Por bferreira

Rio - Longe de ser um objetivo unânime, o passe livre, bandeira do movimento que iniciou os protestos nas ruas de São Paulo, já não é mais visto como uma fantasia pelos estudiosos de mobilidade urbana. Esta foi uma das conclusões do terceiro debate do Observatório da Mobilidade, na última quinta-feira, com o tema Subsídios às Tarifas de Transporte. O consenso entre os debatedores, no entanto, é a necessidade de ampliação das fontes de financiamento dos custos operacionais do transporte público.

Segundo o economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Carlos Henrique Carvalho, o custo para a implementação da tarifa zero nas cidades brasileiras ficaria na ordem de R$ 50 bilhões por ano, se a atual demanda se mantivesse. A estimativa dele é baseada na Pesquisa de Orçamento Familiar de 2009 (última disponível), do IBGE, que mostrou os gastos com transporte, mais o aumento de custos no período.

“A tarifa zero não é um delírio. Alguém já paga essa conta. E são os mais pobres, que são os usuários do transporte público. Precisamos transferir, pelo menos, parte dessa conta para os que podem pagar mais”, disse o economista do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) Marcelo Miterhof, deixando claro que esta era sua opinião pessoal, e não a da instituição.

O Superintendente de Gestão da Agência Metropolitana de Transportes Urbanos, Waldir Peres, critica que o passe livre teria um custo elevado demais. “O que defendo é uma nova política tarifária nacional para os transportes, com ajuda do governo federal”.

LUCROS ALTOS

Gabriel Siqueira, representante do Fórum de Lutas Contra o Aumento da Passagem, que organizou manifestações no Rio, discorda. “Esses custos podem ser questionados. Em alguns lugares, os valores (oficiais) estão sendo investigados”, disse.

Miterhof rebateu: “O lucro das empresas de transporte pode até ser alto, mas não vamos imaginar que só essa redução poderá subsidiar o transporte público”. O economista defende que o sistema seja bancado por tributos que distribuem renda, como o IPTU, e não pelos orçamentos dos governos.

Carvalho, do Ipea, concorda e sugere que parte dos custos dos transportes sejam pago pelo usuário do carro particular, por meio de taxação de estacionamentos, pedágio urbano ou tributo sobre combustíveis. A coordenadora do Bilhete Único estadual, Cristine Petros, avalia que a população já está sobrecarregada de impostos. A Secretaria Municipal de Transportes não enviou representantes, alegando estar ocupada com a Jornada Mundial da Juventude.

“A tarifa zero não é um delírio. Alguém já paga essa conta. E são os mais pobres, que são os usuários do transporte público. Precisamos transferir, pelo menos, parte dessa conta para os que podem pagar mais. Sem subsídio, não dá. Além disso, é preciso ter estudos de demanda para dimensionar o transporte. São necessárias soluções adequadas a cada local. Metrô, onde deve ser metrô, BRT, onde deve ser BRT. Depois, as cidades precisam ser capacitadas para desenvolver seus planos de mobilidade”.

MARCELO MITERHOF, Economista do BNDES

“Ok, podemos discutir tarifa zero. Mas é preciso saber quem é que vai pagar esta conta. É muito dinheiro e o estado não tem para bancar isso. Se a passagem tivesse preço módico de R$ 1 , seria preciso desembolsar uns R$ 8 bilhões por ano para bancar o serviço, isso sem nenhuma melhoria na oferta das conduções. Hoje, o sistema na região metropolitana do Rio custa cerca de R$ 13 bilhões. Outra coisa, não é verdade que o usuário paga toda a tarifa. O governo do estado já deu subsídios de R$ 1,2 bilhão desde 2010 com o Bilhete Único”.

WALDIR PERES, Ag. Metropolitana de Transportes

“Já há um avanço na discussão. Já é consenso que não se paga investimento só com tarifa, mas precisamos avançar para que o subsídio não seja só à infraestrutura, mas também para a operação. Não precisa ser tarifa zero,mas precisamos sair do modelo em que só o usuário paga o transporte. Não tem como fugir de que o usuário do carro particular pague parte desse custo. Só em São Paulo, os automóveis são responsáveis por encarecer as tarifas dos ônibus em 25%, por causa dos engarrafamentos”.

CARLOS CARVALHO, Economista do Ipea

“Os números não são transparentes. A gente não engole mais esta história do governo dizer que não tem dinheiro. Hoje em dia esta conta já esta sendo paga pelo pobre. Isso é uma decisão política. Beneficia uns e prejudica outros. É possível mudar este modelo. Transporte é um serviço público. Alguém pode imaginar que o contribuinte pague por cada vez que o gari retire o lixo? Claro que não. Existe um custo único pago pelo governo. Por que não fazemos isso com os ônibus, metrô e trens também?”

GABRIEL SIQUEIRA, Movimento FLCAP

“É preciso tomar cuidado para que esta questão do custo da tarifa não seja usada politicamente. Isso só vai prejudicar o sistema de transporte. As decisões devem ser tomadas depois que forem realizados estudos que garantam a segurança das análises. E isso já está sendo feito. Até o final deste ano vamos apresentar o Plano Diretor de Transportes Urbanos do Rio de Janeiro (PDTU), que vai fazer um raio x do sistema. Ele vai mostrar qual a demanda exata e quanto custa a operação de todo o sistema de transportes”.

CRISTINE PETROS, Coordenadora do Bilhete Único

Você pode gostar