Por karilayn.areias

Rio - Máquinas de lavar roupas e TVs de plasma, LED ou LCD não faltam na maioria das favelas do Brasil. Mas, assim como os bens de consumo, o medo da inflação e o endividamento rondam as casas de famílias de 63 comunidades, localizadas em nove regiões metropolitanas do país, além do Distrito Federal. A análise faz parte de pesquisa inédita do Instituto Data Favela, com apoio do Data Popular e da Central Única das Favelas (Cufa).

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O estudo mostrou que 53% dos moradores estão com dificuldades de pagar as contas, 35% ficaram endividados e 22% inadimplentes — com contas atrasadas por mais de 30 dias. Para driblar as dívidas e esticar o orçamento, a maioria dos moradores de favelas (83%) faz da pesquisa de preços a principal arma da economia doméstica.

É o caso da empregada doméstica Maria Inês Costa Silva, de 46 anos. Moradora da Favela Beira Rio, na Zona Oeste do Rio, ela diz que a cada dia tem ficado mais difícil administrar o orçamento. “Moro com meu filho e sobrinho, que trabalham como ladrilheiros. Mas todos ganham pouco e as oportunidades de trabalho têm ficado mais raras para eles”, afirma. “Esses dias, ao voltar das compras, falei para o meu filho que com o dinheiro que ganhamos não está dando para comprar muita coisa”, desabafa.

A sensação de que o dinheiro está mais curto aparece nos números da inflação. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do IBGE atingiu alta mensal de 1,24% em janeiro — 0,46 ponto percentual acima da taxa de dezembro (0,78%) — e 7,14% nos últimos 12 meses.

Já o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que mede inflação entre famílias com rendimento de um (R$ 788) a cinco salários mínimos (R$3.940), avançou 1,48% em janeiro, acima do resultado de 0,62% de dezembro. Esta foi a maior taxa desde janeiro de 2003 (2,47%). No acumulado dos últimos 12 meses, o índice ficou em 7,13%.

Não é à toa que o medo da inflação assombra a maioria dos moradores de favelas no país. E o temor é proporcional à renda: 82% das famílias que estão na classe baixa — com rendimento familiar médio até R$ 1.199 — têm preocupação com aumento do custo de vida. Já entre aqueles que somam renda a partir de R$ 5.637, o medo da alta dos preços é sentido por 73%.

Presidente do Data Popular, Renato Meirelles diz que a preocupação com a inflação apareceu mais forte este ano. “Avaliamos especialmente o peso dos alimentos, transportes e iluminação e vimos que, de fato, a inflação pega de forma mais forte as camadas de menor renda”, afirma.

TV e casa própria são os maiores sonhos de consumo

Moradora da Tijuquinha, favela na Zona Oeste do Rio, Versiane Azevedo dos Santos, a Nani, de 37 anos, reclama da escalada dos preços dos alimentos. “O quilo do feijão está R$ 6. É absurdo”, desabafa a doméstica. “Procuro promoções e já mudei até a marca de sabão em pó”, conta ela, que revela já ter atrasado o pagamento do cartão de crédito do último mês. “Atrasei, mas já vou pagar. Estou procurando manter o controle dos gastos”, acrescenta.

Com o marido, Nani sustenta duas filhas adolescentes, uma delas já trabalhando. Em sua casa há geladeira, máquina de lavar e também uma TV de tela plana. “Planejo comprar uma outra de LCD, menor, para o quarto. Mas vou esperar pelas promoções dos Dias das Mães”, diz ela, cautelosa.

Já o porteiro Luiz Carlos Rodrigues, 47, morador do Dona Marta, em Botafogo, revelou que entrou numa dívida recentemente para comprar uma televisão. “Quem fez o negócio foi a minha mulher. Ela comprou a TV em dez prestações sem juros. Passou sufoco para pagar, mas não atrasou nenhuma parcela. A facilidade no crédito foi boa por um lado, mas prejudicou muitas pessoas que ficaram endividadas”, afirmou.

Segundo a pesquisa, a proporção de famílias com TV de LCD, LED ou plasma teve crescimento superior aos que adquiriram máquina de lavar. Em 2013, 69% tinham máquina de lavar e 46%, TVs. Agora em 2015, 75% contam com máquina e 67%, TVs. Para Meirelles, a Copa do Mundo está por trás dessa expansão dos televisores.

“A máquina de lavar cresceu, mas tivemos a Copa e, especialmente nas favelas situadas nas cidades-sedes, o evento estimulou muitas compras”, diz.

Além disso, as TVs se mantêm como o maior sonho de consumo das famílias que residem em comunidades. Elas são desejadas por 27% dos moradores. Logo em seguida aparece a compra da casa própria (16%) e ter um carro (15%).

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