Por adriano.araujo

Rio - A morte da modernidade merece missa de sétimo dia? Os pais da modernidade nos deixaram de herança a confiança nas possibilidades da razão e nos ensinaram a situar o ser humano no centro do pensamento e a acreditar que a razão, sem dogmas e donos, construiria uma sociedade livre e justa. Pouco afeitos ao delírio e à poesia, agora olhamos em volta e o que vemos? As ruínas do Muro de Berlim, a Estátua da Liberdade tendo o mesmo efeito no planeta que o Cristo do Corcovado na vida cristã dos cariocas, o desencanto com a política, o ceticismo frente aos valores. Somos invadidos pela incerteza, a ruptura e a dispersão. O evento soa mais importante que a história e o detalhe sobrepuja a fundamentação.

O pós-moderno aparece na moda, na estética ou no estilo de vida. É a cultura de evasão da realidade. De fato, não estamos satisfeitos com a inflação, com a nossa filha gastando mais em pílulas de emagrecimento que em livros e causa-nos profunda decepção saber que, neste país, a impunidade é mais forte que a lei.

Ainda assim, temos esperança de mudá-lo. Recuamos do social ao privado e as antigas bandeiras de nossos ideais, agora rasgadas, transformam-se em gravatas estampadas. Já não há utopias de um futuro diferente. Hoje, no mínimo é considerado politicamente incorreto propagar a tese de conquista de uma sociedade onde todos tenham iguais direitos e oportunidades.

Agora predominam o efêmero, o individual, o subjetivo e o estético. Que análise de realidade previu a volta da Rússia à sociedade de classes? Resta-nos captar fragmentos do real (e aceitar que o saber é uma construção coletiva). Nosso processo de conhecimento se caracteriza pela indeterminação, descontinuidade e pluralismo.

Sem o resgate da ética, da cidadania e das esperanças libertárias, e do Estado-síndico dos interesses da maioria, não haverá justiça, exceto aquela que o mais forte faz com as próprias mãos.

Ingressamos na era da globalização. Graças às redes de computadores, um rapaz de São Paulo pode namorar uma chinesa de Beijing sem que nenhum dos dois saia de casa. Bilhões de dólares são eletronicamente transferidos de um país a outro no jogo da especulação, derivativo de ricos. Caem as fronteiras culturais e econômicas, afrouxam-se as políticas e morais. Prevalece o padrão do mais forte.

A globalização tem sombras e luzes.

Frei Betto é autor de “O desafio ético” (Garamond), em parceria com Luiz Fernando Veríssimo e Cristovam Buarque

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