Por bruno.dutra

Foi a primeira condenação do Ministério da Justiça a uma operadora de telefonia devido à invasão de privacidade. Uma punição emblemática e que serve de alerta a todo o mercado. E foi dada em muito boa hora, pois estamos à porta de uma recessão econômica, momento em que o consumidor é caçado a laço para contribuir com o modelo de crescimento pelo consumo, e bombardeado pelo marketing.

Só para lembrar do episódio, o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), do Ministério da Justiça, em 2010, recebeu denúncias de que o software Navegador, nascido de uma parceria entre a Oi e a empresa britânica Phorm, oferecido aos consumidores como um serviço que melhoraria a navegação do usuário, na verdade, mapeava o tráfego de dados do consumidor na internet. O objetivo era compor o perfil do cliente, que era comercializado com anunciantes, agências de publicidade e portais na internet, para que fossem oferecidas publicidades personalizadas para esses consumidores.

O serviço já foi suspenso pela Oi e esta é uma multa administrativa, ou seja, não vai ser paga. De um modo geral, as empresas não pagam e recorrem à Justiça até a última instância, o que demora anos. Enquanto isso, continuam aprontando. Olhando assim, parece que é uma perda de tempo multar estas infrações. Mas, apesar da morosidade do processo e da ineficiência financeira da multa, para o consumidor fica um gostinho de que não dá para esconder as más práticas, o tempo todo, de todo mundo.

O consumidor se revolta de saber que as empresas sempre se dão bem com a má fé, com a falta de informação ao cliente, com a falta de transparência na venda e na prestação do serviço. E quem se sente enganado pela empresa, em qualquer tipo de problema, gostaria de vê-la pagar pelos seus erros, com uma punição que a fizesse desistir de continuar por este caminho. E mesmo achando que a punição “não vai dar em nada, como tudo neste país”, tenho certeza de que, para o consumidor, uma empresa ser multada por um mal que estava fazendo a muitos, é um sinal de alerta para tomar mais cuidado nas suas próprias ações de consumo.

Voltando à questão principal, da violação à privacidade, o software registrava o perfil de navegação do usuário, o seguia por todos os lugares que ele fuçasse na internet, e não apenas o que comprava. A Oi negou que tenha havido violação de privacidade de seus clientes e que a ferramenta só foi utilizada, por pouco tempo, por um grupo restrito de clientes convidados a testar o produto. Mas, foi dado o sinal de alerta. A potencialidade de risco da comercialização dos dados dos consumidores ficou muito clara.

Na verdade já sabemos que grande parte de nossos dados financeiros são compartilhados pelas instituições financeiras. E são rapidamente acionados e trocados. Lembro-me que, quando me aposentei, recebi, no mesmo dia, a carta do INSS atestando a aposentadoria e uma ligação de um banco me oferecendo crédito consignado. Que eficiência para vender! Gostaria de ter esse atendimento imediato quando estou com problemas com os bancos.

Os bancos de dados das listas dos maus pagadores ou dos bons clientes são os mesmos e compartilhados por todas as instituições. Já existem softwares que analisam o potencial de crédito do consumidor por sua navegação. A questão é até onde estas informações chegam. Os bancos, para a segurança do sistema e venda de serviços, monitoram a movimentação bancária dos clientes e trocam estes dados entre si. No entanto, não podem comercializar as informações sobre o perfil de compra dos seus clientes.

O DPDC alerta ainda para a catalogação de informações sensíveis dos consumidores, como o fato de terem alguma doença, ou sua orientação sexual, por exemplo. Como ter certeza de que estes dados não estejam nos bancos de dados? A questão principal da privacidade de dados na internet é como as empresas podem utilizar os dados que coletam na web sem ferir a proteção à individualidade do consumidor. O Comitê Gestor da Internet no Brasil define princípios fundamentais como a neutralidade da rede, mas ainda é necessária a criação de regras para garantir a restrição de uso das informações e o acesso do consumidor aos seus dados, guardados nestes bancos, direito também previsto no Código de Defesa do Consumidor.

Então, neste sentido, a multa do DPDC, do Ministério da Justiça, é histórica e emblemática. Lembra-nos que estamos em um novo tempo e que a internet veio para o bem e para o mal. Se nos ajuda, também pode nos prejudicar. Se não é possível confiar em tudo o que está na rede, menos ainda devíamos confiar em espalhar nossos dados na internet. É difícil evitar, mas precisamos ter cuidado. Nossos dados são a nossa vida. E, por enquanto, colocar nossa vida na internet é colocar fatos em “bocas de Matilde”, nunca saberemos onde podem parar.

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