TNT Mercúrio está traçando agora uma nova rota de crescimento no mercado brasileiro.
“O mar agora está mais calmo. Saímos de uma empresa que perdia R$ 5 milhões por semana para uma operação que, hoje, registra seguidos ganhos semanais”, diz Cristiano Koga, diretor-executivo da TNT Mercúrio. “Investimos muito no país no decorrer desses anos e, agora, queremos recuperar esse investimento. As perspectivas são muito positivas. Mesmo em meio a uma economia que cresce de forma bem limitada”, afirma.
Essa nova perspectiva pode ser explicada nas entrelinhas do resultado global da TNT Express, que será divulgado hoje, com dados do do acumulado do ano. No primeiro semestre, a TNT Mercúrio apurou uma receita de R$ 453 milhões, alta de 13,2% sobre igual período de 2013. O número a ser comemorado, porém, é o lucro líquido de R$ 1 milhão, ante um prejuízo de R$ 40 milhões, há um ano. “A projeção é encerrar 2014 com uma boa lucratividade e expansão da receita. Tradicionalmente, a maior fatia do consumo acontece no segundo semestre. Nos últimos cinco anos, 65% da nossa receita total ficou concentrada nesse período”, observa.
Presente há mais de três décadas no Brasil, por meio de um pequena operação no segmento courier – de encomendas internacionais -, a TNT Express decidiu investir em uma operação efetiva no mercado local em 2007, como reflexo de uma estratégia de expansão para mercados emergentes, que incluiu ainda a China e a Índia. A criação da TNT Mercúrio teve como apoio as aquisições da Expresso Mercúrio e da Expresso Araçatuba.
Em 2012, a TNT Express passou a buscar alternativas para sobreviver diante da concorrência em seu mercado global. Uma das opções foi a proposta de compra de todos os seus negócios pela rival UPS, por US$ 6,2 bilhões. Com o acordo vetado por órgãos europeus, a TNT Express decidiu se desfazer de seus ativos em mercados emergentes. “O fato de a TNT Mercúrio nunca ter dado retorno para a matriz só agravou esse cenário. Tivemos muitos percalços no processo de integração das aquisições”, explica Koga.
Assim, a TNT Mercúrio deu início a um plano de recuperação. Além de arrumar a casa para atrair potenciais investidores e fundos de investimento nacionais ou do exterior, a ideia era reduzir a dependência da matriz holandesa, que continuava a destinar recursos para a subsidiária.
Um dos primeiros focos foi qualificar a base de clientes. A TNT Mercúrio deixou de atender clientes que não geravam rentabilidade. Ao mesmo tempo, contratos foram renegociados e a empresa passou a cobrar tarifas adicionais de frete em determinados serviços.
O segundo pilar foi a redução de custos. Um dos alvos foram as aquisições realizadas. “As tão famosas sinergias não aconteceram. Tínhamos muita sobreposição de cargo nas nossas filiais. Decidimos, então, redimensionar esse escopo”, diz Koga. Como resultado, a TNT Mercúrio demitiu 1,3 mil colaboradores. Hoje, a empresa conta com 7 mil funcionários.
Em busca de maior eficiência nos processos de cross-docking — transferência de carga em suas unidades —, a empresa também investiu em tecnologias de automação em 32 de suas 126 filiais, por meio de sistemas conectados a esteiras rolantes que permitem gerenciar o recebimento e a distribuição das cargas. A terceirização da frota em rotas nas quais a demanda não compensava o custo complementou a estratégia de custos.
A melhora do fluxo do caixa foi outro pilar. A TNT Mercúrio renegociou prazos com fornecedores e clientes. E como reforço a todas essas estratégias, a empresa ampliou a estrutura de suas filiais em Belém, Maceió, Natal, Recife, Uberaba e Dourados, com o objetivo de atender à expansão do consumo nesses centros.
Todas essas iniciativas geraram bons frutos. Mais que a receita de R$ 870 milhões ao fim de 2013, o que saltou aos olhos foi a redução do prejuízo de R$ 250 milhões, em 2012, para R$ 70 milhões no período. Diante desses números, a TNT Express desistiu da venda da TNT Mercúrio, dando à subsidiária um destino diferente de seus pares na China e na Índia, que foram vendidas.
Com a página virada, a TNT Mercúrio está concluindo um novo plano para os próximos três anos. “Temos uma meta de investir pelo menos 3% da receita. Muitas das ações já estão em execução. O que vamos fazer agora é intensificar essas iniciativas”, diz Koga.
Com o objetivo de combinar operação eficiente com qualidade dos serviços, a nova etapa passa pelo reforço dos investimentos em tecnologia. Um dos focos é ampliar o projeto pelo qual os motoristas, munidos de smartphones, conseguem dar a baixa digital de uma entrega, o que aprimora a gestão, em tempo real, pelos clientes. A empresa também vai estender os investimentos em automação de cross-docking a todas as suas filiais, bem como os aportes em tecnologias de GPS e gestão de risco, para reduzir as vulnerabilidades associadas ao roubo de cargas.
A renovação da frota é outra prioridade. “Queremos renovar toda a nossa frota em 4 anos”, diz Koga. Hoje, a empresa tem 1.850 veículos próprios e um total de 4 mil veículos, incluindo terceirizados. A idade média dessa frota é de 6,5 anos. Em curto prazo, a ideia é reduzir esse índice para 3 anos.
A especialização em categorias de alto valor agregado e a definição de rotas que integrem as coletas e entregas de diversas empresas de um mesmo setor também serão fortalecidas. As prioridades são os segmentos automotivo; farmacêutico/cosméticos; tecnologia; e calçados e confecções. Nessa última área, um dos esforços que começam a ser costurados é o atendimento a grandes redes para a entrega de produtos em shopping centers.
A descentralização do consumo também está em foco. “Nosso volume transportado para o Norte, Nordeste e Centro-Oeste cresce 45% ao ano, enquanto nas regiões Sul e Sudeste, esse número é estável”, explica Koga. Com 5 mil pontos de entrega no país, a empresa avalia a melhor forma para acompanhar essa demanda. A ampliação da estrutura de filiais e os acordos com parceiros para a entrega da chamada última milha são as opções.
Em contrapartida, essa descentralização traz um dilema . “Há um desequilíbrio na minha malha, pois esses caminhões sobem cheios até essas regiões, mas voltam vazios para São Paulo, o que amplia nossos custos”, afirma. Uma das alternativas já adotadas é o aproveitamento do retorno do frete para o transporte de cargas que são comuns nessas regiões, como minérios e commodities.
A empresa tem iniciativas pontuais para atender ao comércio eletrônico, um segmento que vem atraindo outras rivais. “No Brasil, os custos para atender esse setor são altíssimos. Imagine entregar um produto numa fazenda a 2,5 mil quilômetros de distância”, explica. Dessa maneira, a abordagem nessa frente é buscar acordos com a limitação de área de entrega e perfil de carga – de até 30 kg – restrita a produtos de maior valor, como tablets, smartphones e calçados.