Por nara.boechat
Rio - Com a redemocratização do país os militares voltaram aos quartéis, deixando suas práticas para as instituições estaduais. A truculência do Estado atuou sobre os corpos, produzindo tortura, morte e desaparecimentos, e sobre as mentes, produzindo o espanto e o temor. As políticas públicas refletiram tais concepções repressivas. Conceberam-se programas de tolerâncias zero, choques de ordem, secretarias de ordem, UPPs militarizadas e até empresas de vigilância em forma de guardas municipais militarizadas. Não houve quem não temesse abusos diante de uma blitz, abreviatura da palavra alemã blitzkrieg e que durante o nazismo expressava abordagem surpresa ou ‘guerra relâmpago’. Autoridades de segurança, do alto de seus fuzis, determinavam comportamentos à sociedade, por vezes incensados por setores da mídia.
A sociedade viu que a guerra era do Estado contra ela e reagiu. As manifestações em todo o país deram o tom do descontentamento. Em resposta, aprofundou-se a repressão. Demais instituições fizeram coro. Estudantes, trabalhadores e moradores de rua foram ‘conduzidos’ para delegacias como integrantes de organizações criminosas. Pessoas que nunca antes haviam se visto foram consideradas associadas para a prática de crimes. Delegados foram admoestados por seus superiores para lavrarem autos de prisão em flagrante sem ocorrências concretas que os justificassem. Autoridade policial é delegado de polícia. Chefes de polícia não poderiam legalmente intervir em suas atribuições.
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Mas, a arrogância do Estado Policial cedeu. Autoridades de segurança estão falando baixinho e em tom lamentoso por uma ou outra ocorrência anômala apontada pela mídia, dentre milhares que são apenas números. As políticas de segurança não mudaram. Mas, já se muda o jeito com o qual autoridades — em tom vitimizado — lamentam os fatos por elas mesmas determinados.
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Doutor em Ciência Política pela UFF e juiz de Direito. Membro da Associação Juízes pela Democracia