Rio - Pouco mais de duas horas e 20 minutos de paciência (ou falta de) e muito dinheiro no lixo. Esse foi o tempo médio que 2,8 milhões de fluminenses gastaram, por dia, só para ir e voltar do trabalho na Região Metropolitana do Rio em 2012. Essa quantidade representa 61% da população do Grande Rio economicamente ocupada naquele ano. Na ponta do lápis, a conta assusta. Significa que os trabalhadores perderam quase 12 horas por semana — ou 22 dias no ano — no meio do caminho entre suas casas e seus compromissos. Tirando um mês de férias.
O panorama é recorte de estudo que a Firjan apresenta hoje em congresso internacional de mobilidade promovido pela ONG Embarq Brasil na Cidade das Artes.
O município onde os trabalhadores registraram maior tempo de deslocamento foi Japeri, na Baixada, com média de 3h07 (46 minutos a mais do que a média do Grande Rio) no trajeto casa-trabalho-casa. Já Itaguaí foi a cidade-origem de onde os moradores sofreram menos no vaivém diário: 2h02 (19 minutos a menos do que a média geral). Entre os 19 municípios que faziam parte da Região Metropolitana na ocasião (Rio Bonito e Cachoeiras de Macacu foram incluídos depois), na capital, que concentra 53,2% dos trabalhadores com viagens acima de 30 minutos, a média ficou em 1h14.
“O peso é muito grande. Levando em conta a Região Metropolitana, esse tempo gasto nos deslocamentos custou mais de R$ 19 bilhões à economia, o equivalente a 5,9% do PIB da região que deixou de ser produzido”, aponta Riley Rodrigues, especialista em Competitividade Industrial e Investimentos do Sistema Firjan, coautor do estudo.
Para o pesquisador, os municípios com as maiores médias são prejudicados por ter baixa oferta de empregos formais. “Grande parte da população daquelas cidades trabalha fora delas. Só de Japeri para o Centro do Rio são 74 km de ônibus ou carro ou 51 km de trem”, comenta Riley. Já Itaguaí, segundo ele, é privilegiada por ficar perto de zonas empregadoras como Santa Cruz e Campo Grande.
A solução para melhorar a qualidade de vida, na visão de Riley, é não só expandir a rede de transportes, mas implantar políticas públicas para desenvolver a economia dos ‘municípios-dormitórios’. Isso geraria empregos perto de casa, reduzindo as distâncias e, logo, os engarrafamentos.
Bruno Simões, vigilante de Caxias
"Recusei uma promoção para não enfrentar o trânsito"
Sempre trabalhei de dia na Zona Sul ou na Barra, mas chegava em casa cansado, estressado. Demorava quatro, cinco horas no trânsito diariamente, não era vida. Há alguns anos, optei por trabalhar à noite; demoro no máximo uma hora e meia no percurso. Até me ofereceram uma promoção para ganhar quase o dobro, mas seria de dia na Barra. Recusei na hora.
Nathalia Leal, universitária de Nilópolis
"Demoro até cinco horas no trânsito diariamente"
Todo dia pego quatro conduções para ir ao trabalho. Demoro quatro, cinco horas no trânsito. Às 5h35, tomo um ônibus até Ricardo de Albuquerque, onde pego trem; depois, metrô e a van da empresa que me leva até o Cristo Redentor, onde trabalho. De lá vou para Realengo, onde estudo. Chego em casa bem tarde. Antes eu pegava dois ônibus, mas as obras na Avenida Brasil me fizeram mudar de itinerário.
Bruno Vinícius, programador de São Paulo
"Em BH, investir em transporte não é prioridade. Em SP, é"
Já morei em Contagem, na Grande BH, onde a cobertura do metrô é pífia. Também não havia muitas faixas exclusivas para ônibus. Perdia até três horas por dia nos deslocamentos. Em São Paulo, onde se discute muito mais a mobilidade, a situação melhorou um pouco: gasto umas duas horas. Mesmo assim há o que ajustar, sobretudo na Região Metropolitana.
Plano diretor em 2016
O coordenador da Câmara Metropolitana de Integração Governamental do Rio de Janeiro, Vicente Loureiro, afirma que um consórcio já foi contratado para desenvolver um plano diretor. O documento deve ficar pronto até o fim de 2016.
“Pela primeira vez vamos ter políticas consolidadas para efetivar investimentos capazes de reduzir o tempo de deslocamento”, diz ele. O secretário estadual de Transportes, Carlos Roberto Osorio, acredita que a rede de BRTs estudada para a Baixada e Leste Fluminense, extensões do metrô e investimentos nos trens e nas barcas também farão efeito.
A Prefeitura de Japeri informou que trabalha constantemente para atrair investimentos. “O condomínio industrial de Japeri possui 26 indústrias e outras oito estão em processo de mudança”, ressaltou, em nota. “O grande diferencial é que o município oferece redução de 19% para 2% em custos de ICMS e o incentivo fiscal de 80% de desconto no pagamento do IPTU.”
Em comparação com outras 36 regiões metropolitanas analisadas, a do Rio foi a pior colocada. Aqui, o povo leva mais tempo em trânsito do que na Grande São Paulo, onde a população é maior. A diferença foi de nove minutos. O levantamento foi elaborado a partir de dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) do IBGE.
Corte Europeia inclui viagens no horário de trabalho
Imagina bater o ponto do trabalho não no relógio da firma, mas imediatamente ao sair de casa — e só parar de contar o tempo da jornada quando voltar ao aconchego do lar: é esse o entendimento da Justiça europeia, que vem gerando debate no Velho Mundo.
Reportagem publicada ontem no diário britânico ‘Independent’ cita decisão da Corte de Justiça Europeia, mais alto órgão do Judiciário do continente, que determina incluir as horas do deslocamento como tempo de trabalho. Haja hora extra!
Mas o regime não vale para todos. Pela regra, quem trabalha em escritório — ou qualquer local, como oficinas — bate o ponto ao chegar à firma. A medida, portanto, beneficia só técnicos, babás e representantes de vendas.