Rio - Sempre lastimo a falta de respeito à memória no Brasil. E me refiro à memória lato sensu, ou seja, a de todos os escaninhos da atividade sedimentada da cultura, onde há vácuos, desatenções, desleixo. A história da imprensa, e dos homens que a fizeram, quase sempre fica capenga. Poucos são os jornalistas e escritores atentos ao passado dos jornais e das revistas, mas certamente que o conjunto memorial da imprensa é desejável. Queixumes como esses, contudo, ficam amenizados quando a gente pode se abastecer de gotas de história.
Há dias, na Academia Carioca de Letras, ouvi dois cultores desse cadinho, os escritores e jornalistas Arnaldo Niskier e Cícero Sandroni. Ambos mergulharam na vastidão do oceano das revistas e dos jornais cariocas. E o fizeram com brilho acadêmico e com graça, mas empregando o rigor que cabe aos profissionais de imprensa.
Niskier privilegiou as revistas e escarafunchou a sedução de ícones como o Tico-Tico, a primeira revista infantojuvenil a conquistar, desde 1904, mentes e corações de gerações sucessivas. Mas ele centraria sua palavra no ‘Cruzeiro’ e na ‘Manchete’. De lambuja, ainda dedicou longos minutos à Era do Rádio, seduzindo a plateia com o charme da antiga Rádio Nacional, a PRE-8, que encantou todo o país antes da televisão.
Já Sandroni produziu longo relato de como a imprensa forjou a nacionalidade, a partir da informação e do saber. Falou, alimentando nostalgia e saudade, de veículos intimoratos como o ‘Diário de Notícias’, ‘Ultima Hora’ e O DIA.
Emocionadamente, ele reviu a chaga da censura, quando o cutelo vil dos castradores de opinião dava as cartas naqueles tempos de chumbo da ditadura. O que levou o ‘Correio da Manhã’ a fechar as portas e o ‘Jornal do Brasil’ a exibir provocadores espaços em branco, em sinal de protesto.
Arnaldo Niskier e Cícero Sandroni tonificaram aquela tarde na Academia Carioca de Letras. E fizeram a memória sair de seus desvãos.
Ricardo Cravo Albin é presidente do Instituto Cravo Albin