Por adriano.araujo

Rio - O ministro da Justiça se manifestou sobre prisões de pessoas previamente à prática de ilícitos e expressou não haver ilegalidade, pois atendidos os requisitos formais. Tal pensamento é similar ao dos gorilas que sequestraram as liberdades em 1964, período no qual — atendidos os requisitos formais — não se permitia analisar a substância dos atos, sobretudo durante a vigência do AI-5. Por vezes, formalidades davam roupagem de aparente legalidade à prisão, mesmo ante a falta de fundamento que lhe desse legitimidade.

Os gorilas violaram a Constituição sob o fundamento de que o poder revolucionário, que se atribuíam, era constituinte. Em 1969 editaram a Emenda Constitucional 1. Outorgaram uma Constituição, mas, do ponto de vista formal, era só uma emenda.

Prisões para evitar manifestações é o apogeu do Estado Policial. Mas o liberticídio não é coisa de reles chefes das polícias estaduais; é parte de uma política federal de repressão aos movimentos sociais em todo o país e se intensificou após reunião de secretários de segurança no Ministério da Justiça. O governo federal tem atuado na esfera reservada pela Constituição aos estados, e os governantes locais aproveitam a oportunidade para exercitar seus desejos mórbidos, pondo suas polícias contra a sociedade, tal como no tempo do Dops. O emprego das Forças Armadas como polícia é emblemático. Setores do próprio Judiciário funcionam nestes episódios como força subalterna, abdicando indevidamente do papel de garantidores dos direitos.

Movimentos sociais têm sido cooptados e seduzidos por custeios e oportunidades de negócios ou severamente trucidados. A presidenta Dilma Rousseff, em entrevista na Globo News, após o jogo do Brasil com a Holanda, falou da “política federativa de segurança” e do “padrão de segurança na Copa”. Mas não se implementou política de investigação dos homicídios de trabalhadores, de jovens e de negros nas periferias, nem das violações reiteradas aos direitos humanos.

Um sistema que precisa prender advogados e filósofos para se manter demonstra falta de razão para convencer dos fundamentos que o legitima. Mais do que uma demonstração ao capital financeiro internacional de que o Brasil é um país seguro para suas especulações, a política repressiva visa a afastar a pretensão popular de participação na vida pública.

Benedito Valares, velho político mineiro, dizia gostar do povo visto do palanque, pois lá estava para aplaudi-lo. Anastácio Somoza, ditador nicaraguense derrubado pela Revolução Sandinista em 1979, dividia o povo em três categorias: os amigos, a quem dava ouro; os indiferentes, a quem dava prata, e os inimigos, a quem destinava chumbo. No Brasil, quem ficou com o ouro foi a Fifa. Aos que não se domesticaram para receber a prata restaram chumbo, remoções, repressão brutal e prisões.

João Batista Damasceno é doutor em Ciência Política pela UFF e juiz de Direito

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