Por julia.sorella

Niterói - Pincipal produtor pesqueiro do país até a década de 1980, quando a produção do pescado começou a cair, o Estado do Rio quer voltar a ser o primeiro do setor. E a busca pelo topo desse ranking já começou com a criação da Cidade da Pesca, um complexo de 630 mil metros quadrados que será construído no bairro de Itaoca, em São Gonçalo. A área é equivaente a 15 Campos de São Bento.

O projeto vai gerar mais de 10 mil empregos diretos e pretende aumentar a produção do pescado, criar trabalho e renda e diminuir a distância entre a matéria-prima e o consumidor. São Gonçalo e Niterói, juntas, já responderam por mais da metade do escoamento de produção de sardinho do país.

A previsão do governo do estado, responsável pelo complexo pequeiro, é que a Cidade da Pesca comece a operar em três anos. No local, será construído um terminal para escoar a produção e lá ficarão as empresas que vão cuidar do pescado, desde seu desembarque até o transporte para outros estados. Esse trabalho hoje é feito em Santa Catarina. Ou seja, o peixe sai do Rio e volta.

Vista de Itaoca%2C que abrigará a Cidade da PescaAlexandre Vieira / Agência O Dia

“Não temos um parque industrial para esse tipo de produto e, consequentemente, não temos capacidade de processamento e nem de estoque. A ideia da Cidade da Pesca é criar um ecossistema de serviços privados com beneficiamento, frigorificação, estocagem e aproveitamento das partes dos pescados”, explicou o subsecretário de Desenvolvimento Regiona, Abastecimento e Pesca (Sedrap) de São Gonçalo, Carlos Krykhtine.

A Cidade da Pesca pode ser considerada um dos legados do Comperj. É que Itaoca foi escolhida para abrigar o complexo pesqueiro por ter ligação com o Arco Metropolitano e a BR-101, acessos abertos pela Petrobras para transportar grandes peças para a montagem da refinaria.

Além das vias por terra, o pier montado pela Petrobras, com um canal de mais de dois quilômetros, permitirá a navegação de embarcações destinadas à pesca industrial. “Isso ficaria como legado depois das obras. Então resolvemos aproveitá-lo. Os acessos facilitarão muito o escoamento da produção”, disse o subsecretário.

Como será o complexoArte%3A O Dia

Segundo ele, 15 empresas já apresentaram propostas para se instalar no local. Juntas, vão formar o Condomínio Industrial Pesqueiro Sustentável. O subsecretário espera que, após a Copa do Mundo, as propostas comecem a ser analisadas e, até o fim do ano, encaminhadas para aprovação do governo do estado.

No entanto, um protocolo de intenções já foi assinado com duas indústrias que farão parte do complexo: a Crusoe Foods e o Estaleiro Tecnológico de Itaoca (Esteit).

A primeira tem sede no Chile e está em outros 22 países do continente, além do Brasil. A Crusoe pertence à holding espanhola Jealsa-Rianxeira, primeira da Espanha, segunda da Europa e quinta do mundo no segmento de conserva de pescado. A empresa será âncora da Cidade da Pesca, ocupando 100 mil metros quadrados.O investimento da multinacional será de cerca de R$ 60 milhões, gerando 1.500 empregos diretos, a maioria para mulheres. Já Esteit vai oferecer 600 vagas.

Em abril, um decreto publicado no Diário Oficial autorizou a desapropriação de uma área de 50 mil metros quadrados na Praia da Beira para a construção do Terminal Pesqueiro Público do Estado do Rio de Janeiro (TPP). A Sedrap garantiu dará assistência às famílias que tiverem que deixar o local. O empreendimento vai gerar, aproximadamente, 300 empregos.

A Cidade da Pesca é um projeto da Sedrap com a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico, Energia, Indústria e Serviços, Companhia de Desenvolvimento Industrial do Estado do Rio e Prefeitura de São Gonçalo.

Pesca Artesanal

A pesca artesanal não ficou fora do projeto. Paralelamente à construção da Cidade da Pesca, a Sedrap promove ações nas colônias de pescadores, através do <MC0>Programa de Revitalização de Comunidades Pesqueiras. As colônias do Gradim, em São Gonçalo, e de Jurujuba e Itaipu, em Niterói, serão beneficiadas. Hoje, por sinal, essas comunidade festejam São Pedro, padroeiro dos pescadores.

Segundo um dos diretores da colônia de Jurujuba (Z-8), Ademir José dos Santos, de 68 anos, os projetos para melhorias na área já estão quase definidos. “Mas são só projetos. Ainda estão no papel. Muitos já passaram aqui prometendo coisas que nunca foram feitas, mas estamos conversando”, conta ele, que é pescador há 43 anos.

Abertura de ruas e ampliação do cais estão entre as reivindicações dos profissionais.Ademir espera mais do que dobrar a produção se as reformas se concretizarem. Segundo ele, com a estrutura de hoje, os pescadores conseguem descarregar dois caminhões de peixes por dia, formando um total de 200 toneladas de pescado por semana.

“Se o pier for ampliado, teremos capacidade para descarregar sete caminhões”, planeja.

Bolinha reclama da falta de estrutura para escoar a produçãoAlexandre Vieira / Agência O Dia

Não é conversa de pescador: eles gastam muito com frete

A falta de estrutura para escoar melhor a produção é a maior reclamação do pescador Paulo Roberto Freitas, o Bolinha, de 51 anos, há 27 na profissão. Todos os dias, antes do amanhecer, ele chega à colônia de pescadores de Itaipu (Z-7) para mais um dia de trabalho.

Segundo ele, quando a quantidade de peixe é muito grande, os pescadores se cotizam para pagar o frete e levar o pescado até o Mercado do Peixe, em Niterói, ou ao Ceasa, no Rio.

“Se tivéssemos apoio para esse transporte, lucraríamos muito mais. Além de pagar o frete, temos que pagar o gelo para o caminhão. Não pode ser qualquer veículo. Tudo é muito dispendioso”, reclama Bolinha.
Na terça-feira, ele pescou cerca de 25 quilos de pescadinha e corvina. A pouca quantidade o obrigou a vender o peixe ali mesmo, nas areias de Itaipu, no leilão que acontece à beira mar. Vendeu tudo por R$ 100, colocou o barco na areia e voltou para casa.

Lugar para ‘estacionar’ a embarcação é outro problema que o pescador enfrenta, já que tem que dividir a área com as cadeiras e mesas dos dezenas de bares da orla. “Isso é muito ruim. Tenho meu espaço porque a dona do bar em frente ao lugar onde paro meu barco é filha de pescador”, diz ele, que ainda tem que arcar com os prejuízos causados pelo lixo jogado no mar, como sacolas e garrafas plásticas. “Elas arrebentam a rede. Já tivemos prejuízo de R$ 4 mil com redes destruídas pelo lixo”, relata.

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